O transplante de células-tronco é uma alternativa para restabelecer a função medular em uma série de problemas de saúde relacionados à função sanguínea, como leucemias, linfomas e anemias malignas. Para tornar o procedimento ainda mais eficiente, pesquisadores americanos identificaram um subconjunto específico de células-tronco que é exclusivamente responsável por “repovoar” todo o sangue e o sistema imunológico, após um transplante. Os achados foram vistos em um experimento com macacos e divulgados na última edição da revista americana Science Translational Medicine. Os investigadores acreditam que a descoberta pode ajudar a refinar um dos processos médicos mais importantes da área terapêutica.
A célula-tronco hematopoiética (CTH) é responsável pela manutenção da produção dos diversos tipos de células sanguíneas: as hemácias, os linfócitos e os megacariócitos (dos quais se originam as plaquetas). Em procedimentos como o transplante de medula óssea, para fazer a coleta dessas células, os médicos buscam as CTHs que possuam um marcador chamado de CD34. Essa exigência garante que a produção de células sanguíneas ocorra no paciente que receberá o transplante.
No novo estudo, os cientistas encontraram mais dois marcadores envolvidos na eficiência das CTHs. “A população de células-alvo padrão para terapia de células-tronco é a das que possuem o marcador CD34.
Os pesquisadores encontraram os novos marcadores ao realizar transplantes de medula em macacos. A equipe monitorou a atividade de centenas de milhares de células CTH nas cobaias. Nas observações, constataram que as CTHs com os marcadores CD34, CD45RA e CD90%2b foram as mais bem-sucedidas na produção de células sanguíneas logo após o transplante. A equipe descobriu que essa subpopulação representava cerca de 5% de todas as células estaminais do sangue responsáveis pelo trabalho de recuperação inicial do sistema sanguíneo, realizado nos primeiros dias seguintes ao transplante. O número é bastante expressivo pelos cientistas.
O grau de importância dos novos marcadores foi reforçado quando os cientistas analisaram os animais, um ano depois, e encontraram fortes traços moleculares dessas células, indicando que o subgrupo se manteve como responsável pela manutenção contínua do sistema recém-transplantado. “Nossa capacidade de rastrear células sanguíneas individuais que se desenvolveram após o transplante foi fundamental para demonstrar que essas são realmente células-tronco extremamente importantes”, reforçou Jennifer Adair, coautora do estudo e professora na Universidade de Washington (EUA).
Os autores destacam que a descoberta dos novos marcadores acaba com uma suspeita antiga da área médica. De acordo com os investigadores americanos, antes acreditava-se que vários subtipos de células-tronco do sangue estariam envolvidos em diferentes tarefas, permitindo que um novo sistema sanguíneo pudesse se recompor. “Essas descobertas vieram como uma surpresa. Pensamos que existiriam vários tipos de células-tronco do sangue que assumiam diferentes papéis na reconstrução de um sistema sanguíneo.
Refinamento necessário Eduardo Flávio Oliveira Ribeiro, coordenador de Hematologia do Centro de Oncologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, e membro titular da Sociedade Brasileira de Hematologia (SBH), destaca que os achados internacionais são interessantes e abordam uma necessidade bastante visada por especialistas. “O estudo trata exatamente daquilo com o que lidamos no nosso dia a dia: maneiras de otimizar o uso de células-tronco. Chamamos de processo de mobilização a essa etapa na qual buscamos as células com o CD34. Para realizar o transplante, é preciso uma quantidade considerável de células desse grupo. Mostrando um subgrupo ainda mais específico, é possível otimizar o processo e aumentar as chances de eficácia”, destacou o especialista, que não participou do estudo.
Ribeiro ressalta que o refinamento da coleta das células proporcionaria uma melhora de todo o processo terapêutico. “Caso esse trabalho avance, o que eu prospecto para o futuro seria a capacidade de purificar esse enxerto. Isso faria com que os pacientes se recuperassem mais rápido. Quando realizamos o transplante e a produção das células sanguíneas se inicia no paciente, chamamos isso de 'pega'.