Aos 82 anos Alice Munro conquista o Prêmio Nobel de Literatura de 2013

Contista retrata mulheres vivendo em regiões desoladas. Canadense tem quatro livros lançados no Brasil

por Estado de Minas 11/10/2013 07:50

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Peter Muhly/AFP
Alice Munro, aos 82 anos, se surpreendeu com o anúncio do Nobel, embora figurasse em segundo lugar na bolsa de apostas (foto: Peter Muhly/AFP)
Alice Munro escreve contos ambientados em regiões desoladas do Canadá. Suas personagens são sempre mulheres comuns, ainda que por vezes fora do padrão, que vivem momentos de transformação em suas vidas. Em suas histórias, parece que nada acontece, que falta movimento, que o desenlace é indefinido. No entanto, ela não se perde em moralismos ou niilismo, atenta sempre à verdade íntima. O estilo é clássico, sem experimentalismos, e os conflitos políticos parecem não habitar seu universo. Com esses ingredientes, aparentemente pouco valorizados no cenário da literatura contemporânea, ela foi escolhida pela Academia Sueca como a ganhadora do Prêmio Nobel de Literatura de 2013. Alice, de 82 anos, vai receber R$ 2,72 milhões.

Em seu comunicado, a academia justifica a escolha: “Suas histórias se desenvolvem geralmente em cidades pequenas, onde a luta por uma existência decente gera muitas vezes relações tensas e conflitos morais, ancorados nas diferenças geracionais ou de projetos de vida contraditórios”. De acordo com o Twitter oficial do Nobel, os responsáveis pela comunicação do prêmio não conseguiram falar com a escritora antes do anúncio, deixando um recado em sua secretária eletrônica.

Nome sempre lembrado entre os favoritos, Alice Munro é a 13ª mulher a ganhar o prêmio. A última premiada havia sido Herta Müller, em 2009. Outro canadense já havia recebido o Nobel, Saul Bellow, mas ele se naturalizou norte-americano e fez toda a sua carreira nos EUA. A obra de Alice Munro é ambientada no Canadá, em regiões rurais ou próximas a pequenas cidades, marcadas pelo isolamento – perto da desolação. Essa característica destaca ainda mais a força de suas personagens. As histórias da contista são relativamente longas para o padrão habitual do conto, quase pequenas novelas, e sempre protagonizadas por mulheres. Há uma atmosfera de desencanto, mas que não impede certa esperança que é resultado da lucidez.

Nascida em 10 de julho de 1931, em Wingham, Alice Munro já foi chamada pela crítica de “a Tchekhov canadense”. Com 14 livros publicados, quatro deles lançados no Brasil – três pela Companhia das Letras ('A fugitiva', 'Felicidade demais' e  'O amor de uma boa mulher') e um pela Globo ('Ódio, amizade, namoro, amor, casamento') – ela já ganhou outros prêmios internacionais de prestígio, como Man Booker Prize, de 2009.

Em julho, a contista havia anunciado que se aposentaria. Segundo Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras, sua última obra, Dear life, com quatro histórias autobiográficas, já está traduzida, pronta para ser publicada no país. Outros três livros de Alice Munro ainda inéditos no Brasil serão lançados em 2014. Além da reedição, em dezembro, do livro de contos Ódio, amizade, namoro, amor, casamento, a Globo Livros lançará traduções de 'Selected stories' (1996), 'Runaway' (2004) e 'The view of Castle Rock' (2006).

Alice estreou na literatura em 1968. A partir daí, escreveu seus livros enquanto criava as três filhas e ajudava o marido, dono de uma livraria. Foi casada duas vezes (seu segundo marido morreu em abril deste ano) e vive hoje em um chalé do século 19. Em 2009, a escritora se submeteu a uma cirurgia de ponte de safena e foi tratada de câncer. Reservada, não é vista habitualmente em eventos literários que se tornaram febre no mundo e trampolim para todo tipo de vaidade. Alice Munro poderia ser uma personagem de Alice Munro.

