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Saiba como sobrevivem as locadoras que remam contra a maré da Netflix

 


A cada dois meses, Geraldo Megre Rezende Filho, de 52 anos, imprime a edição digital da revista Wmix, uma das últimas publicações remanescentes no país dedicada exclusivamente ao lançamento de títulos de DVD para locação. Lê com cuidado as sinopses e anota os títulos que mais lhe interessam em um pedaço de papel. Na sequência, começa sua busca pelos filmes nas quatro videolocadoras na capital mineira das quais é sócio – ArtVideo (Savassi), StarVideo (Cidade Jardim), Video e Magia (Gutierrez) e RV Video (São João Batista). É raro um mês em que ele não alugue de 15 a 20 filmes, entre clássicos e lançamentos.


Mas a vida de Geraldo e dos últimos sócios das videolocadoras – que ainda preferem pegar o disco a se entregar aos serviços de streaming –, está cada vez mais difícil. A última década marcou o fechamento de grandes redes que foram da glória, com a popularização dos aparelhos de DVD, ao drama provocado por fatores como o consumo pirata, o crescimento do acesso à TV a cabo e, mais recentemente, dos serviços sob demanda e de streaming.

“Desde a adolescência, quando havia o VHS, alugo filmes. Fui sócio de todas as redes que foram fechando: a Popular, que alugava filmes a R$ 1, Blockbuster, BH Video, Videomania. Até as revistas foram acabando. Lá em casa, só eu assisto.
Minha menina gosta de jogos e de ver Netflix”, conta Geraldo.

Fundada em Dallas, em 1985, a Blockbuster foi a maior rede de locadoras de filmes do mundo, com mais de 9 mil lojas. Chegou ao Brasil em meados da década de 1990 e, em 2007, a rede de franquias, que contava com 127 lojas no país, foi comprada pela Lojas Americanas. O império foi ruindo com a mudança do mercado e, hoje, resta apenas uma loja Blockbuster, em Bend, no estado do Oregon, nos Estados Unidos.

Segundo a Câmara dos Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), existem hoje 185 comércios cadastrados na capital cuja atividade primária é aluguel de DVDs e similares – ou seja, esses negócios foram migrando com o tempo para a oferta de outros serviços, como a digitalização de fitas e vendas. Aluguel, mesmo, está restrito a circuito cada vez menor de locadoras.

Os argumentos de quem prefere continuar alugando vídeos são variados. “É igual com os livros. Prefiro pegar o livro impresso, ver a capa. Na Netflix, é mais difícil.
Prefiro pegar na locadora, me dá mais liberdade”, afirma Pedro Azeredo, cuja família é cliente da StarVídeo, no Bairro Cidade Jardim, desde a abertura da locadora, em 1992.

“É muito divertido chegar e garimpar um filme. Tenho hábito. Se gosto de um ator específico, vejo todos os filmes dele. Esses dias, me apaixonei pelo Laurence Olivier. Aí assisti a todos os filmes dele”, diz Ana Paula Portugal França, cliente da ArtVideo, na Savassi. “É cultura, uma delícia. Adoro a opção de manusear. Gosto de ter essa relação com o DVD.
É mais calorosa.”



QUEDA Além da redução do número de clientes, as locadoras também sofrem com o definhamento do mercado. “As distribuidoras diminuíram muito os lançamentos, outras fecharam. Já comprei mais de 100 lançamentos, hoje são em torno de 30. O movimento caiu em torno de 80%”, afirma Randolfo Paiva, de 60, dono da StarVideo.

Para manter a clientela fiel e compensar a queda dos lançamentos, algumas locadoras têm partido para um nicho especial: os clássicos do cinema, que agradam aos sócios mais antigos e aos jovens ávidos pelo estudo da sétima arte. “Para compor essa perda, estou trabalhando com nicho de clássicos. E estou conseguindo trazer esse público para cá. Tenho dado sorte com ele. Do mesmo jeito que o vinil sobreviveu: quem manteve lojas passou aperto, mas se deu bem.”

Os clássicos e filmes de arte também são o grande atrativo da ArtVideo, aberta em 1993, na Savassi. A locadora, que ocupava duas lojas na Rua Fernandes Tourinho, hoje tem a metade do tamanho original, mas o acervo ainda atrai estudantes, pesquisadores e apaixonados por filmes. Marlene Lisboa Rosa Almeida Gomes lembra, saudosa, de quando a locadora se tornou um point de cinéfilos, entre 2005 e 2007.

“A locadora enchia, na sexta-feira à noite chegava a ter fila”, diz ela, que pensou em fechar o ponto há alguns anos, mas mudou de ideia. “Aqui a gente conversa muito com as pessoas sobre filmes, cinema. Chega a ser uma terapia.”

Marlene e Randolfo esperam que as locadoras ainda tenham vida longa, para a felicidade de clientes como Geraldo, Pedro e Ana Paula. Quando questionado sobre até quando vai manter as portas abertas, Randolfo tem a resposta na ponta da língua: “Até quando tiver filme”.

 

 

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