Gramado – “Tenho vários Kikitos espalhados por aí”, lembrou o ator e diretor Domingos de Oliveira, ao subir ao palco para apresentar seu novo filme, Primeiro dia de um ano qualquer, no Festival de Gramado, na noite de quinta-feira. “Um dos prêmios está na cômoda do meu irmão, que não se desfaz dele de jeito nenhum. Tem uma porção por aí”, continua, em tom de deboche.
Na intimidade
Primeiro dia de um ano qualquer tem Maitê Proença como a protagonista Consuelo, mulher de muitos amigos, que os reúne para passar o primeiro dia do ano juntos. O longa, inclusive, foi rodado na casa da atriz, na região serrana do Rio de Janeiro. A partir dessa festa, surgem pequenos núcleos e tramas paralelas. Também participam Priscilla Rozenbaum, Alexandre Nero, Sara Antunes, Clarice Falcão, Orã Figueiredo e Guilherme Fiúza, entre outros.
“Nomeados são aproximadamente 20 personagens”, numera Domingos. Trabalhando como ator, Ney Matogrosso protagoniza uma das melhores sequências. Ele faz um músico em crise e que em determinado momento é convidado pelos amigos a cantar Tanto amar, de Chico Buarque, no videokquê da casa. “A tônica era a diversão. Tem que ser bom, e assim, toda a solenidade e a pompa com que se trata o ofício foram embora”, conta Maitê Proença sobre a intimidade demonstrada pelo grupo em cena.
Aos 76 anos e nítidos sinais da idade na fala e na locomoção, Domingos de Oliveira segue sendo um cérebro inquieto. Para ele, a arte tem um valor social que muitas vezes passa despercebido pelos representantes dos governos. “Um bom filme é aquele que ensina a viver. Isso tem uma importância social enorme”, defende.
Com outro trabalho pronto para ser lançado e novo roteiro no prelo para rodar em outubro – esse com Fernanda Montenegro como protagonista –, o diretor e ator segue apostando na sua visão de mundo para contaminar os outros. Domingos de Oliveira vê no cinema a possibilidade de explicar um pouco a vida. No entanto, na opinião dele, a atual produção brasileira passa longe disso.
“Os filmes que fazem sucesso são chatíssimos. Não consigo vê-los até o fim”, reclama. Sempre com bom humor, o diretor lembra o quanto o mundo está necessitado de explicações, já que “ninguém está entendendo mais nada”. Domingos lembra do Cinema Novo, quando foi tachado de alienado. Hoje, o retorno que tem tido dos distribuidores é outro. “A situação piorou tanto que o cinema alienado virou cabeça”, conclui.
Parceria
A coprodução Brasil-Argentina A oeste do fim do mundo despontou como um dos favoritos na disputa do prêmio internacional. O longa dirigido por Paulo Sacramento é uma história sobre dois perdedores, um homem (Cesar Troncoso) e uma mulher (Fernanda Moro), que em determinada circunstância são obrigados a passar alguns dias juntos. Naquele período, se afetam mutuamente.
Rodado no interior da Argentina, o filme tem inicialmente o aspecto inóspito do deserto. À medida que os personagens vão se transformando, os planos e a fotografia também ganham novos matizes. A oeste do fim do mundo foi bastante aplaudido depois da sessão e dificilmente sairá de Gramado sem prêmios. A atuação do uruguaio Cesar Troncoso é digna de um deles.
CURTAS
Apesar de serem competições diferentes, os curtas e os longas são exibidos conjuntamente no Festival de Gramado. Em cada uma das sessões, o curta precede o longa da noite, o que mantém uma dinâmica equilibrada entre os formatos. Na noite de quinta-feira, o ator mineiro Rômulo Braga esteve na tela de Gramado. Ele é o protagonista de Colostro, curta de Caianan Baladez e Fernanda Chicolet.
* A repórter viaja a convite do festival.