João das Neves volta aos palcos com a peça 'Lazarillo de tormes'

Montagem marca a volta do dramaturgo depois de duas décadas trabalhando somente como diretor

Walter Sebastião

Espetáculo terá sessão única no Grande Teatro do Sesc Palladium. - Foto: Daniel Britto/Divulgação

 

Em 2000, conta o diretor de teatro João Neves, operários espanhóis, ao fazer uma reforma numa casa antiga, descobriram uma biblioteca com livros que fora escondida havia mais de quatro séculos, devido à censura da Inquisição. Entre os volumes estava o que talvez seja a primeira edição de Lazarillo de Tormes. Um texto de autor anônimo, espanhol, do século 16, considerado um retrato debochado e ácido da sociedade medieval, que conta uma história mirabolante sobre um personagem que apronta todas para sobreviver. O texto abarca desde o seu nascimento até o seu casamento, na idade adulta, passando pela infância miserável.

Fã do texto, João das Neves produziu para um amigo uma versão da história para o teatro, incorporando inclusive a história de como ela foi achada. Como o projeto não foi para a frente, decidiu ele mesmo encenar a obra, assumindo inclusive o papel-título. A volta aos palcos, depois de quase duas décadas trabalhando somente como diretor, deu-se, portanto, por seu encanto com o personagem e o texto. ''E da minha saudade dos tempos que fui ator'', observa. ''Estar no palco é uma experiência fascinante.

Tem a adrenalina dos esportes radicais, como escalar uma montanha, mesmo sabendo do risco de cair'', compara.

 

SESSÃO ÚNICA Lazarillo de Tormes tem apresentação única hoje, às 21h, no Grande Teatro do Sesc Palladium. Segundo João das Neves, mesmo passados quatro séculos, o texto segue muito divertido e atual. ''Lazarillo é o tetravô dos nossos heróis populares'', afirma, comparando o tipo a Macunaíma. A montagem é centrada no ator, com fidelidade rigorosa ao texto do século 16 e, ao mesmo tempo, com momentos abertos ao jogo cênico.

''Puxamos para o lado histriônico, cômico, ao máximo'', conta. Figurinos e cenários de Rodrigo Cohen (que também está no palco) cuidam de evocar a cultura popular rural e urbana, nova e antiga, do cordel ao hip-hop.

''As histórias que o ser humano inventa, as situações sociais que enfrentamos, nossos embates para sobreviver são os mesmos, mesmo quando ambientados em sociedades diferentes'', argumenta Neves, analisando o que faz do texto um clássico da literatura.

A mágica de, passado quase meio milênio, a obra continuar atual, para o diretor, também tem explicação: ''Lazarillo é grande arte. E grande arte não tem tempo, tem força para atravessar os séculos e continuar atual. Lemos hoje Camões com o mesmo prazer que lemos Paulo Leminsky. Quem fica superado com o passar do tempo é a moda''. A trilha sonora, apresentada ao vivo, foi criada pela cantora Titane em parceria com André Siqueira.


Lazarillo de Tormes
Com João das Neves, Glicério Rosário e Rodrigo Cohen. Hoje, às 21h, no Grande Teatro do Sesc Palladium, Rua Rio de Janeiro, 1.046, Centro, (31) 3214-5350. Ingressos: R$ 30 e R$ 15 (meia).

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