Em 'Sob pressão', Andrucha Waddington faz versão brasileira sobre o dia a dia de uma unidade cirúrgica

Longa-metragem estreia nesta quinta-feira, 17, e investiga as relações humanas

por Mariana Peixoto 17/11/2016 09:33

PÁPRICA FOTOGRAFIA/DIVULGAÇÃO
Júlio Andrade é o cirurgião Evandro em 'Sob pressão'. (foto: PÁPRICA FOTOGRAFIA/DIVULGAÇÃO)

Numa manhã, um homem exausto deixa um prédio. Dá início a uma conversa banal com um ambulante. Pede um café e um misto-quente. Quando o lanche fica pronto, uma sirene chama sua atenção. O misto permanece intocado porque o homem assiste à chegada de uma ambulância. Corre para ver o tamanho do problema. Veste um jaleco branco e entra novamente no prédio.


Sob pressão, longa-metragem de Andrucha Waddington que estreia hoje em Belo Horizonte, relata, durante uma hora e meia, um dia na Unidade Vermelha, como é chamada a seção dedicada a cirurgias de urgência de um hospital público no Rio de Janeiro. Nada é simples. O hospital fica junto a uma favela dominada pelo tráfico. Sofre com todas as carências do sistema público de saúde (faltam leitos, equipamentos, sangue, profissionais) e com a guerra entre o tráfico e a polícia.

Um plano-sequência de seis minutos apresenta a cena descrita acima. Evandro (Júlio Andrade) é o exaurido cirurgião que passa dias e noites no hospital. Ao chegar à ambulância, ele se depara com dois homens muito feridos. Um é traficante, o outro um cabo da PM. O superior dele, o Capitão Botelho (Thelmo Fernandes) chega junto ao cirurgião dando ordens. Tem que priorizar o policial, o traficante pode morrer.

O embate entre os dois mostra que o conflito entre eles é corriqueiro. Evandro não quer saber: o homem que estiver precisando de cuidados mais urgentes terá prioridade. Ao mesmo tempo, chega ao hospital uma criança com os pais. O menino foi baleado na perna há pouco na Avenida Brasil.


Evandro não se abala. Encarrega um inexperiente residente a despeito das investidas da administradora do hospital (Andréa Beltrão). O menino é filho de um poderoso dono de jornal, ela se lembra, então qualquer deslize poderá colocar o hospital nas manchetes. O cirurgião não muda sua opinião.

Em 90 minutos, as relações entre os cirurgiões, enfermeiras, administradores e pacientes é colocada à prova mais de uma vez. Waddington filma a narrativa com a urgência necessária. Câmera na mão, montagem acelerada, muitos planos fechados de cirurgia (mas nada que fira aos olhos e que as séries médicas não tenham apresentado). Ainda que o pano de fundo seja as disparidades brasileiras sob a ótica do sistema público de saúde, o que mais importa ao filme são as relações humanas.

Sob pressão é um projeto antigo da Conspiração Filmes, a produtora carioca criada há 25 anos por Waddington e outros sócios como Cláudio Torres e Breno Silveira. Nasceu como uma série de TV (que seria dirigida por Torres), mas o projeto não foi pra frente.

O cirurgião Márcio Maranhão, que atuou no sistema público carioca, foi consultor da produção. Durante o processo da série, ele acabou escrevendo, junto à jornalista mineira Karla Monteiro, o livro Sob pressão: A rotina de guerra de um médico brasileiro (Editora Foz, 2014). Para o longa, foi novamente consultor.

O filme foi todo rodado em uma locação: a Santa Casa de Misericórdia, em Cascadura, na Zona Norte carioca. ''Ela foi referência na região entre os anos 1920 e 1930 e hoje tem algumas alas desativadas'', conta Waddington. Foram justamente essas as utilizadas nas filmagens. Durante as seis semanas em que a história foi rodada, Maranhão e outros três médicos acompanharam as gravações.

''Quando você fecha a porta da centro cirúrgico, o médico vira deus. É uma área muito reservada e a gente estava dentro de um mundo que não pertencíamos. Então, um laboratório foi necessário para entender o código de conduta dos médicos, o encadeamento dos procedimentos'', acrescenta Waddington.

Com a profusão de séries médicas no ar, e o próprio histórico, é natural que Sob pressão migre para a televisão. Durante a preparação para o longa, Waddington se debruçou na série The knick (dirigida por Steven Soderbergh e protagonizada por Clive Owen). ''Existe o DNA disto. Mas, uma vez com o filme lançado, não queremos fatiá-lo em vários episódios. Seria um outro projeto'', admite o diretor, que, pelo menos por ora, deixa o universo médico de lado.

Em 19 de janeiro, o cineasta lança Os penetras: Quem dá mais?, continuação da comédia com Marcelo Adnet, Danton Mello e Mariana Ximenes que levou 2,5 milhões de pessoas aos cinemas em 2012. Já no segundo semestre do próximo ano ele roda Chacrinha: O filme.

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