É só o crush ficar on-line que o coração começa a bater mais forte. Todos os dias, a rotina inclui um passeio por todas as redes sociais da pessoa amada – a famosa “stalkeada”. O sonho de quem paquera pela internet não é só ter um relacionamento, mas ser “shippado” pelos amigos. A internet mudar a forma de paquerar não seria uma exceção.
Não é de hoje que os solteiros buscam na internet uma forma de conhecer alguém especial. Dos tempos do bate-papo até os modernos aplicativos de encontros, a web é uma ferramenta que pode não só facilitar a vida dos tímidos, como ajudar a encontrar pessoas com gostos parecidos, aumentando as chances de o romance vingar. Para os neurotransmissores, a fase da conquista é extremamente benéfica, graças à ação da dopamina e da ocitocina, responsáveis pela motivação, confiança e criação de laços afetivos, segundo a psicóloga Lia Clerot.
Naturalmente, a rede também tem seus lados pouco positivos. Ciúme em excesso, obsessão, distanciamento físico do par, tudo isso entra na lista de possíveis efeitos colaterais da vida amorosa on-line. “O uso das redes sociais é benéfico porque acaba aproximando pessoas que estão longe e faz com que o seu círculo social aumente.
Às vésperas do Dia dos Namorados, o Bem Viver tenta entender como funciona a conquista em tempos de conectividade – como a rede tem influenciado o ciúme, o namoro e o caminho até a cara-metade?
PAPEL DE CUPIDO
Em algumas histórias, o mundo virtual pode fazer papel de cupido e proporcionar o que não seria possível na vida real. Muitas vezes, as rotinas vividas e os lugares frequentados podem dificultar o encontro de alguém que poderia ser especial. No caso de Mariane Weizenmann, de 24 anos, e Átila Arantes, de 29, a rede social proporcionou, há 10 anos, que os dois se conhecessem por acaso, em uma brincadeira feita quando uma amiga de Mariane visitou a página de Átila no extinto Orkut.
“O Orkut, na época, ajudava no monitoramento. Podíamos ver quem havia visitado nossa página e checar o perfil dessa pessoa. Foi em uma dessas que conheci a Mariane”, lembra-se Átila. O dentista conta que uma amiga da namorada visitou sua página na rede social e, ao começar a conversar com ela na própria página, Mariane entrou na brincadeira. “Tínhamos costume de entrar no perfil de quem tinha nos visitado e mandar uma mensagem no painel de atividades. Foi em uma conversa dessas que a Mariane apareceu e começou a conversar também.”
A partir daí, Átila e Mariane começaram a se interessar um pelo outro. “Eu estava na 8ª série. Conversávamos muito pelo Orkut e ele acabou pedindo meu telefone. Depois, descobrimos que frequentávamos vários lugares em comum, mas nunca havíamos nos esbarrado”, comenta Mariane.
O casal acredita que não teria se conhecido sem o contato com a internet. “Pela diferença de idade, nossas vidas e rotinas eram um pouco diferentes. Um encontro seria difícil. Acho que o Orkut nos uniu”, diz Átila.
Ciúme de você
Para evitar possíveis problemas causados por conta das redes sociais, o casal Geyza Silva, de 23 anos, e Junior Souza, de 21, optou pelo uso de uma conta conjunta no Instagram. Desde a primeira semana de namoro, os dois excluíram todas as contas individuais que tinham e criaram uma única para o casal na rede social. Hoje, noivos, os dois acreditam que a iniciativa contribuiu para a durabilidade do relacionamento.
“Tomamos essa decisão baseados em experiências passadas, que acabaram sendo desagradáveis. Temos o mesmo estilo de vida e os mesmos gostos, então, não vejo problema nesse compartilhamento”, diz Junior. A conta foi criada, inicialmente, para que ele tivesse visibilidade nas competições de fisiculturismo, mas, depois de um tempo, tomou um rumo diferente. No Instagram, o casal posta fotos contando o dia a dia, as idas à academia e as declarações de amor. “Nós dois temos a senha e, normalmente, postamos quando estamos juntos”, comenta Geyza.
Para o casal, essa é uma boa forma de interação entre si e com os amigos. “Acaba que sabemos quem nos segue e que as curtidas são para os dois”, diz o noivo. Eles garantem que não sentem falta da individualidade. “Eu brinco que, se estamos juntos até hoje, é porque temos essa conta. Ciúme não passa aqui”, fala Geyza. Para Junior, o ciúme e o monitoramento são coisas que podem ser evitadas no comportamento do dia a dia. “Nossas ações e a forma como lidamos com as coisas têm muita importância.”
CRISE DE INSEGURANÇA O ciúme entre casais não é algo necessariamente novo, mas a internet trouxe formas diferentes de experimentar o sentimento. A insegurança, para a psicóloga Lia Clerot, é a mãe do controle. “O parceiro que é inseguro acaba tendo sérios problemas de autoestima e isso, muitas vezes, precisa de ajuda profissional já que a pessoa, geralmente, não enxerga o próprio problema”, alerta. “Ao tentar atingir estereótipos muitas vezes inatingíveis que se vê nas redes sociais, as pessoas podem acabar tendo uma insatisfação crônica, por não ter a vida perfeita, o que, para o ciumento, pode desencadear em uma crise de insegurança e autoestima.”
Mario Louzã, psiquiatra e membro filiado do Instituto de Psicanálise da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, acredita que o acordo entre o casal é o ponto de partida para um relacionamento saudável. Se bem firmada na vida real, a combinação tende a se expandir com segurança no mundo virtual, segundo Louzã, mesmo com as tentações da internet.
Mas e o perfil de casal é uma alternativa à possessividade excessiva? Para Louzã, pode ser uma aliança, “que representa, ao mesmo tempo, o compromisso entre ambos e que também ‘avisa’ que tal pessoa está comprometida”. Já o psicólogo Vladimir Melo, especialista em terapia conjugal e familiar, não vê o perfil conjunto como uma forma efetiva de diminuir o ciúme. “Em primeiro lugar, isso demonstra a falta de confiança entre os dois. E reforça a ideia de controle de um sobre o outro, o que pode se tornar um problema maior na relação.”
Para o psicólogo, casais que aderem ao perfil duplo tendem a começar a exercer ainda mais controle sobre o(a) outro(a), o que pode ser um impeditivo para a individualidade. “Com isso, essa dinâmica acaba sufocando ambos os cônjuges e criando clima de desgaste.”
* Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte