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Estado de Minas

BH recebe estreia da 'Peça do Casamento' com os atores Eliane Giardini e Antônio Gonzalez

Dirigido por Guilherme Weber, espetáculo encena texto do dramaturgo americano Edward Albee em que o matrimônio é visto com humor peculiar de uma criança homossexual


15/08/2018 09:30 - atualizado 17/08/2018 14:08

Eliane Giardini e Antônio Gonzalez interpretam um casal cheio de dilemas existenciais e à beira do divórcio(foto: Guto Muniz/Divulgação)
Eliane Giardini e Antônio Gonzalez interpretam um casal cheio de dilemas existenciais e à beira do divórcio (foto: Guto Muniz/Divulgação)

O dramaturgo norte-americano Edward Albee (1928-2016) dedicou boa parte de sua carreira a analisar os meandros das relações amorosas, tão complexas e reveladoras sobre a psique humana. O casamento é tema de muitos de seus textos, como o premiado Quem tem medo de Virgínia Woolf?, escrito em 1962.

Mas foi a Peça do casamento – não tão célebre, mas talvez a obra máxima do escritor sobre o assunto – que fascinou o diretor Guilherme Weber, um declarado entusiasta do matrimônio e do legado de Albee. Com os atores Eliane Giardini e Antônio Gonzalez como o casal à beira do divórcio, a adaptação brasileira faz sua estreia nacional nesta quinta-feira (16), em Belo Horizonte.

A montagem nasceu do antigo desejo de Weber de encenar Edward Albee. “Em minha companhia de teatro, nos dedicávamos à pesquisa da dramaturgia anglo-saxã, da qual ele é expoente máximo. Como nunca montamos um texto do Albee, segui com a vontade de investigar os códigos do autor”, diz. Para a ocasião, ele escolheu um texto praticamente inédito no Brasil. Escrita em 1986, a Peça do casamento teve sua primeira montagem por aqui há seis anos, apenas no Rio de Janeiro, com direção de Pedro Brício e elenco formado por Guida Vianna e Dudu Sandroni.

“O casamento é o tema fetiche do autor. A peça aborda de que maneira essa organização contemporânea ocidental, que nos oprime e dita as regras do nosso comportamento, virou uma instituição social, política, econômica, comportamental e erótica; de que maneira o casamento se tornou uma quase alegoria do comportamento coletivo”, conta Weber.

Mais que uma crítica, o espetáculo dedica à instituição matrimonial um olhar irônico e peculiar. “Falamos de um casamento branco e heterossexual dos anos 1980, mas com suas características observadas por um menino gay”, descreve Weber, em referência ao processo de concepção do texto, feito por Albee a partir da observação do relacionamento de seus pais. “Isso faz da peça, automaticamente, um trabalho com filtro; uma paródia, paráfrase e pastiche sobre o tema”, completa.

Segundo o diretor, a metalinguagem é um dos diferenciais de Peça do casamento na obra de Albee. “Ele estabelece uma relação entre o jogo teatral e o casamento. Expõe o casamento como um jogo dramático, cômico e crítico, mas usando as ferramentas do fazer teatral. A tradução do título original, Marriage play, perde muito por isso, porque play pode significar tanto peça quanto jogo.”

ENCONTROS Além de finalmente adaptar um texto de Edward Albee, Weber comemora mais uma parceria com Eliane Giardini. “Mais da metade do meu entusiasmo com esse espetáculo é por reencontrá-la e, também, por promover seu encontro com uma personagem tão forte, erótica, desbocada e neurótica, como são todas as mulheres do Albee”, diz o diretor.

“As personagens femininas dele estão dentro do meu espectro, de mulheres maduras e temperamentais”, avalia Giardini. Ainda que tais características sejam recorrentes em seus papéis, ela afirma que Júlia pouco tem a ver com a preconceituosa Nádia da novela O outro lado do paraíso, seu mais recente trabalho na TV. Apenas um aspecto as aproxima: o humor. “A peça traz uma comédia mais debochada, é engraçada pela inteligência dos diálogos”, aponta a atriz.

