Folia de Reis ganha festival em Vespasiano e reúne manifestações de diversas cidades

Minas Gerais tem cerca de 4 mil grupos. Iepha prepara inventário e registro

por Ana Clara Brant 25/08/2015 08:00

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Gladyston Rodrigues/em/d.a press
Máscaras usadas pelos foliões representam os três reis magos: Baltazar, Melchior e Gaspar (foto: Gladyston Rodrigues/em/d.a press)
Não era Natal, era apenas um domingo de agosto, mas o presépio estava montado anteontem no coreto de uma das praças de Vespasiano. Aos poucos, foram chegando o mestre, os dançantes, os músicos com seus instrumentos, como viola e sanfona, as pastorinhas, o palhaço que representa Herodes e as figuras mais importantes – os três reis magos.

O 1º Festival de Folias de Reis, realizado em Vespasiano no fim de semana, reuniu não só grupos da cidade, mas de outros municípios próximos, como Lagoa Santa, Jaboticatubas, Baldim, Pedro Leopoldo e até de Belo Horizonte. A folia de reis celebra o nascimento de Jesus e a viagem de Gaspar, Melchior e Baltazar do Oriente até Belém.

 

 

 

“Em cada lugar, as folias, ternos, reisados, companhias, como também são conhecidas, se manifestam de uma maneira, mas não perdem a sua essência, que é reverenciar o menino Jesus”, diz Dadá Diniz, presidente da Federação das Folias de Reis de Minas Gerais e líder de um dos poucos grupos existentes na capital, a Folia de Reis de Dona Guidinha, no Caiçara, fundada por sua mãe. “É, sobretudo, a fé que move essas pessoas. Não importa como os foliões se vestem, de que cor é sua roupa ou como é sua máscara. O que vale é a devoção”, diz.

O organizador do festival em Vespasiano é o policial militar Luiz Antônio Martins, de 40 anos. “É uma alegria e uma satisfação que a gente não consegue explicar”, diz ele, que afirma integrar a folia de reis da família desde que nasceu. Na verdade, foi aos 5 anos que Lulu, como é conhecido, estreou no grupo criado por seu avô há cerca de sete décadas. “Já comecei vivendo o rapazinho, que é uma maneira carinhosa que chamamos o Gaspar, um dos reis magos, e não larguei mais. Hoje, estou aqui, preparando as máscaras para os meus netos. Minha folia já está na quarta geração.”

INTERESSE

Um dos aspectos mais característicos dessas manifestações é a transmissão de geração a geração. A tradição passa de pai para filho. No entanto, não é fácil, ainda mais nos dias de hoje, manter o interesse dos jovens. “Acho que as folias já foram mais fortes. Muitos grupos acabaram porque os filhos não deram continuidade ou seguiram outras religiões. A religião evangélica, principalmente, cresceu demais, e a folia de reis é uma manifestação católica”, observa Lulu.

Seus filhos Luan Antonny, de 15, e Janderson, de 24, seguiram os passos do pai como foliões e acompanham o grupo desde meninos. “As crianças e os adolescentes de hoje não ligam muito pra essas coisas de cultura popular, mesmo quando a família tem uma folia. Na nossa, meu pai faz questão que a gente participe. Acho tudo muito bonito”, comenta Luan.

Segundo a presidente da Federação das Folias de Reis de Minas Gerais, o estado conta com aproximadamente 4 mil grupos, entre ternos, companhias e reisados, sendo o interior (sobretudo o Triângulo e a Região Norte) predominante. Belo Horizonte registra oito folias. Os primos Cláudio Alberto Sousa, de 48, e Júlio César Santos Sousa, de 46, integram a Folia de Reis Estrela do Oriente, do Bairro 1º de Maio, na capital mineira, fundada em 1932. “Manter uma tradição dessas em um lugar como BH é mais complicado, porque na cidade grande as coisas se dispersam. A população tem outros interesses. No interior, isso é muito forte. Mas o nosso bairro tem essa coisa meio interiorana”, comenta Carlos Alberto.

Ao longo do ano, eventos como o Festival de Vespasiano costumam congregar os grupos, mas a principal época de atividade é mesmo o período natalino, que vai do dia 25 de dezembro a 6 de janeiro, Dia de Reis.

Iepha faz inventário das folias em Minas

O Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais desenvolve o projeto Inventário das Folias de Reis em Minas Gerais, com o objetivo de criar uma plataforma colaborativa com informações sobre os grupos de folia de reis existentes no estado. Estão previstas para este ano ações como curso de capacitação, mobilização e palestras com ênfase na valorização do bem cultural, em parceria com as prefeituras mineiras.

“A gente já tinha essa demanda interna de estudar a folia. Decidimos fazer um levantamento participativo, porque a premissa do patrimônio imaterial é envolver as comunidades e os detentores desses saberes. É preciso saber quais as necessidades de cada folia, justamente para ajudar a mantê-las”, afirma o gerente de Patrimônio Imaterial do Iepha, Luís Gustavo Molinari Mundim.

Inicialmente, o órgão está mapeando os grupos. Depois, eles serão registrados. “O registro é uma prova de que aquele bem cultural é importante para o bem público. Essa manifestação é uma das mais fortes e importantes de Minas. Precisamos apoiar e fazer com que as folias permaneçam e se perpetuem.”

Saiba mais

Folia não é congado

Folias de reis são festejos que vieram da Europa e rememoram a história bíblica da viagem dos três reis magos, que saíram de suas regiões em busca do menino Jesus para presenteá-lo. Os reis se disfarçam, para evitar ser identificados por Herodes. O rito envolve canto, dança e teatro, numa expressão que une fé e divertimento.

Congado é uma manifestação cultural e religiosa de influência africana celebrada em algumas regiões do Brasil. Trata basicamente de três temas em seu enredo: a vida de São Benedito, o encontro de Nossa Senhora do Rosário submergida nas águas e a representação da luta de Carlos Magno contra as invasões mouras.

Eterno folião

Seu Antônio Candeias, de 83 anos, é um dos foliões mais antigos e animados do estado. Há 70 anos ele integra a Folia de Reis de São Vicente, em Baldim, na região metropolitana. Mesmo com dificuldades de acompanhar os cortejos pelas casas, ele não abre mão de participar de todas as atividades do grupo. “A coisa de que mais gosto é que a folia reúne Deus, fé, música e companheirismo. Tenho amigos que se tornaram minha família de coração.”

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