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Maria Camargo fala sobre 'Assédio', série que retrata crimes cometidos pelo ex-médico Roger Abdelmassih

Vítimas são as verdadeiras protagonistas de 'Assédio' - Foto: Ramon Vasconcelos/Divulgação“A história real de Roger Abdelmassih, tal como a conhecíamos, tinha foco na perversidade. Mas o que nos moveu foi saber o que aconteceu com as mulheres atacadas por ele e como elas foram capazes de virar o jogo, enfrentar a dor e, heroicamente, quebrar o silêncio”, afirma Maria Camargo. A roteirista assina o texto de Assédio, nova série da Globo, lançada primeiramente na internet. Os 10 episódios, que acompanham as vítimas e a trajetória do ex-médico – condenado pelo estupro de dezenas de pacientes –, têm direção de Amora Mautner e estão disponíveis no Globoplay (plataforma digital da emissora).

Inspirada pelo livro A clínica: A farsa e os crimes de Roger Abdelmassih, de Vicente Vilardaga, a autora criou Dr. Roger Sadala (Antonio Calloni), um conceituado médico, especialista em reprodução assistida. Tal qual o personagem real, Sadala fez fama e fortuna, mas vê seu renome ruir quando surgem as primeiras acusações de violência sexual por parte de antigas clientes.

“Meu desejo em contar essa história veio justamente por conta do multiprotagonismo feminino. Não é só a história de um estuprador serial. Antes dos casos de abuso, passo pelo drama que as personagens viviam e que as levou até a clínica”, diz a roteirista.
Coube a Maria Camargo condensar, em poucas personagens, as 56 acusações que condenaram Abdelmassih a 181 anos de prisão.

MATERNIDADE A primeira vítima apresentada ao espectador é Stela (Adriana Esteves, sempre ótima), uma mulher de classe média com o sonho de engravidar, que convence o marido a tomar R$ 30 mil em empréstimo para custear o tratamento ofertado por Sadala. “A maternidade está presente em todos os 10 episódios. É uma característica em comum entre todas as vítimas do Dr. Roger – à exceção das que não eram suas pacientes. O desejo de ser mãe está na gênese dessas personagens. Não é o foco da história, mas é o motivador principal daquelas mulheres”, diz Camargo.

Nos episódios seguintes, conhecemos outras vítimas do médico – entre pacientes e uma funcionária –, que terão a ajuda da jornalista Mira Simões (Elisa Volpatto) para denunciá-lo à Justiça. “Com essas personagens, buscamos usar tudo o que pesquisamos sobre os atos cometidos contra as vítimas, as situações em que elas se encontravam e como reagiram.
As que conseguiram falar, as que não; as que foram mal interpretadas ou simplesmente ignoradas; as que sofreram violência por terem contado... Foram muitos casos, com uma variação bem grande, e não daríamos conta de todos. Tentamos criar um painel aproximado do tipo de violência por que as mulheres passaram”, conta a autora.

O elenco ainda conta com Paolla Oliveira, Mariana Lima, Juliana Carneiro da Cunha, Hermilla Guedes, João Miguel e Mônica Iozzi – num papel dramático, em participação especial.

VILÃO Sobre o papel de Roger Sadala, interpretado por Antonio Calloni, a roteirista diz: “É o vilão, o antagonista – não há ambiguidades quanto a isso”. No entanto, Maria Camargo observa: “Mesmo assim, ele reúne características humanas e suas complexidades, porque criar um personagem simplesmente mau faria dele, também, um personagem muito pobre.” Para construir uma figura abominável e, ao mesmo tempo, crível de um médico estuprador, ela conferiu a ele certo ar de persuasão e fez de Dr. Roger um personagem capaz de seduzir e amar – ainda que de forma doentia.

“Para um autor, é preciso entrar no personagem e falar com a voz dele, sem julgamentos. O vilão, em geral, não acha que é vilão. Todos contam para si alguma história e, de alguma maneira, justificam seus atos.” Por isso, além das vítimas, Roger também relata, à sua maneira, outra versão dos fatos ao longo dos episódios. “Calloni pegou tudo isso e fez um trabalho incrível, assustador.
Ficamos todos com medo quando assistimos pela primeira vez”, diz ela, que assina o texto com a colaboração de Bianca Ramoneda, Fernando Rebello e Pedro de Barros.

Abdelmassih foi responsável pela gravidez de diversas celebridades e fez amigos entre os famosos, como Hebe Camargo e Roberto Carlos. Em Assédio, não há representações diretas dessas pessoas, mas sim referências indiretas, como se observa no cado da apresentadora de TV interpretada por Vera Fischer e do cantor de sucesso vivido por Jarbas Homem de Melo.

“A série reúne personagens ficcionais livremente inspirados em pessoas que fizeram parte da história. Roger circulava entre os poderosos e estava sempre na mídia, o que lhe deu muita força e permitiu que ficasse impune por muito tempo. Ele estava blindado em um mundo não acessível aos comuns mortais. Esse dado é um componente muito forte para que a história real tenha se desenrolado daquela forma”, observa Maria Camargo..