CineBH, que começa nesta quinta, destaca produção de Portugal

Mostra, com programação gratuita, será realizada até o dia 24 nos cines Humberto Mauro, 104, MIS Santa Tereza, Sesc Palladium e no Teatro Sesiminas

por Walter Sebastião 19/10/2016 08:10

André Kosters/AFP - 1/1/03
Diretor português João César Monteiro ganha retrospectiva (foto: André Kosters/AFP - 1/1/03)
“Não queremos ser só vitrine para os filmes, mas discutir o cinema que vem sendo realizado hoje”, afirma Francis Vogner dos Reis, curador da CineBH em parceria com Pedro Butcher. O evento começa nesta quinta (20) com a exibição, no Teatro Sesiminas, de Elon não acredita na morte, dirigido pelo mineiro Ricardo Alves Jr.

Até dia 27, serão exibidos 35 longas, um média-metragem e 21 curtas de diretores brasileiros e estrangeiros, com entrada franca, no Cine Humberto Mauro, Cine 104, MIS Cine Santa Tereza, Sesc Palladium e Teatro Sesiminas. Uma das atrações é a produção portuguesa contemporânea, que ganha reverência como uma das cinematografias mais originais do mundo.

A consideração com os portugueses ecoa no tema geral da mostra: O plano contra a imagem – Cinema da resistência. Inspirada nas ideias do diretor Pedro Costa, ela propõe a compreensão do cinema como “recorte do real” movido pelo desejo de celebrar complexidades e ambiguidades tanto da sétima arte quanto do mundo. Ficará explícita a oposição a produções saturadas de aspectos mercadológicos.

“Procuramos fazer da CineBH arte de resistência ao caminho que faz do cinema algo esgotado e esgotável”, explica o curador, de forma elegante, mas sem esconder a crítica ao que considera vulgaridade publicitária a serviço da venda de produtos. “Cultura é a regra. Arte é exceção”, reforça ele, citando Godard.

“A arte pode, sim, ser um ponto de vista crítico frente ao seu tempo”, afirma Francis Vogner, observando que há diretores em todas as latitudes, inclusive em Hollywood, questionando a instrumentalização do cinema pela indústria e pelo comércio. Essa prática tem várias faces: vai da não obediência a códigos e regras das estéticas dominantes ao investimento em poéticas ou pontos de vista particulares, passando pela realização de filmes difíceis de serem classificados em rótulos disponíveis no mercado.

“Reconhecemos no cinema português contemporâneo um celeiro de invenções e autonomia artística”, ressalta Vogner, justificando o destaque aos lusos: “É isso que mantém o cinema vivo em qualquer época”.

Com cenas arejadas e dramaturgia elementar, esses diretores lutam para que o cinema tenha pertinência, movido por práticas que dão corpo a obras voltadas, de modo radical, para a matéria das coisas, observa Vogner. “Nossa proposta é aceitar o debate proposto por muitos cineastas em atividade em todo o mundo. Há filmes que são provocações, mas há também realizações sólidas que antagonizam com a mercantilização frívola da imagem”, explica.

O curador evita chamar os filmes da CineBH de experimentais ou vanguardistas, ressaltando que se trata de obras distintas da imagem que se formou acerca desses conceitos. Também não considera nostalgia ou passadismo o fato de a evocação aos mestres do cinema ser aspecto recorrente nos filmes. “Cinema é arte do presente carregada de passado e de possibilidades do vir a ser”, argumenta Francis Vogner. “Quem fica perguntando sobre o futuro do cinema é a indústria”, ironiza.


De acordo com ele, a mostra mineira se propõe a exibir realizações que reagem à automatização da forma cinematográfica – como fizeram Charles Chaplin, John Ford, Jean-Luc Godard, Roberto Rossellini e Alfred Hitchcock, entre outros. “Esses diretores têm visões pessoais do mundo com poéticas muito autorais que sempre fizeram parte da história do cinema”, conclui.

PORTUGUESES O curador aconselha o público a assistir à retrospectiva dedicada ao cineasta português João César Monteiro (1939-2003), em especial aos filmes Vai e vem (2003) e A comédia de Deus (1995). Também recomenda os longas Correspondências (2016), da lisboeta Rita Azevedo Gomes; Eldorado XXI (2016), da portuguesa Salome Lamas; Elon não acredita na morte, do mineiro Ricardo Alves Jr.; e a produção americana Field niggas (2016), de Khalik Allah.


Vogner chama a atenção para os filmes La calle de la amargura, de Arturo Ripstein, “o mais importante cineasta mexicano vivo”, e para Ta’ang (2016), do documentarista chinês Wang Bing. “Ele faz filmes longos, árduos e difíceis, mas compensa vê-los por trazerem visões brutais e cruas da realidade”, destaca.

10ª CINEBH

Quinta: Abertura, às 20h. Exibição de Elon não acredita na morte. Teatro Sesiminas. Rua Padre Marinho, 60, Santa Efigênia. Entrada franca
Programação completa: www.cinebh.com.br. Informações: (31) 3282-2366. Até dia 24, será realizado o seminário ‘‘Brasil Cinemundi: 7th International Coproduction meeting’’.

Movimentos sociais

O diálogo da sétima arte com os movimentos sociais estará expresso na mostra Cinema em Movimento, que começa sábado (23), às 18h, com a exibição, no MIS Cine Santa Tereza, do longa Dandara: enquanto morar for um privilégio, ocupar é um direito, de Carlos Pronzato. Até dia 27, em diferentes espaços, o público poderá conferir dois longas, oito curtas e dois médias-metragens.

Essas realizações abordam ocupações de espaços públicos, feminismo, ativismos culturais e a retomada do carnaval de rua, entre outros temas. Serão realizadas rodas de conversa com participação dos integrantes desses movimentos.

Chico de Paula, curador da mostra, explica que priorizou trabalhos com forte caráter de registro e documentação. “Com imagens cruas e conversa direta, esse cinema fala de problemas, às vezes antigos, que continuam sem solução”, observa. “São filmes que mostram uma Belo Horizonte pouco conhecida”.


SAIBA MAIS

JOÃO CÉSAR MONTEIRO

O diretor português João César Monteiro Santos (1939-2003) integrou o grupo que criou o movimento Novo Cinema, na década de 1960. Suas obras foram premiadas nos festivais de Cannes e de Veneza. A retrospectiva dedicada a Monteiro apresentará oito filmes: A comédia de Deus (1995), À flor do mar (1986), As bodas de Deus (1986), Branca de Neve (2000), Le bassin D.W (2007), Recordações da casa amarela (1989), Silvestre (1981) e Vai e vem (2003).

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