Jane Austen ainda faz a cabeça das brasileiras, 196 anos depois de sua morte

Cultuada nas redes sociais, a autora de Orgulho e preconceito inspira livros e filme nacional

por Raquel Lima 01/12/2013 06:00

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Christie's/divulgação
Jane Austen em retrato pintado pelo artista plástico inglês Ozias Humphrey (1742-1810) (foto: Christie's/divulgação )
A escritora britânica Jane Austen (1775-1817) escreveu muitas cartas. Fala-se em mais de três mil, entre confidências, apêndices e comentários sobre detalhes da vida na Inglaterra georgiana. Boa parte dessa correspondência foi queimada por Cassandra, irmã da autora, mas 160 cartas resistiram. Em uma delas, a romancista comenta com a caçula e confidente a venda de seu segundo livro, First impressions. Era novembro de 1812 e os três volumes seriam publicados, meses depois, com o título Pride and prejudice (Orgulho e preconceito), tornando-se um clássico. De acordo com o editor de arte da BBC, Will Gompertz, cerca de 50 mil cópias do livro são vendidas todos os anos só no Reino Unido.

Tradutor de quatro títulos de Jane Austen relançados pela L&PM no Brasil, Rodrigo Breunig acredita que a maneira singular da autora de observar a vida e o mundo é um dos aspectos que conferem longevidade à sua obra. Entretanto, os dois séculos do “filho predileto” da britânica, celebrados este ano, não são o único motivo de seu nome circular em posts ilustrados com corações e estrelas nas redes sociais.

Declarações de amor e depoimentos agradecidos se somam no perfil de Carina Rissi no Facebook. Essa paulista de Ariranha vem apresentando Jane Austen às brasileiras tanto no Face quanto no blog carinarissi.com. Depois de bancar a própria estreia literária, Carina republicou Perdida, em junho, pela Editora Verus/Record. O livro é tributo assumido à autora de Orgulho e preconceito. Procura-se um marido saiu há um ano, e outros três livros dela estão na fila de espera: Perdida 2, previsto para março, No mundo da Luna e Esperando você chegar.

Em 2015, Perdida será lançado no cinema, com direção de Luca Amberg. “Não sabia para que época levaria Sofia, a minha protagonista. Em homenagem a Jane Austen, acabei contando sua história no passado”, revela Carina. Mas não é tudo: o protagonista Ian age como um perfeito mister Darcy, personagem-chave de Orgulho e preconceito. A irmã dele se chama Elisabeth, nome da mocinha inventada por Jane.

Aliás, em Procura-se um marido, Carina chega a repetir as célebres palavras de Elizabeth para Darcy: “Você seria o último homem com o qual me casaria”.

Keira
A versão cinematográfica de Perdida deve atrair quem não assistiu ao filme Orgulho e preconceito, dirigido por Joe Wright, que foi estrelado por Keira Knightley e lançado há oito anos. Adaptações para a tela sempre foram uma forma de rejuvenescer o público da autora inglesa.

“Em 1940, o estúdio MGM filmou Orgulho e preconceito, estrelado por Laurence Olivier e Greer Garson. No mesmo ano foi publicada a primeira tradução brasileira da obra – o filme, aliás, era mencionado na capa do livro. Esse pode ter sido o início da influência do cinema no mercado editorial”, ressalta Raquel Sallaberry Brião, pesquisadora da obra da autora inglesa. Há cinco anos ela mantém o blog Jane Austen em português (www.janeausten.com.br).

Está previsto para este mês o lançamento de Orgulho e preconceito e zumbis, com Lily Collins, sob direção de Burr Steers (de A morte e vida de Charlie). A Editora Rocco deve lançar, no início do ano que vem, Jane Austen roubou meu namorado, de Cora Harrison. Vida longa a Jane Austen!

Estrelas

Jane Austen (1775-1817) nasceu em Steventon, Hampshire, na Inglaterra. Seu primeiro livro publicado foi Razão e sensibilidade (1811). Ela é autora de Orgulho e preconceito (1813), Mansfield Park (1814) e Emma (1815). Depois de sua morte, aos 41 anos, foram lançados A abadia de Northanger e Persuasão. A obra da autora inglesa, que morreu solteira, atravessou séculos e faz sucesso no cinema. Em 2005, o filme Orgulho e preconceito (foto), dirigido por Joe Wright, projetou a inglesa Keira Knightley, rendendo-lhe a indicação ao Oscar de Melhor atriz.


