Internacionalizar o produto cultural brasileiro é um desafio para artistas e companhias

Gestores estrangeiros vieram ao Rio de Janeiro discutir estratégias com grupos nacionais

por Carolina Braga 24/11/2013 06:00

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Dalton Valério/divulgação
Rodada de negócios promovida pelo Tempo Festival pôs artistas em contato com interessados em comprar espetáculos (foto: Dalton Valério/divulgação )
Rio de Janeiro
– Os espetáculos foram provocativos. Apontaram-se novos caminhos para as artes cênicas. Mas, se a quarta edição do Tempo Festival deixou alguma colaboração, ela não se deu exatamente em palcos, ruas, quadras e espaços utilizados para apresentações na capital fluminense. O evento, que será encerrado hoje, instigou artistas e produtores a discutir questões com as quais eles nem sempre lidam com tranquilidade.

Durante o 1º Encontro de Artes Cênicas e Negócios, falou-se de sustentabilidade fora dos limites das leis de incentivo, sobre a importância de festivais como irradiadores da produção artística e, principalmente, sobre a dificuldade do Brasil para exportar seus espetáculos. “A não ser o Grupo Corpo, não conhecemos muito das artes cênicas brasileiras”, informou o espanhol Ruperto Merino Solís, diretor-geral adjunto de programação cultural de Madri, capital da Espanha.

Além dele, desembarcaram na capital fluminense representantes de importantes festivais internacionais, como Mark Russel, do Under the Radar (Nova York); Carmen Romero, do Santiago a Mil (Chile); Bernard Faivre d’Arcier, da Biennale de Lyon: de la Danse et des Arts Visuels (França); Faith Lidell, do Festival de Edimburgo (Escócia); Ahmed El Attar, do D-CAF (Egito); e Dario Loperfido, do Festival Internacional de Buenos Aires (Argentina).

“Falta uma política cultural para a internacionalização de espetáculos e, paralelamente, o posicionamento dos grupos. Eles precisam começar a ver suas montagens como produtos culturais comercializáveis, além de tratar companhias como empresas”, recomenda Richard Santana, diretor artístico do Festival Internacional das Artes (Festia), que foi realizado pela primeira vez em BH no ano passado.

Platô Entretanto, não basta o discurso da internacionalização. Como Richard Santana lembra, é fundamental as companhias se prepararem para esse desafio. Em Minas, Espanca!, Luna Lunera, Teatro Invertido e Teatro Andante já se organizam. Em parceria com Marcelo Bones, esses grupos criaram a Platô – plataforma composta por oito espetáculos. A estreia se deu no Tempo Festival.

“Se circular dentro do Brasil já é um dos grandes desafios da produção teatral, levar trabalhos para fora do país ainda está em plano muito distante da maioria dos artistas. A plataforma é uma estratégia coletiva para diminuir esse abismo. Torcemos para que isso ocorra e possamos agregar parceiros”, afirma Leonardo Lessa, integrante do Grupo Teatro Invertido.

“Quando você junta quatro grupos, potencializa o trabalho. A cena de BH apresenta potencial nacional muito grande, mas quase nulo em termos de mundo. À medida que a gente consegue dividir custos, é possível mostrar a variedade dos quatro grupos. Desse modo, eles se transformam em carteira interessante para o programador”, explica Marcelo Bones.

Na quarta-feira passada, o diretor teve oportunidade de conversar detalhadamente com os convidados estrangeiros do Tempo Festival. Fez contato com curadores e grupos como o argentino Timbre4.

A lição dos hermanos

Idealizador do Fiba, evento realizado na capital argentina desde 1997, Dario Loperfido conta que inicialmente o projeto atendia à estratégia de Buenos Aires de se inserir no contexto internacional. A iniciativa associava teatro e turismo, funcionando também como instrumento de propaganda. “Mas não era uma cena exportável”, lembra Loperfido.

Dezesseis anos depois, a cena portenha mudou completamente. Hoje, a preocupação é realizar evento que vá além de meras apresentações teatrais. “Festival restrito a exibidor de espetáculos já não serve. Ele deve também criar o hábito de ver teatro, mas são necessárias ações laterais que tragam algo para a cidade e seus artistas”, ressalta.

O exemplo chileno é parecido. Fundado há cerca de 20 anos na capital do país, o Santiago a Mil, realizado em janeiro, começou como mostra de espetáculos. Hoje, ampliou esse formato. Sua idealizadora, Carme Romero, conta que, embora a arte chilena tenha alcançado desenvolvimento satisfatório na década de 1970, já havia outra geração prestes a encarar o mundo. A proposta não se resumiu a divulgar o que se faz no Chile, mas buscou possibilitar às companhias, geralmente mantidas sem subsídios do Estado, sobreviver por meio de apresentações tanto no país como no exterior.

Evento paralelo ao Santiago a Mil, o Platea recebe cerca de 120 programadores e curadores de todas as partes do mundo para negociar com artistas e produtores latino-americanos. Carme Romero avisa: políticas de internacionalização exigem árduo trabalho, cujos resultados não são imediatos.

“Não é fácil, mas temos alcançado a meta. Alguns espetáculos têm sido levados ao Uruguai e à Argentina”, diz. Romero considera o Brasil atrasado em termos de internacionalização. “Avançou-se muito, mas há um tema pendente. Vocês são um tremendo continente e circular por aqui custa caro”, conclui.

A repórter viajou a convite do Tempo Festival

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