Brasil é tema da websérie de ficção científica 'M0therb0x'

Rodado em Belo Horizonte e São Paulo, o projeto independente, com três episódios, fala de luta de classes, contrabandistas de tecnologia e do mundo sem liberdade em 2055

Guilherme Augusto 09/09/2020 04:00
Natalia Pilati/divulgação
Casal de contrabandistas de tecnologia se esconde num bordel em 'A', último episódio de M0therb0x (foto: Natalia Pilati/divulgação)
Tanto na literatura quanto no audiovisual, a ficção científica especula sobre o futuro explorando temas como ciência e tecnologia, além dos impactos deles sobre a sociedade e o indivíduo. De Metrópolis (1927) a Interestelar (2014), passando por produções contemporâneas, como  Black mirror e Dark, o amanhã é tratado como uma categoria plena de possibilidades, principalmente por grandes estúdios do exterior. Como seria, então, traduzir esses conceitos para o contexto brasileiro e gerar uma reflexão sobre os valores nacionais?

Esse é o objetivo do projeto multimídia M0therb0x, cujo primeiro produto, em formato de websérie, estreia na quinta-feira (10), no YouTube. Composta por três episódios independentes, a produção se passa numa cidade fictícia do Brasil, no ano de 2055, onde a vida é predominantemente urbana, digital e corporativa.

“A ideia surgiu há quatro anos, quando comecei a escrever uma série cyberpunk sci-fi ambientada no Brasil, já inspirado pelas produções da Netflix, ou seja, voltada para a internet. Em determinado momento, não sabia como tirar isso do papel. Foi quando acionei o Pedro L. Filizzola e submetemos o projeto em alguns editais, participamos de rodadas de negócios. Mas o custo de uma produção desse formato sempre foi um impedimento, ainda mais considerando que nós somos estreantes na área”, conta o produtor Tmccartiney.



RECURSOS PRÓPRIOS

Com o passar dos anos, a ambição dos dois amigos cresceu, eles se juntaram à produtora Bárbara Caldeira e juntos, com recursos próprios, financiaram o projeto. “A ideia é expandir a produção para outros formatos, como longas, quadrinhos, RPG e zines”, adianta Pedro Filizzola.

“Teste”, o primeiro episódio, questiona a importância da memória para a formação da identidade. “O que acontece quando ela é constantemente apagada, e temos que passar novamente pelas mesmas experiências? A memória é requisito para algo ser considerado vivo?”, questiona a sinopse.

Já o segundo, “Brilhante”, que vai ao ar em 17 de setembro, trata do efeito alienante que a divisão de classes produz, mostrando o encontro de duas realidades distintas: os não registrados (que vivem à margem da sociedade) e os jovens de classe média. A vida do primeiro grupo se resume a lutar diariamente pela sobrevivência, sem acesso às benesses do Estado. A vida do segundo é resumida a festas transmitida em tempo real via internet.

O terceiro e último,“A”, que será liberado em 24 de setembro, apresenta um casal contrabandista de tecnologia desafiado a se manter em segredo no bordel localizado numa cidade totalmente controlada e vigiada.

Rodados em Belo Horizonte e São Paulo, os episódios adotam o formato de curta-metragem. Cerca de 200 profissionais trabalharam voluntariamente para viabilizar a primeira temporada.

“Quando a gente faz um trabalho desse porte, acionando tantos produtores de diferentes lugares, estamos também jogando luz para a cena que está enfrentando cada vez mais dificuldades”, pontua Tmccartiney.
Robert Franck/divulgação
Bastidores das filmagens do episódio 'Brilhante', que aborda a relação dos jovens com a luta de classes (foto: Robert Franck/divulgação)

REALIDADE

Muito embora imaginem o futuro distópico, os episódios trazem importante relação com a atualidade, como o uso desenfreado das tecnologias de comunicação. “Ao imaginar a parte visual do nosso futuro, não queria que a produção se distanciasse do que temos hoje em questões de tecnologia, por exemplo. É um futuro que faz parte da realidade. Não estamos falando de carros voadores, mas de tecnologias que já estão presentes na nossa vida”, aponta Bárbara Caldeira, que assina a direção de arte.

Às vésperas da estreia virtual, o trio adianta que a segunda temporada está nos planos. Para viabilizá-la, foi lançada uma “vaquinha” na internet, que pode ser acessada por meio do site apoia.se/m0therb0x.

“Produzir obras audiovisuais no Brasil sempre foi difícil. Nos últimos tempos, o país enfrenta um momento político conturbado, em que há praticamente a paralisação dos editais de incentivo à cultura, minimizando a produção audiovisual. Esse é um meio de coletar doações do público, que podem ser de qualquer valor”, afirma Bárbara Caldeira.



M0THERB0X

Websérie em três episódios, que serão disponibilizados em 10, 17 e 24 de setembro, às 19h, no canal do YouTube (youtube.com/m0therb0x)

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