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Estado de Minas

Preconceito em cena: peças do Festival Internacional de Teatro discutem gênero, identidade e racismo

Na programação, espetáculos como 'A invenção do Nordeste', do grupo potiguar Carmin, que explora a complexidade do nordestino e Simón el topo, da trupe peruana Teatro La Plaza, que aborda a diversidade sexual.


16/09/2018 22:03 - atualizado 17/09/2018 09:13

Robson Medeiros, Henrique Fontes e Mateus Cardoso apresentam 'A invenção do Nordeste'(foto: MARCOS VIEIRA/EM/D.A PRESS)
Robson Medeiros, Henrique Fontes e Mateus Cardoso apresentam 'A invenção do Nordeste' (foto: MARCOS VIEIRA/EM/D.A PRESS)
Gênero, identidade e racismo, discussões caras à edição 2018 do Festival Internacional de Teatro Palco e Rua (FIT), vêm à tona em dois espetáculos que estreiam nesta segunda-feira (17). A invenção do Nordeste, do grupo potiguar Carmin, explora a complexidade do que é ser nordestino por meio da disputa de dois atores por um papel. Terá duas apresentações no Francisco Nunes. No Marília, os peruanos do Teatro La Plaza falam sobre diversidade sexual na montagem Simón el topo, o primeiro (e até agora, único) espetáculo infantil do Peru a tratar desse tema.


O ‘lugar’ do nordestino

Ator “parido e criado” em Natal, Rio Grande do Norte, Mateus Cardoso já passou por muitos testes de elenco. Mas o não recebido no ano passado para uma ação publicitária o marcou por causa da justificativa. “O diretor achava que eu era muito branco, ele queria uma cara mais popular. Perdi o emprego porque não era muito nordestino”, afirma.

A invenção do Nordeste, quarto espetáculo da companhia potiguar Carmin, tenta responder (ou pelo menos levantar questões) para a pergunta: “O que é ser nordestino?”. Dirigida por Quitéria Kelly, a montagem nasceu a partir do livro A invenção do Nordeste e outras artes, resultado da tese de doutorado do historiador Durval Muniz de Albuquerque Júnior.

“Descobrimos o livro em 2014, quando houve um movimento grande de xenofobia contra o Nordeste. Como se resume a complexidade do ser humano em uma imagem que é um estereótipo? A partir de onde se é nordestino, a partir de onde se é brasileiro? O Maranhão é diferente da Bahia, que é diferente de Pernambuco”, afirma a paraibana Quitéria, que fundou o Carmin há 11 anos, em Natal.

três personagens, todos com nomes de seus intérpretes. A dramaturgia, assinada por Henrique Fontes e Pablo Capistrano, recorreu à autoficção.

Henrique é o preparador de elenco de um projeto audiovisual. Depois do casting que envolveu 250 atores, a produção chega a dois “finalistas”, Mateus Cardoso e Robson Medeiros. Durante as sete semanas de preparação, os dois refletem sobre as próprias vivências para se tornarem o “melhor nordestino” e ganhar o papel. Nesse momento, a peça é dividida em sete momentos – cada semana de ensaios é dedicada a uma questão, como o estudo do corpo e as obras de arte que definem o nordestino.

“Quando qualquer um de nós vai fazer teste para filme, série ou novela, enfrenta sempre o lugar do nordestino. Não temos o perfil que idealizam, do sertanejo euclidiano, magro, feio. A partir daí, e tendo em vista que foram as artes que reforçaram essa falsa identidade, misturamos as nossas vivências com a trajetória histórica”, comenta o amazonense Henrique, radicado em Natal desde a infância.

“A partir de um momento, os personagens entram no patético e no ridículo para tentar provar que são melhores do que o outro. O personagem do Robson, por exemplo, chega a dizer para o meu que sou um paulista azedo que apenas nasceu no Nordeste”, continua Mateus, cujos pais nasceram em Campinas. “Sou do sertão do Rio Grande do Norte; o Mateus é do litoral. Mesmo sendo de um estado que não é tão grande, temos vivências muito diferentes”, acrescenta Robson.

A INVENÇÃO DO NORDESTE
Com o Grupo Carmin (RN). Segunda (17) e terça-feira (18), às 20h. Teatro Francisco Nunes. Parque Municipal, Avenida Afonso Pena, 1.377, Centro. R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada).

O tabu da diversidade sexual

Em 2017, a comunidade LGBT do Peru sofreu um forte revés. Em votação majoritária no Congresso, foram eliminadas a identidade de gênero e a orientação sexual do Decreto Legislativo 1.323, que considerava crime qualquer ato homofóbico naquele país.

“A América Latina está em um processo de saída do armário. Porém, o Peru é um país absolutamente homofóbico e transfóbico”, afirma o ator e manipulador Dusan Fung.

Simón el topo estreou em Lima, em fevereiro de 2016. Muito antes da primeira sessão, os integrantes do Teatro La Plaza sofreram, via redes sociais, uma série de acusações. Diziam que o espetáculo, ainda inédito, incitava crianças a se tornarem homossexuais.

“Nos perguntam se a história trata de orientação sexual para meninos e meninas. É muito complicado falar sobre isso quando se fala de crianças, que têm um amor mais puro. Falamos de diversidade sexual”, resume Dusan.

Quatro atores estão em cena manipulando oito personagens. Na história, inspirada em um conto da educadora espanhola Carmen De Manuel, Simón é uma toupeira criança. Vive com os pais e a irmã. Para o pai, ele deve ser como um homem, forte, e não brincar com borboletas e outros bichos, como ele gosta. Só que Simon se interessa por um amigo, Raul.

A montagem selecionou atores sem experiência em manipular bonecos. No primeiro momento, o grupo teve de aprender o ofício. A manipulação não é convencional, com atores vestidos de preto e “sumindo” em cena. “Há momentos em que somos como a continuação dos próprios bonecos”, explica Anaí Padilla.

A história é contada em “toponês”, linguagem inventada para o espetáculo. Na abertura, os atores contextualizam a montagem para o público, em português. “É uma peça para toda a família. Em certo momento, nos demos conta de que não há uma idade da plateia. Crianças de 1, 2, 3 anos se apegam aos bonecos e ao lado estético da peça, muito mais do que à história. Conforme ficam mais velhas, elas entendem a narrativa de outra forma. O importante é atingir todo mundo”, diz Anaí.

Ao fim das apresentações, sempre que possível, o elenco conversa com a plateia, “para que pais e mães vejam que têm responsabilidade sobre o que vão dizer aos filhos”, acrescenta Dusan. Simón el topo é mais popular fora do que dentro do Peru – o espetáculo foi encenado em seis países. “Fizemos menos apresentações em Lima do que consideramos necessário”, revela Anaí.

SIMÓN EL TOPO
Com Teatro La Plaza (Peru). Segunda-feira (17), às 14h, e terça-feira (18), às 19h. Teatro Marília. Avenida Alfredo Balena, 586, Santa Efigênia. R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada).



14º FIT
Até domingo (23), com espetáculos gratuitos e pagos. Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia), à venda na internet (vaaoteatromg.com.br e www.fitbh.com.br), Mercado das Flores (Av. Afonso Pena, 1.055, Centro) e Biblioteca Pública Estadual (Praça da Liberdade, 21, Funcionários). Programação completa: www.fitbh.com.br.


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