Escolas de samba saúdam blocos de rua, mas defendem seu espaço no carnaval de BH

Agremiações desfilam nesta terça (13-02), na avenida Afonso Pena, depois da passagem de centenas de blocos pelas ruas da capital

Gladyston Rodrigues/EM/D.A.Press
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A.Press)

Às 19h de amanhã, terça-feira gorda, cerca de 500 blocos já terão desfilado pelas ruas de Belo Horizonte, na maior edição do carnaval da cidade.

Só então será a vez de as escolas de samba entrarem na Avenida Afonso Pena com seus enredos, alegorias e a história de resistência e devoção ao samba iniciada antes da retomada da folia de rua na capital. Serão seis agremiações, duas a mais que em 2017. Este ano, elas contarão com apoio financeiro recorde por parte do poder público. No entanto, apesar de reforçar a harmonia e a evolução, a verba é insuficiente para a nota 10 absoluta.

“Sou Pampulha, sou carnaval, sou patrimônio da cultura mundial.” Atual campeã, a Acadêmicos de Venda Nova vai homenagear o cartão-postal de BH. A escola vem com 16 alas, quatro carros alegóricos e 600 integrantes. “Mostraremos a Pampulha como o mar de BH. Teremos fantasias que remetem às obras arquitetônicas de Niemeyer, mostraremos o Parque Ecológico, o zoológico, a Volta Internacional, o réveillon e a festa das torcidas no Mineirão”, adianta o carnavalesco Marco Aurélio Gonçalves, fundador da escola.

 

Criada em 2004, a agremiação sediada no Bairro São João Batista foi campeã cinco vezes – em 2008, 2009, 2014, 2015 e 2017. Quando saiu pela primeira vez, há 13 anos, as ruas da capital ficavam praticamente desertas durante o feriado. Nem a Afonso Pena escapava do marasmo. Naquela época, os desfiles das escolas foram transferidos para a Via 240, no Bairro Aarão Reis, e depois para a Estação do Samba, armada na Avenida dos Andradas, no Centro. Em 2014, voltaram para a principal avenida da capital.

Este ano, a Belotur promete estrutura melhor para o desfile das escolas, com o pavimento pintado de branco para realçar as alegorias e iluminação reforçada. A passarela ficará perto do Parque Municipal.

TEMPO

Gonçalves aprova o esforço do poder público, mas alerta: ainda falta muito para chegar ao cenário desejado pelas escolas. “Pintar de branco e iluminar mais não resolve o problema maior, que é o pouco tempo para a montagem da estrutura, 24 horas depois da feira de artesanato, realizada no domingo. É muito difícil montar isso. O público tem que chegar muito cedo, poderiam puxar um quarteirão para a frente, pois aí não haveria o problema com a feira. Com mais tempo, daria para instalar mais camarotes e arquibancadas mais espaçosas”, argumenta.

Outra melhoria oferecida às escolas é o aporte financeiro. Neste ano, cada uma delas recebeu R$ 75 mil da prefeitura, 50% a mais que em 2017. Porém, o valor está aquém do esperado. “Carnaval, mesmo com a quantidade mínima de pessoas de que precisamos, não se faz com esse valor. Temos o aluguel de R$ 30 mil por ano do nosso barracão-ateliê, além de custos de preparação. Houve o aumento de 50%, mas esse valor não cobre um carnaval. Desfile de escola é semelhante a uma ópera, com figurino, cenário... O custo dessa obra supera o que o poder público oferece”, argumenta Gonçalves.

Fundada em 1961, a Escola de Samba Cidade Jardim se prepara para mais um desfile na Afonso Pena. De acordo com a diretoria da agremiação, o aumento da verba ajuda, mas não é o ideal. “Pra você ter uma ideia, o dinheiro saiu na semana passada, faltando 10 dias para o desfile. Aí pode cair até R$ 1 milhão que fica difícil do mesmo jeito”, afirma Alexandre Brandão, o Xandão, diretor da escola.

