Ao sair de casa, o médico Bernard Rieux se depara com rato morto, pede o porteiro para retirá-lo. No dia seguinte, ele se depara com três roedores mortos. Em grande quantidade, os animais morrem até a extinção. Ninguém se importa. Na sequência, são as pessoas dos subúrbios que começam a morrer. Ninguém se importa. O argumento apresentado pelo escritor francês nascido na Argélia Albert Camus (1913-1960), em 1947, no livro A peste, foi referência para montagem do monólogo de mesmo nome, encenado pelo ator Pedro Osório. Com direção de Vera Holtz e Guilherme Leme Garcia, a peça, depois de temporada elogiada no Rio de Janeiro, estreia no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB BH), nesta sexta (3), e segue em cartaz até 27 de agosto.
Camus propôs a epidemia que tomava conta da cidade Oran como alegoria da ocupação nazista da Europa. “Há três anos, ganhei o livro de presente do Guilherme. Percebi que a narrativa do médico poderia virar uma peça. Ao ler, identifiquei a atualidade desse texto, como dialogava com situações que aconteciam aqui (Rio de Janeiro, Brasil). Camus mostra o flerte com o totalitarismo”, afirma Pedro.
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Texto de Albert Camus. Com Pedro Osório. Direção de Vera Holtz e Guilherme Leme Garcia. De 3 a 27 de agosto (de quinta a segunda). Sessão extra no dia 15. Centro Cultural Banco do Brasil. Praça da Liberdade, 450. Ingresso: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia). Informações: (31) 3431-9400.
três perguntas para...
Vera Holtz
atriz e diretora
Você dirigiu O estrangeiro, outro trabalho baseado na obra de Albert Camus. Como foi essa aproximação com o escritor franco-argelino?
Sou da década de 1950, Camus era escritor para formação filosófica e política. Era uma regra: tinha que ler. Retomei quando Guilherme e eu estávamos na Dinamarca visitando um amigo e ele me presenteou com a adaptação de O estrangeiro. Na época, ele me disse que tinha que dirigir com ele. No entanto, a interpretação de palco era meu suporte de criação mais presente. Não tinha seguido estudos na direção. Guilherme insistiu. Aceitei e ele foi de generosidade absurda.
Quais foram suas escolhas dramatúrgicas?
Optamos pela polifonia cênica. A parte de movimentação do ator inspiramos em O mito do sísifo, outro livro de Camus. Isso possibilita o movimento pendular em cena. Temos ponto de vista do ator sobre a obra. Temos a posição do personagem, o médico. Colocamos diversas vozes. Apresentamos camadas.
No romance, mesmo diante de um mal que acomete todos, as pessoas seguem suas vidas cotidianas sem se envolver. Como é possível romper esse ciclo?
O movimento pendular é um pouco isso, para chegar nesse lugar. É radical o ator que vai e volta. Não sei se rompe. Pensando nos dias de hoje, o Brasil não tem temperamento para rompimento. Apesar de estarmos em época polarizada, sou otimista. Estamos cada vez mais em prontidão em relação à política e à economia. As pessoas estão atentas. Não vejo mudança radical. Estamos em processo de assumir essas coordenadas do nosso Brasil maravilhoso. Temos que ver a nova geopolítica. Estamos vendo queda do império violenta: o Oriente se junta ao Ocidente. A Coreia do Norte está no nosso colo, continua desenvolvendo míssil. Temos outras questões, como as migrações, refugiados. É outro mundo. O Brasil podia ter avançado bem mais.