Para seu parceiro de cena, Antônio Gonzalez, a Peça do casamento é capaz de gerar identificação mesmo em solteiros inveterados. “João, meu personagem, está casado há 30 anos e já não vê sentido nessa relação, nem na própria vida. Já a Júlia se vê abandonada – e não é preciso ser casado para sentir um abandono. São conflitos compartilhados por qualquer espectador, independentemente das relações maritais”, opina.

O espetáculo tem o poder de dialogar com quem nunca passou por experiência semelhante à dos personagens, segundo Guilherme Weber. “Tenho essa crença sempre que trato de temas arquetípicos”, diz. “Começamos (a peça) tratando do casamento, mas esse casal voa ao longo da noite, falando de amor, liberdade e morte. Esses temas arquetípicos, fundantes do ser humano, são arena para que o espectador projete seus repertórios. O casamento é o ponto de partida, mas transcende para o existencialismo.”

Os artistas avaliam que, mesmo escrito há três décadas, o texto segue com abordagem pertinente sobre o assunto. “As coisas mudam muito, mas o ser humano muda pouco. Estamos sempre no exercício da relação, com dificuldades em aceitar e entender o outro, e imaginando o que ele está querendo ou pensando”, observa Eliane Giardini. “A peça tem nossos próprios olhares. Embora fale de um casamento heterossexual, entre brancos, procuramos universalizar a relação e tirá-la desse nicho”, completa a atriz.

PRECEITOS
Há quem considere o matrimônio tradicional uma instituição falida, já que algumas de suas normas – como a monogamia e a convivência sem tréguas – não correspondem aos anseios e instintos humanos. Casado há 28 anos, Gonzalez refuta a teoria, mas entende que esta não é a única maneira possível de se viver um amor. “É a forma que escolhi para mim, mas existem inúmeras outras. O ser humano é múltiplo; há poligamia, casamentos abertos, gente que simplesmente não se casa... Várias possibilidades que podem dar certo”, acredita.

Giardini, por sua vez, nota constantes alterações na configuração matrimonial, como a aceitação de que é fundamental preservar as individualidades. “O casamento vem sofrendo algumas modificações e melhoras. Hoje, não se procura mais uma pessoa para se complementar, como traz a ideia romântica de casamento. É preciso saber viver sozinho para viver feliz com alguém”, diz a atriz.

Já Weber se diz um entusiasta da união conjugal. “É uma possibilidade de civilização, de se domar uma certa selvageria. Fui casado por muitos anos e acho um barato o desafio da convivência com leveza, erotização e intimidade. Ainda que existam alguns respiros e outras possibilidades, como as novas configurações de família, o poliamor e o casamento gay, essas próprias relações obedecem a um padrão, com as mesmas leis de convivência. Vejo o casamento como uma ponte, uma possibilidade de entender o outro, mas, claro, depende da maneira como você o conduz”, opina.

Peça do casamento é o segundo título de uma trilogia dirigida por Weber dedicada ao tema. Os realistas, de Will Eno, acompanhava dois casais em diferentes fases da relação. Já De verdade, de Tom Stoppard, deve ser a próxima incursão do diretor no assunto, ainda sem previsão de estreia. “Albee olha para o casamento a partir da liberdade e do existencialismo; Eno, a partir da doença; e Stoppard, a partir da traição. Todos usam o teatro como alegoria do casamento e é isso que os une nessa trilogia informal”, afirma.

PEÇA DO CASAMENTO
Direção: Guilherme Weber. Com Eliane Giardini e Antônio Gonzalez. Estreia quinta-feira (16), em cartaz até 3 de setembro. De quinta a segunda-feira, às 20h; sessões extras aos domingos, às 17h. Centro Cultural Banco do Brasil (Praça da Liberdade, 450, Funcionários, (31) 3431-9400). Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia), na bilheteria do teatro ou pelo site www.eventim.com.br.


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