Os formatos também são diversos: há adaptações em episódios ('Outras estórias', 1999, de Pedro Bial) ou docudrama ('Sertão: Veredas', 2008, de Willy Biondani).
Para sua estreia no cinema, o diretor Luiz Henrique Rios buscou como referência a mais assistida adaptação de Rosa, a minissérie 'Grande sertão: Veredas', de Walter Avancini (1985). 'Meus dois amores', que será lançado nesta quinta-feira em cinco capitais, Belo Horizonte incluída, é uma tentativa de levar o universo roseano para as massas.
Meus dois amores partiu de 'Corpo fechado', um dos nove contos de 'Sagarana' (1946). Na história de Rosa, um falastrão que posa de valente é dono de uma mula cobiçada por feiticeiro. Um valentão anuncia que vai passar a noite com a noiva do protagonista. Este, temendo o confronto, vai atrás do feiticeiro, que lhe fecha o corpo em troca do animal.
Esse núcleo é mantido por Rios em sua adaptação. Filmado em Carrancas, no Campo das Vertentes e numa fazenda no interior fluminense, Meus dois amores ganha subtramas para garantir fôlego à história.
O protagonista Manuel, interpretado por Caio Blat, divide-se entre o amor da noiva Das Dô (Maria Flor) e o da mula Beija-fulô. Vivendo de pequenos golpes, ele vende um cavalo que já viveu dias melhores para o matador Targino (Alexandre Borges). Quando se descobre enganado, Targino, homem procurado por também “roubar” virgens no dia do casamento, resolve dar o troco em Manuel. Covarde, o falastrão rende-se a Toniquinho das Pedras (Julio Adrião), que lhe fecha o corpo. Em meio ao imbróglio, Manuel ainda tenta o reconhecimento do pai, interpretado por Lima Duarte, coronel que espalhou filhos bastardos na região.
Com leveza, algum humor e apostando nos estereótipos dos matutos mineiros, Rios aproxima Meus dois amores de uma das mais populares adaptações cinematográficas recentes, O auto da Compadecida (2000), de Guel Arraes. “A gente é brasileiro, e falar do nosso povo, do interior, é falar da nossa estrutura cultural. Mas, diferentemente do Suassuna, o tom de Guimarães Rosa é fabular, não farsesco. Tanto um autor quanto o outro procuram pelo Brasil profundo. Eu busco reler esse mundo, pois queria contar uma história do Brasil e para os brasileiros.”
Para o diretor, um aspecto complexo da adaptação foi levar a prosódia de Guimarães Rosa para o cinema mas de forma inteligível. Na medida do possível, procurou manter alguns ditados roseanos, como “galinha pode ser de qualquer cor que no final o ovo é branco”.
Com o matador Targino, Alexandre Borges fez seu primeiro personagem rural no cinema. “Como o elenco tem um lado mais urbano, impregnado de modernidade, procuramos trabalhar a parte física por meio das máscaras do teatro de Bali. Durante três semanas, com as máscaras trabalhamos nos arquétipos do mocinho, da mocinha e do vilão. É uma fala universal, que acaba entrando no universo de Guimarães Rosa”, afirma o ator. Antes do filme, Borges só havia encenado Rosa no teatro com Corpo de baile, no final dos anos 1980.