Produção mineira estreia nesta quarta-feira (16) no Festival de Cannes

'Chuva é cantoria na aldeia dos mortos', uma história de ficção filmada com o povo krahô e produzida por Ricardo Alves Jr. e Thiago Macêdo Correia

por Márcia Maria Cruz 16/05/2018 09:00

Renee Nader Messora/Divulgação
O longa tem direção de Renée Nader Messora e João Salaviza e mostra um filho que perdeu o pai na preparação do ritual de fim de luto. (foto: Renee Nader Messora/Divulgação)

Chuva é cantoria na aldeia dos mortos, de Renée Nader Messora e João Salaviza, único representante brasileiro na mostra Um Certo Olhar, paralela à competição oficial pela Palma de Ouro no Festival de Cannes, estreia nesta quarta (16) na Croisette, com duas sessões (às 14h e às 22h15, no horário local). A produção do longa é dos mineiros Ricardo Alves Jr e Thiago Macêdo Correia, da Entre Filmes, empresa sediada em Belo Horizonte.

“O filme será visto por um grande número de pessoas de várias partes do mundo. Termos sido selecionados para essa prestigiosa mostra desperta mais curiosidade sobre o filme no público presente ao festival”, afirma Ricardo Alves Jr. O lançamento do longa no Brasil está previsto para o final do ano ou o início de 2019.

A história de Chuva é cantoria na aldeia dos mortos gira em torno de Ihjac, jovem do povo krahô, que, depois de se encontrar com o espírito do pai falecido, vê-se obrigado a realizar a festa de fim de luto. “A vida indígena é altamente ritualizada, e o filme se centra num ritual – a festa de fim de luto. Durante a vivência na aldeia, os realizadores conheceram o rapaz cujo pai tinha morrido. O espírito do pai aparecia para ele, bem como outros espíritos, duplos, desdobramentos, aquilo a que os krahô chamam ‘mcaro’”, conta o produtor.

Embora o filme tenha elementos documentais, é uma ficção. “O que se passava, na leitura indígena, é que esse rapaz estava sendo chamado para se tornar pajé, alguém que cura, que fala com os espíritos. Mas ele não queria. Tinha medo desse poder, dessa responsabilidade. Lutou contra o chamamento”, diz Ricardo. O ator que interpreta Ihjãc não é o mesmo integrante dos krahô que passou pela experiência relatada no filme. No entanto, as relações familiares retratadas são as mesmas da vida real – a mulher, a mãe e os irmãos do ator são de fato seus parentes. As cenas coletivas de festa também de ritual são documentais.

ATO POLÍTICO
Embora o filme seja o representante brasileiro na mostra Um Certo Olhar, não será o português a língua ouvida em Cannes. “Chuva é um filme com os krahô, na terra krahô, falado em krahô. E isso é um ato político”, destaca o produtor, que também enxerga como um ato político a seleção do título por Cannes. “O que será visto na Croisette não é filme feito no centro do Brasil. Não é o país branco ou da ideia de progresso”, diz, ressaltando que o festival preferiu olhar para o Brasil pouco visto, com essa representação da cosmologia do povo krahô.

Para que os diretores estabelecessem uma relação de proximidade e respeito com aquela etnia foram necessários nove meses de filmagens. Mas o contato de Renee Nader Messora com o povo krahô teve início em 2009. A diretora iniciou trabalho na comunidade, que previa a mobilização do coletivo de cinegrafistas e fotógrafos indígenas, o Mentuwajê Guardiões da Cultura.

Sem estar acompanhados de equipe técnica externa, os diretores fizeram a captação em negativo 16mm. “Renée Nader Messora atua há pelo menos nove anos na aldeia desenvolvendo projetos de cinema com grupo de jovens cinegrafistas na aldeia. Eles mesmo filmam suas celebrações, sua vida cotidiana, seus rituais”, conta Ricardo.

O produtor conheceu o casal de diretores há 12 anos, quando estudaram cinema na Universidad del Cine em Buenos Aires. No ano passado, Ricardo codirigiu com João Salaviza o curta Russa, selecionado este ano pelo Festival de Berlim. Russa foi fotografado por Renée.

 

Abaixo, confira o trailer: 

 

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