Guardanapos de papel são injustiçados. Sem o requinte daqueles de pano usados à mesa, foram parar nos bares e lá ficaram sem qualquer glamour. No entanto, quantos relacionamentos não começaram depois de a mensagem escrita num deles ser entregue pelo garçom? Além disso, serviram à memória de poetas que puseram ali versos repentinos, foram companheiros das confissões de compositores que encontraram inspiração na boemia.
Tocado por todas essas “missões” do guardanapo de papel, o escritor e jornalista Fabrício Carpinejar fez dele suporte para seus versos. Em quase uma década, o gaúcho colecionou 600, com escritos diversos. Oitenta foram escolhidos para o livro Liberdade na vida é ter um amor para se prender (Editora Belas Letras), que será lançado nesta terça-feira, 07, em BH.
“Guardanapo é o sudário dos boêmios. É o pombo-correio da cantada, a pré-história do WhatsApp”, brinca Carpinejar. Neles, o gaúcho escreveu sobre lealdade, confiança, esperança e amizade. “Escrevo também sobre paixão e amor”, diz.
Primeiro, ele fotografa os versos escritos nos guardanapos. Depois, compartilha os poemas em seus perfis nas redes sociais. Apenas no Facebook, Carpinejar tem mais de meio milhão de seguidores e aquelas palavras alcançam milhares de visualizações. “Guardanapo é símbolo do efêmero, do provisório. É função da poesia colocar aforismos neles”, afirma.
Todas as páginas da publicação que será lançada hoje podem ser destacadas. “É um livro para ser repartido. Acredito que ele converge com o espírito do Facebook”, compara o autor, lembrando que as imagens de seus guardanapos viralizaram nas redes sociais.
MÍDIA Ao resgatar o guardanapo como mídia, Carpinejar chama a atenção para a importância dele na literatura. Afinal, jamais foi considerado nobre como as cartas, por exemplo. Aquela tessitura o encanta. “Sou homem de textura. Antes de comer, gosto de alisar a toalha da mesa.
Carpinejar faz da caligrafia um elemento a mais de sua escrita. Em tom de brincadeira, garante: a letra não é das melhores, mas faz sucesso. “Isso foi uma surpresa pra mim. Sempre fui xingado pela minha letra feia.” Atualmente, ela virou marca. Para quem é fã do escritor, não é preciso nem a assinatura dele para que um verso seja reconhecido.
Casado há dois anos no civil e há um no religioso, Fabrício entregou muitos guardanapos à mulher, Beatriz. “Ela tem um monte na gaveta.
Com 41 livros lançados, o gaúcho acredita que consegue se conectar com alma feminina. Conexão, talvez, garantida pelo fato de desconstruir estereótipos ligados à masculinidade. “Não tenho vergonha das minhas dúvidas. Exponho e compartilho confidências”, afirma.
Cronista dos relacionamentos contemporâneos, Carpinejar extrai poesia de momentos do cotidiano. Muito disso está expresso nos guardanapos. Ele gosta de discutir a relação – a famosa DR –, mas reconhece: “Tenho defeitos masculinos. Tomo banho para me lavar. A mulher toma banho para pensar, ela chega a muitas decisões sobre o relacionamento e sai com aquele turbante na cabeça.”
O poeta garante ser bom nas tarefas domésticas. “Adoro ficar em casa, fazer faxina. Fico feliz passando roupa. Pode perguntar pra minha mulher”. Beatriz deu-lhe de presente uma cafeteira, um filtro d’água e um steamer, aquela passadeira de roupa a vapor. “A pessoa pode até dizer que não escrevo bem, mas dizer que passo roupa mal, aí não. Gosto do capricho”, avisa.
PRESENTES Aliás, o poeta divide os presentes em duas categorias: os simbólicos e os sentimentais. Os simbólicos são aqueles que a pessoa precisa gastar tempo para encontrá-los. Já os sentimentais são escolhidos a partir da observação da pessoa a ser presenteada em momentos fortuitos.
Atualmente, ele procura um mimo sentimental para a companheira. “Beatriz me deu um presente emocional: uma máquina verde portátil Olivetti Lettera 82”, revela. “O bom presente é aquele que a pessoa escuta o outro falar e não se esquece. É a prova de que a pessoa ouviu, embora o outro pense que ela não havia prestado atenção.” E garante: o presente emocional é uma forma de compartilhar o passado da pessoa amada. “Com a máquina, Beatriz me devolveu a adolescência. Aos poucos, a pessoa amada vai se adicionando nas fotografias. Além de cuidar do que você é e do que será, ela cuida do que fui”, conclui.
LIBERDADE NA VIDA É TER UM AMOR PARA SE PRENDER
. De Fabrício Carpinejar
. Editora Belas Letras
. 80 páginas
. R$ 28
. Lançamento terça-feira (7), às 19h, na Livraria Saraiva do Diamond Mall. Avenida Olegário Maciel, 1.600, lojas 16/21, Bairro de Lourdes.