“Nossa ideia é fazer cultura popular. Os blocos de rua vão trazer turistas, mas nós temos a diversidade cultural das periferias e das favelas, o que nunca deixou de haver. Muita gente diz que o carnaval tá aí agora, mas nós somos de 1961 e nunca deixamos de desfilar. Somos verdadeiros guerreiros que lutam pela cultura popular. Nós não vivemos de carnaval. Pelo contrário: ele vai ser pago em outubro, mas a felicidade de levar a comunidade para a avenida não tem preço”, diz Xandão.

Orgulhosa da resistência e de seu pioneirismo na folia de BH, a escola não deixa de enaltecer o movimento criado pelos blocos de rua. “A Cidade Jardim é alimentada por esses blocos também. É uma troca, vários deles já saíram com a gente, o Baianas Ozadas, o Quando Come Se Lambuza. Parte da bateria deles tá com a gente. Os blocos são uma bênção, mas é preciso cuidado maior com o carnaval de passarela. É carnaval, tem espaço para todo mundo”, opina Xandão

O carnavalesco da Acadêmicos de Venda Nova endossa: “Que venham blocos de rua, blocos caricatos, afoxés e escolas. Qualquer manifestação de alegria e de cultura é bem-vinda. A festa não é só das escolas nem dos blocos, mas do povo brasileiro, da nossa cidade. Tem que ter pluralidade. O pessoal de blocos famosos participa conosco nas alas, na bateria. Todos se fortalecem.”

QUADRA

A Cidade Jardim conta com um diferencial em relação às concorrentes. É a única escola que tem uma quadra, muito usada por produtores culturais para promover eventos durante o ano, frequentados por jovens da classe média. “Funcionamos de fevereiro a fevereiro, não só com eventos. Mantemos oficinas para quase 300 crianças do Conjunto Santa Maria e do Morro das Pedras, ensinando balé e música. É um espaço muito importante para BH, cujo potencial ainda não foi explorado ao máximo. Temos duas preocupações: o desfile, patrimônio de BH, e esse espaço de cultura e educação. Não adianta colocar polícia, prender. A gente sabe que a cultura e a educação são o caminho”, argumenta Xandão. A agremiação do Conjunto Santa Maria vem com o enredo “Cidade Jardim canta as flores”, 11 alas e cerca de 800 integrantes.

No Grupo Especial, outras duas escolas dividem a vanguarda com a Cidade Jardim: a Canto da Alvorada, fundada em 1979, que volta a desfilar este ano com enredo sobre o Grupo Aruanda, e a Mocidade Independente Bem-Te-Vi, do Bairro Carlos Prates, criada no mesmo ano.

CAÇULA

Além da campeã Acadêmicos de Venda Nova, a nova geração conta com a caçula Imperavi de Ouros, formada em 2013, no Bairro Anchieta. O desfile deste ano defenderá a preservação da cultura indígena e da Amazônia. Já a Estrela do Vale, sediada no Barreiro desde 2009, inspirou-se nos grandes musicais do Brasil.

“Vamos transformar os musicais em carnaval – das danças típicas do descobrimento aos dias de hoje. É engraçado: o povo brasileiro ‘dança’ com seus governantes, no sentido negativo, mas, mesmo dançando com a política, não perde a alegria de viver”, afirma Felipe Marinho, diretor de harmonia da Imperavi.

NA AVENIDA

Confira a ordem dos desfiles de amanhã na Afonso Pena

19h – Afoxé Bandarerê

20h – Grêmio Recreativo Escola de Samba Bem-Te-Vi
>> Enredo: Parabéns Sete Lagoas, são 150 anos. Cidade dos sete lagos encantados, cidade nascida no alto

21h – Grêmio Recreativo Escola de Samba Estrela do Vale
>> Enredo: Um musical chamado Brasil

22h – Grêmio Recreativo Escola de Samba Cidade Jardim
>> Enredo: Cidade Jardim canta as flores

23h – Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos de Venda Nova
>> Enredo: Sou Pampulha, sou carnaval, sou patrimônio da cultura mundial

Meia-noite – Grêmio Recreativo Escola de Samba Imperavi de Ouros
>> Enredo: A tribo Imperavi canta os encantos dos mistérios da Amazônia

1h – Grêmio Recreativo Escola de Samba Canto da Alvorada
>>  Grupo Aruanda, embaixador da cultura brasileira

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