Fonte de emoção e energia, veja como a música afeta as pessoas

Quais os significados e como você se alimenta dos sons que o acompanham? Fonte de emoção, energia, lembrança e transformação. é tempo de saber de que forma a sonoridade o afeta

por Lilian Monteiro 29/04/2018 13:42

Beto Novaes/EM/D.A Press
"Sou apresentado a novos sons pelos pacientes, estimulo meus filhos, Henrique e Malu, que já têm coleção de vinil, minha mulher, Juliana, toca violão e estudou em conservatório, enfim, a música me preenche. Mais: ela define, transforma ou representa meu estado de espírito" - Fabrício Pimenta, dentista e dono da cerveja artesanal Vinil (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)

Acredito que não é possível traduzir o significado da música em palavras. Música é para sentir, emocionar, tirar cada um do estado em que se encontra. Música é sentimento, é sensação, é efeito. É mente em transe, corpo em frenesi, coração acelerado ou no compasso, é pessoal e impessoal, voluntária e involuntária, que o invade com ou sem permissão, tem o poder de arrebatar e anestesiar, é para o bem e para o mal, individual e coletivo.


Música é sinônimo de bem-estar. Envolve, toca profundamente, marca a vida. Faz parte do desenvolvimento humano, contribui com a educação e a pedagogia, é saúde, minimiza e trata doenças ao melhorar a comunicação, expressão e relacionamento, recupera funções, atua sobre o físico e o estado emocional, social e cognitivo, é criatividade, tem a musicoterapia com prescrição clínica. Enfim, é remédio e antídoto, às vezes, veneno. Entorpece.


Ela é tudo isso, só não é imparcial. Música afeta, transforma, muda e influencia por doses de estilo, ritmo, melodia, harmonia, ruído e silêncio de maneira orgânica, psíquica e emocional. Uma onda sonora que por meio do timbre, amplitude, altura, frequência e intensidade causa uma catarse nos mais variados momentos da existência. Presente na alegria e na tristeza, nas vitórias e tragédias, na guerra, na opressão e na liberdade, no nascimento e na morte, na religião e no carnaval, no amor e no sexo, a música leva ao equilíbrio entre o fisiológico e emocional das pessoas por meio da pulsação. Música é uma experiência. Uma memória não verbal até.


Hoje, o Bem Viver o convida a mergulhar em sua história musical afetiva. Por meio de personagens, que assumem o papel de fios condutores, contamos experiências musicais e sonoras de quem tem a música como companhia constante. Seja no embalo do dia a dia, seja profissionalmente. De anônimos a músicos de carreira, passando por especialistas da área de saúde, como psiquiatra e psicólogo, todos têm em comum a certeza do quanto é necessário, faz bem e pode ser urgente ter uma canção, uma batida, uma trilha ou um refrão presente em sua vida.


Além de tudo que entrega, outro viés particular da música é que, quase sempre, ela está acompanhada, não só de pessoas, mas de um outro interesse. No caso do ortodontista Fabrício Pimentel Bastos, a paixão pela música foi traduzida no hobby de produção artesanal de cerveja. Da experiência com o lúpulo, malte e leveduras nasceu a Vinil, marca do qual é sócio-cervejeiro e tem raiz, claro, no disco bolacha, que depois do ostracismo e de ter sido engolido pelo CD, volta agora ainda mais cultuado. “Minha influência musical vem dos meus pais e da coleção de discos de vinil, tenho a minha desde criança. O rock nacional e internacional dos anos 1980 é a base de quase tudo que ouço, as referências. Mas sou da turma que busca coisas novas. Ainda que tenha crescido ouvindo clássicos, não tenho mais paciência para Dire Straits e Pink Floyd. Adoro, mas gosto do que surge. Ainda mais porque o rock já não é pauta do mercado de hoje. Então, blues, jazz, pop, indie e folk estão na minha playlist. Como diz um amigo, sou ‘eclesiástico’ (eclético, na verdade!).”

ESTADO DE ESPÍRITO Fabrício tem um carinho à parte pelo vinil, tanto que faz parte do Clube do Vinil, galera de amigos que tocam em eventos “brincando de DJ, de tocador de disco e, na hora de batizar a cerveja, foi natural, simples, curto e direto: Vinil, que tem relação direta com a música. Do encontro dessas duas paixões, nasceu uma verdadeira sinestesia: ver, beber e ouvir. Aliás, mesmo ouvindo Spotify, curioso sobre novas cenas, descobrindo bandas, no fim vou procurar saber se há aquele som também em vinil para comprar”.


