Idealizado em BH, Encontro Mundial de Artes Cênicas se transfere para São Paulo

Após 15 anos de edições na capital mineira, Ecum se muda para a metrópole paulista; mineiros lamentam falta de apoio público ao projeto

por Carolina Braga 22/02/2013 09:28

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Valentina Aires/Divulgação
Centro Internacional de Teatro já está em funcionamento na Rua da Consolação, em São Paulo (foto: Valentina Aires/Divulgação)
Foram sete edições ao longo de 15 anos. Por ele passaram referências de alto quilate do teatro contemporâneo internacional, como Ariane Mnouchkine, Eugênio Barba e Yoshito Ohno. Mais de 20 mil estudantes e pesquisadores de artes cênicas puderam se reciclar a partir do contato direto com essas e outras tantas figuras de peso. A relevância do Encontro Mundial de Artes Cênicas, o Ecum, já era incontestável no Brasil e fora do país. Mas era preciso mais. E foi aí que Belo Horizonte saiu perdendo.

A falta de reconhecimento e apoio por parte do poder público sobre a importância da realização de eventos voltados para o pensar artístico na cidade, ainda que de modo muito especializado, fez com que o Ecum não apenas se transferisse para São Paulo, mas incrementasse ainda mais a programação. Inaugurou na capital paulista um calendário permanente de ações voltadas para a formação e a reciclagem de profissionais do teatro e da dança, além de uma ampla agenda de espetáculos.

“Chegou um momento em que a situação estava um pouco difícil em Belo Horizonte. Ter uma sede era um sonho antigo. Ao longo desses 15 anos, sentimos a necessidade de ampliar as ações e ter um projeto artístico pedagógico. Na edição de 2010, tive alguns recuos de patrocínio, o que dificultou bastante a continuidade do projeto”, conta o idealizador e diretor-geral do Ecum, Guilherme Marques. Resultado? Nasceu o Centro Internacional de Teatro, o CIT Ecum.

O espaço abriu as portas este mês no prédio ocupado pelo Teatro Coletivo, na Rua da Consolação, região central de São Paulo. O local foi reformado para acolher tanto as apresentações como os fóruns e workshops, além das ações pedagógicas, programadas para começar em junho. “O nosso desejo com a ampliação é ter a possibilidade de um mergulho maior dentro dessa pedagogia, técnicas e reflexões”, explica Guilherme.

Além dele, a equipe do CIT Ecum tem Ruy Cortez na direção artístico-pedagógica, a consultoria de Antônio Araújo, diretor do Grupo Teatro da Vertigem, Maria Thais, da Cia Balangan, e a participação de Fernando Mencarelli e Ana Teixeira como diretores associados. A ideia é que o Ecum não perca sua característica de espaço para o pensamento cênico, mas outras novidades estão por vir. “Teremos desde pequenos workshops até cursos extensivos a longo prazo, sem caracterizar uma escola no sentido burocrático da coisa”, ressalta Marques.

O calendário com 23 espetáculos – a maioria de São Paulo – inaugura as atividades até junho. Foram escolhidas montagens que já tenham estreado e cumprido trajetória relevante no cenário da cidade. O ator Cacá Carvalho é o primeiro a subir ao novo palco, com a Trilogia Pirandello. Até 10 de março, ele apresenta os três espetáculos, criados a partir da dramaturgia do autor italiano, com direção de Roberto Bacci.

Na sequência, a primeira rodada de trocas de experiências internacionais está marcada para junho e deve abordar o teatro latino-americano e a cultura popular. “O que queremos é investigar em uma perspectiva mais transversal as teatralidades, as vozes que compõem os teatros da América Latina. O que ele tem de singular é sua diversidade”, comenta Ruy Cortez.

Quando fala sobre a mudança do Ecum de Belo Horizonte para São Paulo é impossível não reconhecer no discurso de Guilherme Marques certa tristeza, mas sem mágoa. “BH é o berço de tudo. Encontrei-me em uma situação de sinuca de bico, tive um convite para ampliar o projeto, mas isso não quer dizer que vamos tirar as ações daí”, garante.

Ele adianta que há conversas em andamento para que Minas receba parte da programação do fórum. A realização integral do evento também não é descartada pelo diretor. “Para mim, é uma questão de honra manter o projeto em Belo Horizonte. É um patrimônio para os artistas”, completa.

Artistas cobram incentivo
Lamentar é um verbo que o pesquisador e professor Luiz Carlos Garrocho não costuma e nem gosta de usar. Mas quando se trata da transferência do Ecum para São Paulo, inevitavelmente a palavra aparece. “Isso é um fracasso de política pública. Tem que ser com essas palavras”, protesta. Na avaliação do pesquisador, a troca da cidade sede confirma um movimento cíclico comum em BH.

“Nas décadas de 1960, 70, todo mundo falava que você tinha que sair daqui. Nos anos 1990, começaram a surgir grandes eventos, principalmente organizados pela sociedade civil, e aí caiu por terra essa ideia. Estou desconfiado de que está ocorrendo isso de novo”, comenta. Participante de quase todas as edições, para Garrocho o Ecum foi um divisor de águas nas artes cênicas de Belo Horizonte. “Foi um manancial de compartilhamentos de informações e de formação. Mudou tudo. Foi uma escola fundamental”, avalia.

“Acho o Ecum um dos maiores acontecimentos teatrais. É rico, profundo, abrangente, abre para o debate. É uma rede de trocas, uma rearticulação de práticas”, opina a pesquisadora Cristina Tolentino. Também presente em todas as edições, se for preciso, planeja ir a São Paulo para acompanhar as ações do projeto. “O Ecum se multiplicou pelo Brasil e no mundo inteiro. De repente, a gente perde por falta de incentivo, de patrocinador. Acho uma pena”, lamenta.

Acervo virtual
Entre as novas ações do CIT Ecum está a digitalização de todo o acervo do projeto desde a sua criação. Uma plataforma virtual vai disponibilizar na rede vídeos e transcrições das conferências que foram realizadas em Belo Horizonte entre 1998 e 2006. O conteúdo está disponível provisoriamente no www.ecum10anos.com.br. Todas as atualizações do novo CIT Ecum podem ser encontradas no www.citecum.com.br.

Reflexão e prática
O Ecum é um espaço de reflexão e intercâmbio entre artistas, pesquisadores, professores, estudantes e interessados nos diversos campos das artes cênicas. O diferencial é proporcionar encontro entre a reflexão e a prática criativa, o pensamento e a ação, nas múltiplas etapas do processo de criação. Entre as ações desenvolvidas estão encontros internacionais bienais com workshops, conferências, demonstrações de trabalhos, exposições e apresentação de espetáculos.

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