Tropicália agradou a integrantes de vários grupos que vêm construindo a nova cena musical de Belo Horizonte. Dirigido por Marcelo Machado, o documentário ajuda a compreender o contexto em que os jovens artistas contemporâneos atuam. Se ganhou aplausos, o filme também gerou reflexão: elogios pelo fato de os tropicalistas terem criado rock forte, com identidade brasileira, e críticas por se concentrar excessivamente em Caetano Veloso e Gilberto Gil. A moçada lembra que a eternidade da poética tropicalista se deve também a Tom Zé, Arnaldo Baptista e Jorge Mautner, por exemplo.
Leonardo Marques, de 33 anos, é cantor, compositor, instrumentista e um dos fundadores da banda Transmissor, grupo importante da cena da capital. Ele lançou o disco Dia e noite no mesmo céu. Para Leonardo, um dos méritos de Tropicália está em contextualizar o movimento. “Naquele período, o mundo estava mudando e muita coisa aconteceu, não só no Brasil.” Outro ponto positivo: a proposta “bem artística”, que traduz de modo correto as ideias que deflagraram o Tropicalismo.
“Mais interessante que a mescla de estéticas – algo natural no Brasil desde a Semana de Arte Moderna – é observar artistas talentosos e já importantes iniciarem o Tropicalismo se reinventando, de modo feliz, como um grupo que reúne várias expressões artísticas. O filme é inspirador, reforça o desejo de fazer coisas relevantes”, observa Marques.
“Gostei do filme, mas ele ficou demais em torno de Caetano Veloso. Vale a pena ver, mas não sei se dá conta do Tropicalismo”, observa Vinikov, baixista e pianista da banda Dead Lovers Twisted Heart, que lançou o disco Lóvi. Ele aponta um problema: “passar rapidamente” por nomes importantes como Jorge Mautner e Jorge Benjor. Vinikov lembra a contribuição de Arnaldo Baptista. Também chama a atenção para Tom Zé, “que fez música forte, enveredou pelo experimental e, por isso, permaneceu por muito tempo na geladeira, incompreendido, até ser redescoberto por David Byrne”.
Victor Silva, de 23, trompetista do grupo instrumental Iconili, afirma que o cineasta Marcelo Machado trouxe poucas novidades. “Vivenciar o Tropicalismo, mesmo que só na tela do cinema, foi um deleite. O modo como eles absorveram o folclore e o misturaram com o rock é maravilhoso”, afirma. A busca de inovação em contexto parecido com o atual, de muita informação e falta de identidade, aliada ao forte resgate da origem brasileira, é um dos aspectos que o fazem admirar o artista plástico Hélio Oiticica, o cineasta Glauber Rocha e o diretor de teatro José Celso Martinez.
O grupo Todos os Caetanos do Mundo, projeto da atriz e cantora Júlia Branco, de 26 anos, e do músico Luiz Rocha, toma as criações do baiano “como norte”, mas não se limita à obra dele. “Escuto Caetano desde criança. Ver o filme foi como rever minhas memórias. É um artista especial, ainda que arrogante, às vezes”, observa Júlia. “Seguro de cada passo que dá, está atento ao momento e é questionador, como se fosse sempre jovem”, elogia. Maria Bethânia e Nara Leão seduziram a mineira pela atitude de contribuir para o movimento, mas sem entrar de cabeça no movimento.
O cantor, compositor e instrumentista Ivan Mortimer, de 32 anos, integra o coletivo Alcova Libertina, formado por criadores com atuação em diversas áreas. O Tropicalismo os inspirou a fazer arte alegre, festiva, multimídia e próxima do cotidiano. Ivan gostou do filme, mas achou o final “um pouco chocho”. Motivo: “Faz o Tropicalismo parecer passageiro, sem repercussão, localizado no tempo e no espaço. Talvez seja mesmo”, observa, suspeitando que seu incômodo se deva à expectativa criada em relação ao documentário. Ele se impressionou ao ver gente que queria mudar a arte bater de frente com a realidade, ser presa e obrigada a se exilar. “É um pouco do que todo artista experimenta: ter a ambição de mudar o mundo e ficar limitado pela necessidade de sobrevivência”, conclui.