Naquele inverno de 1570, as toras foram meticulosamente escolhidas pelos melhores carpinteiros. Com diâmetros de 71 centímetros, arrancadas das florestas de Uglich – localidade em que o Anel de Ouro se fecha sobre Moscou –, foram esculpidas a machadadas. Numeradas, empilhadas, acomodadas nas embarcações, já na primavera seguinte iniciaram, pelas curvas do Rio Volga, a jornada de cerca de 1 mil quilômetros até o estuário do Rio Sviyaga. A preciosa carga era nada mais, nada menos do que a base militar que seria montada ao alto da colina Kruglaya, na Ilha de Sviyazhsk, que, em posição estratégica, secretamente observava o Canato da poderosa Khazan, a 30 quilômetros dali.
A Ilha de Sviyazhsk é a primeira vila medieval ortodoxa nos confins do Volga. De seu forte militar partiram, descansados, os 150 mil homens do Exército de Ivan – para alguns, o Terrível –, que surpreenderiam, em 1552, o adversário. Khazan, a capital tártara, foi cercada em agosto e, dois meses depois, com o emprego de aríetes, torres, minas e canhões, ruíram as muralhas da até então inexpugnável fortaleza, nas margens em que o Volga se encontra com o Rio Kazanka. Foi o fim de uma era. Os estados sucessores das Hordas de Ouro, descendentes do Império Mongol fundado por Gengis Khan (1206-1227), não mais ameaçariam o território russo.
A vitória russa de Ivan foi celebrada com a edificação de igrejas país afora. A mais emblemática delas, a Catedral de São Basílio, na Praça Vermelha, paira como miragem colorida da arquitetura ortodoxa oriental sobre a Praça Vermelha, em Moscou. Em seus geniais delírios, foi erigida pelo arquiteto predileto de Ivan, Postnik Yakovlev, responsável por muitas das edificações e traçado original da Ilha de Sviyazhsk.
Circundada pelo doce mar que nasce da confluência dos rios Volga, Sviyaga e Schuka, fincada na interseção das rotas da Seda e do Volga, e cercada por brancas muralhas, os domos da Ilha de Sviyazhsk se anunciam ao longe, marcando os históricos conjuntos arquitetônicos religiosos, entre eles a Catedral da Assunção – que integra o Monastério da Assunção –, listada patrimônio da humanidade pela Unesco. Exibe afrescos que constituem raro exemplo da pintura mural da Igreja Ortodoxa Oriental, ao mesmo tempo em que ilustra a fusão entre religião e ação militar encarnada pela igreja como base para a fundação do Estado russo e poder do czar. Arte e fantasia se mesclam nessa emblemática ilha na atual República do Tartaristão, na Rússia, onde também o celebrado poeta Alexandre Pushkin (1799 – 1837), o maior entre os russos da era romântica, sonhou com a terra mágica de Buyan, do príncipe Gvidon e o seu cisne encantado.
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