Há quem diga que nos anos 1970 o casal chegou a adquirir uma obra por dia. O legado de Peter e Irene é coleção com mais de 20 mil peças – estima-se que pode ser muito mais –, hoje abrigada em mais de 20 instituições do mundo, a maior parte concentrada no Museu de Colônia (Alemanha). Um pouco dessa história, representada por cerca de 70 obras doadas pelo casal ao Museu de São Petersburgo (Rússia), poderá ser vista a partir de amanhã na exposição Visões na Coleção Ludwig, com curadoria de Joseph Kiblitsky, Evgenia Petrova e Ania Rodriguez. Estão na mostra trabalhos de autores ilustres, modernos e contemporâneos, entre eles Picasso, Andy Warhol e Jean-Michel Basquiat. Mas também autores pouco conhecidos, como os artistas russos dos anos 1980.
A mostra destaca os estímulos que motivaram as aquisições do casal. A presença de obra de Picasso registra a grande paixão de Peter Ludwig – a coleção dele é considerada a terceira mais importante do mundo sobre o artista espanhol. “Foi a admiração pelo pintor que levou Peter Ludwig a focar a coleção em ponto específico, a arte contemporânea, e voltar-se para a arte do seu tempo. Ele viu em Picasso a sensibilidade de uma época e capacidade da arte de ser uma visão do mundo, no caso do artista, do século 20”, explica a curadora. E a coleção dedicada à arte moderna, com obras doadas a instituições que tinham poucos trabalhos desse momento, é aspecto que faz o prestígio da coleção.
Um dos setores mais famosos da Coleção Ludwig é o dedicado à pop-art, em especial a feita pelos artistas Andy Warhol, Roy Lichtenstein, Tom Wesselmann, Claes Oldenburg e Robert Rauschemberg. “Foi aposta em arte inovadora, em momento que ela ainda não era reconhecida pela crítica e pelo público”, conta Ania Rodriguez. O casal Ludwig não só adquiriu obras da turma, como realizou exposições divulgando os trabalhos. “A interação com o grupo pop despertou o interesse por jovens artistas, inclusive apresentando a obra deles ao lado de autores consagrados, o que acabou se tornando marca da coleção”, acrescenta.
Um terceiro setor, presente na exposição, fundamental na coleção formada pelos Ludwig, é o neoexpressionismo. Jovens pintores que marcaram a cena dos anos 1980, entre eles George Baselitz, Markus Lupertz e Anselm Kiefer. “Como alemão, ele valoriza a arte de seu país, em especial a que busca a recuperação de uma história que supere o trauma histórico do nazismo”, observa a curadora. Passo importante, observa Ania Rodriguez, foi os colecionadores passarem a adquirir arte de lugares fora dos centros internacionais, como a Rússia, por exemplo. O casal compra não só obras modernas históricas dos anos 1920, como também dos construtivistas, mas também a produção dos anos 1980.
“Para Peter Ludwig, arte é forma de comunicação entre os povos, criação de pontes entre culturas diferentes e um modo de entender o mundo”, explica Rodriguez. A transferência das peças para museus, em 1976, foi consequência natural e solução prática para guardar o acervo, quando o volume já ocupava todas as residências e propriedades da família. Processo que veio a partir de acordos de empréstimos com várias instituições, que mais tarde se tornaram doações. A coleção continua crescendo, mas para a curadora está posto um desafio: “Deixar a coleção paralisada, objeto de estudo sobre rica experiência de colecionismo, ou fazê-la crescer com acréscimo de novos artistas?”.
Uma coleção e muitos museus
O Sistema Internacional de Museus Irene e Peter Ludwig tem como ponto de partida a criação, em 1976, de uma instituição em Colônia, na Alemanha, aberta ao público em 1986. É formado hoje por mais de 20 museus públicos, que exibem peças emprestadas ou doadas da coleção, em alguns casos alas inteiras de instituições, suprindo lacunas de acervos.
Doze deles, incluindo o de São Petersburgo, levam o nome de Irene e Peter Ludwig. Os de Colônia, Aschem, Viena, Budapeste, São Petersburgo e Pequim são dedicados à arte contemporânea. Nos chamados “museus dentro dos museus”, peças adquiridas pelo casal complementam lacunas existentes nas instituições. “Quando viajava, o casal observava também o que o museu não tinha e procurava ajudar com doações”, observa Ania Rodriguez.
Visões na coleção Ludwig
Pintura, escultura, foto e impressões. Obras de Picasso, Andy Warhol, Jean-Mitchel Basquiat, Jeff Koons, Jasper Johns, Gerhard e Richter, entre outros. A partir de quarta-feira, no Centro Cultural Banco do Brasil, Praça da Liberdade, 450, Funcionários. Todos os dias, exceto às terças-feiras, das 9h às 21h. Até 20 de outubro. Entrada franca.