'Maria Maria': conheça bastidores do balé que foi alicerce para o Grupo Corpo

Espetáculo estreou em 1976 e tornou-se sucesso internacional; envolvidos no desenvolvimento estavam jovens artistas promissores como Milton Nascimento e Fernando Brant

por Ana Clara Brant 24/10/2014 07:58

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Odilon Araújo/Divulgação
'Maria Maria' surgiu do encontro entre os dançarinos da família Pederneiras com Fernando Brant (foto: Odilon Araújo/Divulgação)
As famílias Pederneiras e Brant eram vizinhas nos anos 1960, na região do Bairro da Serra, zona Centro-Sul de Belo Horizonte, mas quis o destino que o encontro entre o bailarino Paulo e seu irmão Rodrigo Pederneiras com o compositor Fernando Brant acontecesse a quilômetros dali, na cidade de São Francisco de Itabapoana, no estado do Rio de Janeiro, em 1975.

 

Nas areias da praia do município do Norte fluminense começava a nascer 'Maria Maria', primeiro balé de uma companhia de dança que viria se tornar uma das mais conhecidas e aclamadas do país e do mundo. “Quando o Corpo surgiu, a gente tinha essa ideia de fazer um espetáculo e quando encontramos o Fernando o convidamos para fazer o roteiro e chamamos o Milton Nascimento para fazer a trilha sonora. Ficamos totalmente de fora da parte do tema, da criação”, lembra Paulo, diretor-geral e artístico do Grupo Corpo.

 

Confira trecho do espetáculo 'Maria Maria':

 


Na verdade, a vontade de montar algo original surgiu quando Rodrigo Pederneiras e outros integrantes participaram de oficinas de dança com o bailarino argentino Oscar Araiz, no começo da década de 1970, durante o Festival de Inverno de Ouro Preto. “Tivemos esse contato inicial com o Araiz e depois o convidamos para trabalhar conosco. Deu tão certo que ele acabou sendo nosso coreógrafo também no trabalho seguinte, o Último trem. Oscar Araiz teve muita influência na nossa formação”, destaca Rodrigo.


'Maria Maria' – que entre os bailarinos contava com os irmãos Miriam, Mariza e Pedro Pederneiras, Cristina Castilho, Izabel Costa e Carmen Purri, iluminação de Fernando Velloso e figurinos da argentina Renata Schussheim – conta a trajetória de Maria, uma mulher do povo, desde o momento em que nasce e vai percorrendo sua trajetória. Sua infância pobre, a juventude, o casamento, os filhos, a viuvez, até o fim de sua vida.

 

Fernando Brant conta que se inspirou em todas as Marias com quem conviveu e que trabalharam na casa de sua família. Foi assim que acabou compondo, especialmente para o balé, as canções em parceria com Milton Nascimento. Boa parte delas se tornaram clássicos da MPB, como Maria solidária, Caxangá e Raça, por exemplo.

Gladyston Rodrigues/EM/D.A Pres
Diretor do Corpo, Paulo Pederneiras diz que 'Maria Maria' é divisor de águas na dança brasileira (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Pres)
Na montagem para o palco, a trilha de 'Maria Maria' não tinha letra e só foi ganhar versos algum tempo depois. “Lembro-me de que fui para o Rio, na casa do Bituca (Milton), e ele me mostrou a melodia. Devo ter sido uma das primeiras pessoas a ouvir essa música. E aí ele me disse: ‘Acabei de fazer, o que você achou?. Fiquei encantado e gostei tanto que 'Maria Maria' abriu e fechou o espetáculo”, recorda Paulo Pederneiras, que foi o responsável pela coordenação geral do balé.


Um dos momentos mais belos do espetáculo é o pas-de-deux executado ao som de 'Francisco', outra obra-prima criada exclusivamente para a produção. Além de Milton Nascimento, Nana Caymmi, Fafá de Belém, Beto Guedes e Tavinho Moura gravaram a trilha. “Uma das coisas que mais guardo com carinho daqueles tempos é como todos se envolveram nesse projeto com uma generosidade enorme. Eles abraçaram mesmo essa ideia. Milton, Tavinho, Fernando. Tudo isso corroborou para o sucesso que foi”, acredita Rodrigo Pederneiras, que viria a se tornar o coreógrafo do Grupo Corpo.

Gladyston Rodrigues/EM/reprodução
Reprodução da revista do Theatre de La Ville mostra cena de 'Maria Maria' (foto: Gladyston Rodrigues/EM/reprodução )

Poema

Todos os textos de 'Maria Maria' são de autoria de Fernando Brant, com exceção de 'Eu sou uma preta velha aqui sentada ao sol', de Sérgio Sant’Anna. Aliás, o compositor lembra-se de um fato curioso relacionado ao poema. Como algumas coisas foram feitas em cima da hora, o folder do espetáculo não continha o nome de Sant’Anna. “Tiveram que improvisar e o nome dele foi colado e ficou meio dependurado no papel. Mas no fim das contas, deu tudo certo. Fomos ovacionados. 'Maria Maria' fez turnê pelo Brasil inteiro, Europa e América Latina”, conta.


Paulo Pederneiras também não se esquece do dia 1º de abril de 1976, data da estreia no palco do Grande Teatro do Palácio das Artes, e revela que para se apresentar no espaço teve que negociar em todas as esferas. “Tivemos dificuldades com essa questão de agenda, porque iríamos ficar em cartaz um bom tempo, e também porque era uma novidade, um balé inovador. E depois conseguimos nos apresentar no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, que foi outra conquista. Hoje, nos apresentamos em qualquer palco do mundo. 'Maria Maria' é quase um divisor de águas na dança brasileira. É o primeiro balé popular, com um tema popular. Foi um sucesso incrível e abriu as portas para o Corpo ser o que é”, resume Paulo Pederneiras.

 Leandro Couri/EM/D.A Press
Fernando Brant, autor do roteiro, fez parceria com Milton Nascimento nas canções do espetáculo (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
 



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