Seja no consultório, na produção da cerveja ou no dia a dia, Fabrício ressalta que a música o acompanha o tempo inteiro: “Sou apresentado a novos sons pelos pacientes, estimulo meus filhos, Henrique e Malu, que já têm coleção de vinil, minha mulher, Juliana, toca violão e estudou em conservatório, enfim, a música me preenche. Mais, ela define, transforma ou representa meu estado de espírito. Aliás, acredito que traduz o espírito de todo mundo com sua capacidade de comunicar-se com todos, da forma que todos entendam, por se apresentar nos mais diferentes gêneros e estilos”.

Música, portanto, é sensorial e pode desvendar, revelar, indicar sua personalidade, identidade, perfil, estilo, jeito de ser. É aquela história, diga-me o que ouve e te direi quem és.

Parceira de todas as horas

Gostar, ouvir e aprender sobre música é como o amor pela leitura

Leandro Couri/EM/D.A Press
"A música me acalma, me inspira, me acolhe quando estou triste, faz com que eu me contenha quando estou feliz, me faz pensar, me distrai e me concentra. Para dormir ela também está lá, firme e forte... companheira" - Simone Fudoli, professora e bancária (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

“Nem sei bem qual a primeira lembrança de música, mas acho que desde que me entendo por gente ela esteve presente na minha vida: nas viagens de carro com meu pai, do rock que vazava do quarto do meu irmão, no meu toca-fitas e depois diskman com fones de ouvidos na escola (camuflados na cabeleira de sempre), no quarto, nas visitas aos estúdios de rádios, nos encontros com amigos... A música sempre me atraiu.!” Essas memórias são de Simone Fudoli, de 39 anos, professora que trabalha em um banco e que, “se Deus quiser”, ainda irá se envolver “com algo voltado para a música”.

A paixão pela música de Simone Fudoli é contagiante. Você se envolve automaticamente: “A música está na minha pele. Tenho uma clave de sol tatuada no pulso e um coração com o sinal de paz e amor no braço (que foi o logotipo da turnê do ano passado de Histórias reais de paz e amor, da banda Nenhum de Nós). Acordo e já aciono uma playlist. Meu porta-lápis em casa é feito com partituras... Tem gente que não vive sem TV. Eu não vivo sem música.”


Simonte revela que Marina, sua filha de 6 anos, herdou o mesmo gosto: “Se um dia ela for questionada sobre a primeira lembrança de música, também dirá ‘não sei. Desde que me entendo por gente ela está na minha vida’. Acho que até antes de ela se entender por gente. A música está comigo no banho, no carro e até no ambiente corporativo (com um fone só para que o outro ouvido esteja disponível para o trabalho). A música me acalma, me inspira, me acolhe quando estou triste, faz com que eu me contenha quando estou feliz, me faz pensar, me distrai e me concentra. Para dormir ela também está lá, firme e forte... companheira”.


A relação de Simone com a música é visceral. Ela conta que, quando dava aulas, algumas vezes escrevia no quadro frases de músicas que estimulassem seus alunos a ser pessoas melhores, frases que pudessem ajudar numa autoestima mais alta... E fazia isso em provas e outras atividades também. Sua relação com a música extrapola o ouvir. Tanto que é natural espalhar trechos de letras de músicas escritos em bilhetinhos na mesa de trabalho, por exemplo. ‘Até quando as pessoas serão sinceras sem querer pra depois se desculpar?’ (Nenhum de Nós), ‘Eu fico só esperando que você venha pra modificar o que está fora do seu lugar... Que você venha pra modificar’ (Ricardo Koctus) e ‘Um futuro brilhante depende de um passado intensamente vivido (...). Felicidade é pros que choram, se arriscam e se machucam, pros que tentam sempre, felicidade é pros que buscam’ (Blitz). “A minha mensagem do WhatsApp é parte de uma música da Rita Lee... ‘Se por acaso morrer do coração é sinal que amei demais. Mas enquanto estou viva e cheia de graça, talvez ainda faça um monte de gente feliz’. Coloco música em tudo que posso na vida, mas acho que não tenho uma que seja a música da minha vida.”


