Jardins criados por Burle Marx na orla da Pampulha vão ser restaurados a partir do projeto original.

Reforma abrange paisagismo no MAP, Casa do Baile, Casa JK, Igrejinha e Praça Alberto Dalva Simão

por Sérgio Rodrigo Reis 11/08/2012 08:50

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acervo museu abílio barreto
Jardim da Igrejinha da Pampulha vai retomar sua inspiração original, com plantio de rosas dedicadas à Virgem Maria (foto: acervo museu abílio barreto)
 
O paisagista Roberto Burle Marx (1909-1994) ensaiou uma mudança de paradigmas no paisagismo brasileiro nos jardins projetados para a região da Pampulha, em Belo Horizonte, em meados dos anos 1940. Se até então prevaleciam no país influências estrangeiras, como os jardins franceses – que não aceitavam ondulações no terreno, eram projetados em planos rígidos, circulares ou ortogonais, com linhas retilíneas, além de submeter a vegetação a figuras geométricas –, a opção de Burle Marx, que também foi artista plástico, se inspirava na assimetria presente na natureza. Com esse raciocínio se tornou referência internacional.

O patrimônio histórico e artístico que o paisagista deixou em solo mineiro há décadas sofre com a depredação, falta de manutenção e com interferências errôneas do poder público. Atualmente, quem visita os cinco jardins na orla da Lagoa da Pampulha – o do Museu de Arte da Pampulha (MAP), da Casa do Baile, da Igrejinha, da Residência Kubitschek e da Praça Alberto Dalva Simão –, consegue perceber poucas referências do projeto original. A situação deverá mudar em breve, com a implementação da maior revitalização já feita até então sobre o conjunto. Se tudo correr como planejado, a capital mineira deverá retomar novamente o título de referência internacional do paisagismo com a volta dos antigos cartões-postais.

Promovida pela Fundação Municipal de Cultura/PBH, por meio da Diretoria de Patrimônio, com apoio da iniciativa privada, o projeto de revitalização está cercado de complexidade. A começar pela recuperação das informações dos projetos originais. Com o tempo, parte se perdeu. A solução encontrada pelo consultor técnico do projeto, o arquiteto, urbanista e autor do livro Arquitetos da paisagem Ricardo Lana, foi buscar em fotografias antigas e documentação de época alternativas para recuperá-los. O processo começa no próximo mês, a partir do MAP e da Casa do Baile. 

“Será a primeira grande intervenção de restauração de todo o conjunto dos jardins, trazendo de volta a proposta original. Também faremos a irrigação e a iluminação. O projeto prevê ainda a manutenção por cinco anos”, adianta o diretor de Políticas Museológicas da Fundação Municipal de Cultura, Leônidas Oliveira. Segundo ele, a demora na execução tem se dado, sobretudo, pela dificuldade em se encontrarem as plantas para os espaços. A operação é complexa, pois boa parte das espécies é típicas da flora nativa, como os campos rupestres, e são difíceis de se encontrar reposição. A parceria com a Fundação Zoobotânica deverá garantir a reprodução das plantas. 

Inspiração das montanhas

Burle Marx conheceu o paisagista Henrique Lahmeyer Mello Barreto nos anos 1940, em Araxá, quando trabalharam na execução do Parque do Barreiro. Mello era grande conhecedor da flora nativa e empregava essas espécies em seus projetos. “Burle Marx falava sempre que foi o mestre que teve”, conta Ricardo Lana. Depois da execução do parque, ele recebeu o convite do JK para realizar os jardins na Pampulha e resolveu empregar o conhecimento do amigo paisagista. “Em Minas, deu a dimensão mais ampla às primeiras experiências de diálogo e observação da natureza, algo iniciado ainda quando trabalhou no Recife”, explica. 

Ricardo Lana não concorda com a tese de que o paisagista se inspirou nas artes visuais para criar as soluções plásticas dos jardins. “Há uma corrente que considera o trabalho de paisagismo uma extensão da pintura dele. Não concordo. Acho que o vocabulário do paisagismo veio, na verdade, de uma observação perspicaz da natureza.” Mas basta observar os jardins para encontrar vários exemplos de aproximação com as teorias da arte e da pintura, como os contrapontos de cores e as formas curvas e onduladas dos canteiros e espelhos d’água. 
 
Futuro dos jardins 

Praça Alberto 
Dalva Simão
O projeto original, sofisticado para os padrões da época, se deteriorou e, nos anos 1970, foi refeito pelo próprio Burle Marx. Foi nspirado na flora que predomina nos cumes das serras de minério de ferro no entorno da capital: a vegetação de canga. Também conhecida como campos rupestres ferruginosos, ela ocorre num solo com alta concentração de metais pesados, deficiência de água, escassez de substrato e nutrientes, alta insolação e grandes variações de temperatura (elevadas durante o dia e frias 
à noite). A proposta é recuperar 
o paisagismo. 

Residência JK
Nos fundos da casa que pertenceu ao ex-presidente, Burle Marx fez outro jardim de canga, que deverá ser restaurado com as mesmas plantas utilizadas em 1942. Atualmente, só existe a estrutura dos canteiros. Na frente da edificação, o espelho d’água será recuperado. Outra novidade que o visitante encontrará é a restauração de todo o mobiliário modernista, que estará exposto, além de um painel de Volpi. “Lá se encontrará um ambiente modernista completo, com os jardins, a residência, o mobiliário e as obras de arte”, adianta Ricardo Lana. 

Casa do Baile
De todos os jardins, é hoje o mais bem preservado. Os projetos originais se perderam e as revitalizações vêm sendo realizadas a partir das fotos e recibos de compras de mudas utilizadas por Burle Marx. O canal entre a ilha onde fica a edificação e a rua será represado, para resolver o problema de depósito de todo tipo de detritos que ali se acumulam num remanso. No local será construído uma espécie de aquário com água tratada, com peixes e ninfeias. 

Museu de 
Arte da Pampulha
Ao longo dos anos, foi acumulando, segundo Lana, uma série de equívocos no paisagismo. “O conceito inicial foi alterado com o plantio de espécies de vegetação que formaram uma barreira visual ao prédio do antigo Cassino. A intenção é que, no novo paisagismo, o prédio volte a se comunicar visualmente com o entorno. Outro sistema de iluminação trará mais visibilidade para o prédio e o antigo piso 
de vidro será refeito, valorizando ainda mais a fachada.

Igrejinha de São Francisco
O projeto original foi totalmente descaracterizado. Os jardins foram criados como uma homenagem à Virgem Maria. A proposta era de que, no entorno do templo, fossem plantadas roseiras. 
A proposta atual recupera não 
só aquele pensamento como devolve a assimetria dos canteiros, restabelecendo um diálogo com o monumento, 
os painéis e as obras de 
arte modernistas presentes 
no entorno.  


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