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A alma dos vinhedos na Serra Gaúcha

Quase uma centena de vinícolas se intercalam na região pelas cidades de Bento Gonçalves, Garibaldi e Pinto Bandeira

Bertha Maakaroun - enviada especial
- Foto: Bertha Maakaroun

Os parreirais se esparramam pelas paisagens demarcando terroirs que, entre montanhas, vales, florestas, rios e cachoeiras da Serra Gaúcha, concebem uma variedade de uvas. Merlot, chardonnay e pinot noir, entre outras auxiliares, como cabernet sauvignon, cabernet franc, tannat e riesling itálico, dependuram-se em cachos generosos e colorem as terras de Baco. Do amarelo dourado ao vermelho e verde intensos, as cores trocam a guarda das colinas estações do ano afora. É a natureza que dita o ritmo e dispersa os aromas da uva, que anunciam a safra da primeira região do país a obter o selo de Indicação de Procedência e, no caso do Vale dos Vinhedos, a Denominação de Origem.

Quase uma centena de vinícolas se intercalam na região pelas cidades de Bento Gonçalves, Garibaldi e Pinto Bandeira e estão organizadas para receber visitantes. Vinhos e espumantes, novo prazer nacional que brota de uma região única no mundo, não apenas jorram das garrafas. A alma dos vinhedos arrasta consigo um mundo de  sensações – que se iniciam em degustações gastronômicas harmonizadas. A visão, o paladar e o olfato se aguçam, detonando a explosão dos sentidos às mesas de cantinas, restaurantes e em piqueniques organizados à sombra dos vinhedos. O espírito da alegria, das histórias e das memórias é compartilhado em momentos que se encerram invariavelmente ao milésimo tilintar das taças.

O cultivo da uva nessas paisagens serranas, que hoje convidam o turista à imersão nos sentidos, conta a saga da imigração italiana ao final do século 19 – principalmente a partir de 1875, extertores do Império – e ao longo das primeiras décadas da fundação da República.
As famílias pioneiras, que chegaram a pé e a cavalo, escalando montanhas e desbravando florestas das maravilhosas terras – enfrentaram um inferno de adversidades para carregar na bagagem as preciosas cepas, arrastadas por meses em porões de navios.
Grande curinga para a harmonização de pratos, o espumante brasileiro ganha o gosto do consumidor. Na Serra Gaúcha, o líquido jorra nos próprios terroirs, para a alegria dos visitantes - Foto: Bertha Maakaroun
Os primeiros ensaios vinícolas de trentinos, tiroleses, trevisianos, milaneses e vênetos, que chegavam à colônia Dona Isabel (hoje Bento Gonçalves), não vingaram. “Eram feixes de castas nobres das regiões italianas de Trebbiano, Barbera e Vernachio. Mas os imigrantes não dominavam as técnicas para combater as pragas enfrentadas na nova terra”, explica Moysés Luiz Michelon, proprietário do Hotel Villa Michelon. Além da reserva de proteção ambiental, as amplas e modernas instalações do empreendimento guardam elementos arquitetônicos das antigas casas de colonos e oferecem aos hóspedes parreirais- modelo de diversas cepas, em cultivos que variam desde o método da latada empregado pelos colonos até o plantio com o sistema da lira e da espaldeira, atualmente usados nas vinícolas que buscam menor volume e maior qualidade na produção. Parque infantil temático, lago para a pescaria, pomares, além de acesso à história e à cultura do vinho na região expostas no Memorial do Vinho e na Casa do Filó, são algumas das atrações da vila.

“O encontro do colono italiano com a uva isabel representou o início da cultura vinícola no Rio Grande do Sul”, afirma Michelon. “Quando subiam e desciam as montanhas para vender os seus produtos no Vale do Rio Caí, os colonos descobriram as pérgolas dessa videira, que era cultivada pelos imigrantes alemães. Iniciou-se, assim, a produção caseira do vinho rústico de mesa, que embalou, por décadas, em noites frias, as rodadas italianas do filó.”

Miolo, Salton, Dal Pizzol, Don Giovanni, Peterlongo, Valduga são rótulos de vinhos e espumantes, certo? Sem dúvida. Mas, antes de se transformarem na bebida que eleva a alma em busca da verdade – “in vino veritas” –, essas e outras marcas da Serra Gaúcha, como a Vinícola Aurora – que, aos 85 anos, é uma das mais bem-sucedidas experiências de cooperativismo no país –, carregam a história da imigração italiana no Rio Grande do Sul. Uma história de sangue, suor, paixões, risos, lágrimas e muitas uvas. Cultivo que nas últimas décadas atrai outros pioneiros, desta vez do Chile, velhos parceiros de Baco: a família Geisse, excelência na produção de um dos melhores espumantes do mundo pelo método tradicional com as uvas chardonnay e pinot noir. Tim-tim!


Primeira denominação de origem do Brasil

Localizado a 124 quilômetros de Porto Alegre, o Vale dos Vinhedos é o principal destino enoturístico do Brasil. Foi a primeira região do país a obter uma Indicação de Procedência e também a primeira a obter a Denominação de Origem para seus vinhos e espumantes: a Denominação de Origem Vale dos Vinhedos, certificado que qualifica a origem do produto em nível mundial. A maior parte do Vale dos Vinhedos está na cidade de Bento Gonçalves, que oferece ao turista cinco rotas que exploram a enogastronomia: Vinhos da Montanha, Cantinas Históricas, Vale do Rio das Antas, Rota dos Espumantes e Caminhos de Pedra..