A professora e bancária não é só uma ouvinte da boa música, ela já experimentou tocar instrumentos e, quem sabe, o futuro irá nos apresentar uma profissional? “Estudei piano quando criança, participei do Coral Júlia Pardini, tentei aprender violão, trabalhei um tempo em uma casa noturna só pelo prazer de conviver com a música. Acabei conhecendo muita gente que atua no meio e um monte de gente que compartilha do meu gosto pela música. Fiquei amiga de vários deles (inclusive de ídolos!). Então, a música virou também um meio de fazer amigos. E ganhei excelentes com isso.”


Simone Fudoli diz que falar de música é delicioso. Lembrar de músicas que marcaram épocas, então. “Até consigo lidar com quem não gosta de música, mas não consigo pensar em ninguém assim do meu grupo de amigos. Fico feliz quando alguém me fala que se lembrou de mim por causa de determinada banda ou música. E os amigos que me conhecem bem já sabem que se estou numa festa e toca uma música que me fez pensar em alguém ou alguma situação, há grandes chances de essa pessoa receber um áudio mal cantado (gritado) no meio da madrugada.”

METALLICA E NENHUM DE NÓS

Simone diz que não considera sua seleção musical das mais criteriosas, mas enfatiza que não ouve de tudo. Ela destaca que alguns estilos suporta, se precisar... Outros não. “Não curto sertanejo, nem funk (tenho pavor de música que degrada a imagem da mulher). Adoro rock e, sem dúvidas, rock e pop rock dos anos 1980 são os estilos que mais mexem comigo. Tem música que marca momentos, lembra pessoas, traz de volta sensações. Até para passar raiva é melhor se tiver música ao fundo. Numa playlist com rock e pop rock com certeza tem muita coisa que faz com que eu me sinta num desses clipes da MTV.”


Quanto à trilha sonora da sua vida, Simone cita um top five, top ten, mas diz que muita gente apontaria Camila, Camila, do Nenhum de Nós, como parte da identidade. “Mas nem é a minha preferida dessa banda (que é a minha banda preferida). Mas quando vou em shows de amigos, inevitavelmente peço por NDN e geralmente é a que eles tocam. Então eu meio que ‘aceito’ que Camila, Camila seja um pouco ‘minha’ música (mesmo conhecendo a triste história da garota que inspirou a banda a escrever a letra).”


Ao pensar nas preferências de estilo, Simone diz ter certeza de que a culpa por eu gostar de rock é do meu irmão mais velho. Nas aulas de inglês do colégio era o máximo levar a letra (traduzida por ele) como a de Nothing else matters, do Metallica, como sugestão e a professora adorar e passar em sala. Ele ouvia também muito rock nacional e eu fui aprendendo. Apesar de amar os anos 1980, gosto quando me indicam novidades. Adoro ser surpreendida. Às vezes, a letra me ganha, mesmo que a música não me atraia muito. Às vezes, é o contrário. É tão bom! E, depois que descubro algo bom, quero compartilhar, procuro saber quem são os músicos, como é o álbum, o por quê daquele nome. Tem muita coisa boa que não toca nas rádios. Ultimamente, gosto mais das músicas ‘não comerciais’”.

 

A partir do Spotify, aplicativo de streaming de música, é possível mapear diversas informações ao redor do mundo quanto ao perfil musical de cada lugar. Como é típico desse universo, tudo muda muito rápido, mas separamos algumas curiosidades:
– O rap é o gênero musical mais ouvido no mundo
– Finlândia, Taiwan e países latino-americanos apresentam maior tendência a ouvir músicas locais
– No Brasil, sertanejo é a preferência nacional
– No Pará, a guitarrada, uma fusão do choro com carimbó, cumbia, merengue, mambo, bolero e o movimento iê-iê-iê, é o gênero mais popular. Aliás, o carimbó é patrimônio Cultural Imaterial do Brasil desde 2014

NO RÁDIO

A pesquisa “Tribos Musicais”, feita pelo Ibope, em 2013, apontou a audiência das músicas mais pedidas pelos ouvintes de rádio no Brasil

    1º –    Sertanejo, escutado por 58% do público
    2º –    MPB, ouvida por 47%
    3º –    Samba e pagode, com 44%
    4º –    Forró e rock, com 31%
    5º –    Eletrônica e religiosa, com 29%
    6º –    Axé, com 26%
    7º –    Funk, com 17%
    8º –    Country, com 12%
    9º –    Clássica, com 11%
    10º –    Jazz e blues, 9%