Marieta Severo diz que o Brasil vive um momento 'triste'. E alerta: 'O momento é delicado'

05/11/2017 10:57
Raquel Cunha/Globo
Rotina de gravações de O outro lado do paraíso vai deixar Marieta Severo fora dos palcos durante a novela (foto: Raquel Cunha/Globo)
A julgar pelo que se vê no ar em O outro lado do paraíso, Marieta Severo tem tudo para ser o grande nome da novela das 21h da Globo. Ambiciosa, Sophia, sua personagem, é mãe de Gael (Sergio Guizé), Lívia (Grazi Massafera) e Estela (Juliana Caldas). E fará de tudo para colocar as mãos nas esmeraldas das terras que pertencem à nora, Clara (Bianca Bin). Até interditá-la, alegando que a professora tem graves problemas psicológicos. Tudo para evitar a decadência financeira da família. Na entrevista a seguir, a atriz destaca suas impressões sobre Palmas e o Jalapão, no Tocantins, e conta quais características buscou para Sophia. Além disso, Marieta desabafa sobre a situação do teatro e comenta a respeito da crise política no Brasil, lembrando que realidade e ficção se misturam neste momento.

Essa foi a primeira vez que você visitou o Tocantins?
Sim. Já tinha feito espetáculo em Goiânia, mas não conhecia Palmas e nem o Jalapão e foi uma oportunidade maravilhosa Acho que não iria, nessa altura da vida, para lá. Mas, quando você chega, é realmente um paraíso! É impressionante o que temos nesse Brasil E mostrar isso é muito prazeroso.

Você buscou alguma característica das mulheres de Palmas para a Sophia?
Passei uma tarde em Palmas, na qual andei bastante pelos condomínios. Mas não estive com as moças. Acho que essa elite endinheirada de lá também é a da Barra (da Tijuca, no Rio de Janeiro). Não tem muita distinção. Você encontra um modelo em que as pessoas se espelham. Tenho a impressão de que, nesse caso, é Miami, é algo que vem de fora. É americano, porque nós não somos louras.

Na trama, a Sophia não é uma sogra fácil de lidar. Considera a personagem implicante?
Ela não é uma sogra que implica ou que tem rixa. Essa nora entra na grande ambição da Sophia, que é uma mulher completamente focada em dinheiro. O problema é o poder. Mas não o político, e sim o financeiro. Ela se alimenta disso, é uma personagem de uma atualidade absurda. Muito gananciosa e consumista.

Como você lida com o dinheiro?
De uma maneira muito saudável. Tudo que tenho é fruto do suor do meu próprio rosto. Ganhei trabalhando, me dei bem na minha profissão, sou bem-sucedida, vivo bem, mas é tudo fruto do meu trabalho. E tenho grande orgulho disso.

Além da novela, você fará alguma peça paralelamente?
Não dá pra ter um espetáculo agora porque a gente trabalha de segunda a sábado. É impossível. Depois da novela, já dá para pensar. Tem o Poeira e o Poeirinha (espaços de teatro criados por Marieta e pela atriz Andréa Beltrão, no Rio), então continuo atuando, apesar de o teatro estar sofrendo muito. O Poeira está indo bem, se equilibrando, porque sempre viveu de mim e da Andréa. Ele se mantém financeiramente. Colocamos grana lá todo mês há 12 anos e vivo disso. É o teatro que me dá uma alegria, um prazer, uma recompensa que não é financeira nem mensurável. Mas, nessa crise, também está mal, tem menos público.

Você fala de crise. Como vê esse momento atual?
Nasci em 1946 e nunca imaginei que fosse viver um momento político tão desastroso, tão triste na política brasileira. Não imaginei que a gente pudesse, de novo, ter situações ditatoriais, que é o que estamos vivendo. É um momento delicado. Antes de pensar em 2018, gostaria que, agora, a gente tivesse uma luz, uma maneira de sentir que existe qualquer vislumbre de espírito público nas nossas instituições. Adoraria que algum deles pensasse um pouco nisso, em vez de pensar em causa própria o tempo inteiro.

Você se sente pressionada pelas expectativas que permeiam as novelas das 21h?
É claro que sei que existe uma expectativa em torno desse horário, chamado de nobre. Mas sempre tive a capacidade de trabalhar fora disso. Sei que existe, está por aí, mas não me afeta. Faço meu trabalho da melhor maneira possível. Qualquer personagem sempre mexe com inseguranças. Será que vai dar certo? Será que é o melhor caminho? Tem essa coisa da criação que é inquieta. Mas sei que tenho todos os elementos de qualidade ao meu redor e é isso que me interessa.

Acredita que a ficção se aproxima cada vez mais da realidade?
Não há nada mais assustador do que a realidade. A ficção não consegue chegar aos pés da vida real, que é avassaladora. Na Idade Média, as pessoas queimavam umas às outras. Mas a gente tem a tendência de achar que o ser humano caminhava para o progresso, para a luz. Está ocorrendo o oposto e a gente cada vez se fecha mais.

Você já perdeu a esperança no ser humano?
Não sou sem esperança. Mas, quando você vê a história, percebe que as coisas são cíclicas. Não queria viver esse momento. Não tenho mais idade para andar para trás. Esse pessoal jovem está com um preconceito que, na minha época, era caretice. Como pode um jovem de 22 anos ser assim? Com essa idade, a gente queria quebrar barreiras, experimentar coisas novas. (Estadão Conteúdo)

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