Frankfurt

Na Feira do Livro de Frankfurt, Kristin Cochrane, diretora-executiva da McClelland & Stewart Doubleday Canadá – casa que publica Munro desde o início da carreira –, disse que não havia  muita expectativa pelo prêmio, embora Munro aparecesse em segundo lugar nas listas de apostas para o Nobel dias antes da premiação. “Ela aparecia na lista todo ano e também temos outros nomes lá. O que a gente tem sempre é esperança”, disse.

Para Cochrane, o diferencial da autora é “um olhar atento para como as pessoas são no mundo, a capacidade de prestar atenção nos detalhes do dia a dia e de cada um”. “Ela já é bem traduzida, mas fico feliz que com o prêmio mais pessoas possam ter acesso à obra dela. Como é uma observadora muito universal, torna-se facilmente acessível”, avaliou a editora.

“Sabia que estava na disputa, sim, mas nunca pensei que venceria”, disse Munro à agência The Canadian Press, em Victoria. A escritora contou ao canal de TV CBC que foi acordada pela filha, que deu a notícia sobre o prêmio. “Estamos no meio da noite aqui e havia esquecido totalmente”, disse.

Alice Munro no Brasil

CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO
(foto: CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO)



'Fugitiva'
Foi o primeiro livro da escritora lançado no Brasil, em 2006. Nas oito histórias que integram o livro, as protagonistas, sempre mulheres, caminham entre problemas do dia a dia e tragédias pessoais. O cenário é sempre o mesmo: as paisagens desoladas do Canadá, o que destaca ainda mais o aspecto moral e psicológico das narrativas






CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO
(foto: CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO)


'Felicidade demais'
Lançado no Brasil em 2010, reúne 10 contos, todos também protagonizados por mulheres. Como é comum em narrativas da autora, as personagens sempre se deparam com acontecimentos que podem mudar suas vidas. O conto que dá título ao livro é um relato de ficção inspirado em uma personagem real: a russa Sophia Kovalevsky, que viveu na segunda metade do século 19 e destacou-se pelo pioneirismo na matemática.






CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO
(foto: CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO)



'O amor de uma boa mulher'
Publicado originalmente em 1998 e lançado no Brasil neste ano. Contos ambientados no Condado de Huron, na zona rural canadense, com personagens marcados pela diferença: a velhice, a decadência física, o abandono, a doença mental. Com histórias passadas na década de 1950, narra momentos definidores na vida de mulheres em posição de desconforto frente às regras sociais.






CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO
(foto: CIA. DAS LETRAS/REPRODUÇÃO)



'Ódio, amizade, namoro, amor, casamento'
Lançado no Brasil em 2004, reúne histórias aparentemente banais, como a tentativa de resolver uma carência afetiva com cartas de amor, a sedução de uma mulher por um adolescente, a atração entre duas amigas, a busca de uma mulher por um bilhete póstumo deixado pelo marido, um cético que se suicida.






Mulheres que ganharam o Nobel de Literatura

2013 – Alice Munro (Canadá)
2009 – Herta Müller (Alemanha)
2007 – Doris Lessing (Grã-Bretanha)
2004 – Elfriede Jelinek (Áustria)
1996 – Wislawa Szymborska (Polônia)
1993 – Toni Morrison (EUA)
1991 – Nadine Gordimer (África do Sul)
1966 – Nelly Sachs (Suécia)
1945 – Gabriela Mistral (Chile)
1938 – Pearl Buck (EUA)
1928 – Sigrid Undset (Noruega)
1926 – Grazia Deledda (Itália)
1909 – Selma Lagerlöf (Suécia)

Vencedores do prêmio no século 21

2013 – Alice Munro (Canadá)
2012 – Mo Yan (China)
2011 – Tomas Tranströmer (Suécia)
2010 – Mario Vargas Llosa (Peru)
2009 – Herta Müller (Romênia/Alemanha)
2008 – J. M. Le Clézio (França/Ilhas Maurício)
2007 – Doris Lessing (Pérsia/Reino Unido)
2006 – Orhan Pamuk (Turquia)
2005 – Harold Pinter (Inglaterra)
2004 – Elfriede Jelinek (Áustria)
2003 – J. M. Coetzee (África do Sul)
2002 – Imre Kertész (Hungria)
2001 – V.S. Naipaul (Trinidad e Tobago/Reino Unido)

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