Bloco do eu sozinho: falta de educação reinou no carnaval de BH

"Nos blocos de ontem, vi gente fazendo xixi numa árvore na Rua Paraíba, na região da Savassi; sentado no meio-fio deixando rolar; atrás de banca de revista, com sol quente; e a poucos metros dos banheiros químicos"

por Gustavo Werneck 06/03/2019 06:00

Leandro Couri/EM/D.A Press - 02/03/2019
Homens flagrados urinando ao lado de banheiros químicos no desfile do Então, Brilha!, no sábado (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 02/03/2019)

 

Tomara que chova, três dias sem parar...O verso da marchinha eternizada por Emilinha Borba – para quem está chegando agora ao Planeta Carnaval, uma das grandes cantoras brasileiras – deveria ser entoado em coro no fim do reinado de Momo. Talvez nem precisasse de três, mas um bom banho vindo do céu já espantaria bastante o bodum que exala em todas as esquinas de Belo Horizonte na terça-feira gorda. Nos blocos de ontem, vi gente fazendo xixi numa árvore na Rua Paraíba, na região da Savassi; sentado no meio-fio deixando rolar; atrás de banca de revista, com sol quente; e a poucos metros dos banheiros químicos.

Sobre os banheiros, vale abrir um parêntese. Seguindo o animado Bloco Baianeiros, vi os dois lados da moeda ou da tampa, sei lá: alguns impecavelmente limpos, com cheiro de detergente e até um rolo de papel higiênico novinho. E outros, na Avenida Getúlio Vargas, o oposto: fedorentos e sujos. “O pior é o cheiro”, disse um estrangeiro num português meio vacilante. A mulher que o esperava acrescentou: “Entrei e suei lá dentro. Um calor danado, não tem ventilação.” Paciência... melhor do que se aliviar na rua, né não?

Mas se o carnaval tem “n” problemas, o jeito é ir se adequando ao longo dos tempos, ainda mais para quem, com BH, ressuscitou a folia há 10 anos. Mais vale relaxar e acompanhar os blocos num clima de “amanhã ninguém sabe”. Porque, para resolver as pendências, alguém tem que saber.

E se é para relaxar, ontem voltei aos meus tempos de folião em Salvador, onde a Praça Castro Alves fervia e eu impressionado como cabia tanta gente naquele espaço diante do mar da Bahia. Era passar na quarta-feira de cinzas para ver e não crer. Para conversar com os cantores do Baianeiros, entrei no “coração” do trio, uma experiência que tive na década de 1990 e nunca esqueci. Eram outros tempos e ficou a memória povoada de sons, imagens e muvuca, claro.

Marcos Vieira/EM/DA Press
Gustavo Godinho fantasiado de Elvis Presley (foto: Marcos Vieira/EM/DA Press)
Pela escada estreita, onde dois se esbarram, fui chegando ao “palco” e voltando nas décadas. Nos poucos segundos da rua até o topo da alegria, veio uma estranha sensação de luz e sombras, breu e claridade, silêncio e som. Lá do alto do trio, vi a multidão ávida pelo momento de os músicos colocarem o axé para tocar e contagiar o último dia de folia. As pessoas olhavam para a plataforma e gostei de contemplá-las com suas fantasias, desejos, loucuras, anseios e, principalmente, vontade de cair na gandaia até o dia (de hoje) amanhecer.

Foram uns 10 minutos e já voltei para a rua com o carro em movimento muito lento. Lentíssimo, como deveria ser. Pisei o asfalto e voltei a fazer parte da multidão. Foi legal, pois cheguei no momento em que um casal se declarava e o noivo assumia o compromisso de dizer “sim” em novembro. Pela disposição, parece que o casório, depois de seis anos e meio, sai mesmo.

Antes da cena, uma hilária, típica de carnaval. O homem com o quepe de policial estava simplesmente algemado à mulher, fantasiada de anjo negro. Não seria cisne? Não, é anjo, ela me disse sorridente. E ainda encontrei com a reencarnação de Elvis Presley e milhares de casais que se abraçavam, se beijavam e declaravam juras eternas. Amor de carnaval desaparece na fumaça... lembrei de outro verso tão típico de fim de festa. Amanhã, ninguém sabe.

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