Arquivo pessoal
"Os livros dela são atuais. Passaram-se 200 anos, mas muitas coisas não mudaram", diz Carina Rissi, escritora (foto: Arquivo pessoal)
Entrevista

Carina Rissi
escritora

Em que circunstâncias você conheceu a obra de Jane Austen?
Cursava o ensino médio e peguei Orgulho e preconceito emprestado na biblioteca da Gabriel Hernandes, escola pública em que eu estudava em Ariranha (SP). Tinha 16 anos e li o livro umas 50 vezes, sem parar. Aos 21, 22 anos comprei meu próprio exemplar, que tenho até hoje. E ele está num estado…

Em Perdida, você escreveu sobre a vida sem tecnologia. Já imaginou como seria escrever na época de Jane Austen?
Leio tudo o que consigo encontrar sobre Jane Austen. Há uma série da BBC que mostra a casa dela, o local onde escrevia: uma escrivaninha portátil, a pena. O papel era caríssimo, não se podia errar. Colava-se um pedacinho de papel com a correção. Muito difícil. Sem falar que ela era mulher num tempo em que nós, mulheres, não escrevíamos.

O que os textos de Austen, escritos há mais de 200 anos, ainda trazem de novo?
Os livros dela são atuais. Passaram-se 200 anos, mas muitas coisas não mudaram. A divisão silenciosa de classes, por exemplo. Ainda se apontam as meninas que namoram homens ricos como interesseiras. A delicadeza com que Jane trata o amor é a parte de que mais gosto. Prefiro acreditar que ainda existe essa delicadeza.

As menções que você fez a Jane Austen em seus livros foram premeditadas? Ou elas surgiram no ato de escrever?
Não sabia para que tempo levaria Sofia. Como gosto muito de Jane, acabei levando-a para um período parecido. Ian tem o sobrenome Clark – família que sempre aparece nos livros de Austen como coadjuvante. Gosto de pensar que eles são primos distantes. Batizei como Elisa a irmã do Ian em homenagem a Elisabeth Bennet. Na epígrafe de Procura-se..., falo de Jane, e a cena do café em que Alicia encontra Max tem muita influência de Austen. Alicia diz a ele: “Você é o último homem com quem me casaria”. No livro Mundo da Luna, que será lançado depois de Perdida 2, fiz homenagem a uma personagem de Emma, a Senhorita Bakes.

Como você se sente ao apresentar o universo de Austen a jovens leitoras?

Jane Austen é a diva master. Ela é “a” escritora – as outras estão abaixo dela. Costumo dizer que o chick lit sofre muito preconceito, mas insisto: a precursora desse gênero é Jane Austen. Suas obras conseguem ser sombrias, mas irônicas. E carregam um humor inteligente.

Seu primeiro livro vai virar filme. Você participará da elaboração do roteiro?
O cineasta Luca Amberg procurava uma comédia romântica nacional para rodar. Ele entrou numa livraria e comprou cinco livros brasileiros. Por sorte minha, o primeiro que ele leu foi Perdida e adorou a história, acho que por causa da Jane Austen. Depois disso, Luca deixou um recado no meu blog. Achei que era brincadeira, mas conversamos e a previsão de lançamento, se der tudo certo com a captação de recursos, é 2015. Sou corroteirista junto com o Amberg. É bem diferente de escrever um livro, mas estou adorando o desafio.

Enquanto isso...
...versão século 21

Atual dama do suspense, a britânica P.D. James lançou este ano o livro Morte em Perberley (editado no Brasil pela Companhia das Letras) – a “continuação” de Orgulho e preconceito. Os personagens Elizabeth Bennet e Fitzwilliam Darcy estão casados, têm dois filhos e vivem tranquilamente na propriedade rural de Pemberley. Tudo muda quando Lydia Bennet aparece por lá, durante um baile, gritando que o marido, George Wickerman, foi assassinado na floresta. O romance foi parar na TV britânica: a minissérie Death comes to Pemberley, com três episódios, deve ser exibida no ano que vem. Nos papéis principais estão Anna Maxwell Martin e Matthew Rhys (foto).

Três perguntas para...

Raquel Sallaberry Brião
pesquisadora

Considerando que os títulos de Jane Austen são de domínio público, ainda é importante lançar novas traduções de obras dela em papel?

Primeiramente, quero esclarecer: apenas os originais em inglês de Jane Austen estão no domínio público. Ainda não temos tradução brasileira no domínio público. Isso ocorre 70 anos depois do falecimento do tradutor, conforme a Lei 9.610. As novas traduções são sempre importantes e bem-vindas, pois, com o passar do tempo, as traduções envelhecem, diferentemente do original.

O anonimato “forçado” de Jane e as circunstâncias em que ela escrevia ajudaram ou atrapalharam?

O anonimato era comum para escritores na época de Jane Austen, principalmente para mulheres de condição social mais elevada, pois havia um certo pudor em relação a trabalhos remunerados. O que valia era a excelência da obra, não a publicidade em torno dela. Quanto às circunstâncias, creio que eram boas, pois Jane tinha família estável social e economicamente, além de muito solidária nos tempos mais difíceis. Ela sempre foi incentivada, desde jovem.

Como a família reagiu ao fato de Jane Austen ser escritora?

 O reverendo Austen foi o primeiro a oferecer o trabalho da filha a uma editora (Orgulho e preconceito, ainda com o título First impressions) quando ela tinha apenas 22 anos. Mais tarde, seu irmão, Henry, encarregou-se de negociar os trabalhos.

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