Atividade física nunca é demais: deixe a preguiça de lado e comece a malhar

Fazer atividade física nunca é demais, mas o brasileiro, apesar do culto ao corpo, está longe de praticar o mínimo suficiente de exercício: 150 minutos semanais. As consequências são graves

por Lilian Monteiro 02/02/2017 21:00

Beto Novaes/EM
Fevereiro vem aí e para quem ainda não começou a se exercitar (foto: Beto Novaes/EM)
O corpo do ser humano é uma máquina feita para trabalhar. Não condiz com o sedentarismo. Se ela para, seguramente seu funcionamento será comprometido. Ou seja, sem praticar uma atividade física os riscos para a saúde e o bem-estar são bem altos. O exercício previne doenças, proporciona melhor condicionamento fisiológico e garante o controle e a redução do peso, medida contra a obesidade, enfermidade que só aumenta no Brasil e já é caso de saúde pública. O que espanta é que, apesar de todos terem consciência da necessidade de se mexer, de estar em movimento, a grande maioria não quer saber de transpirar. E a lista de desculpas não tem fim.

Esse comportamento é comprovado pela última Pesquisa Nacional de Saúde (SNS), de 2013, em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e com o Ministério da Educação, que revelou, entre outras informações, dados sobre o estilo de vida: consumo alimentar, uso de álcool, atividade física e tabagismo. Os números coletados são assustadores: na população brasileira com 18 anos ou mais de idade, 46% não praticavam qualquer atividade física ou de lazer, nem se deslocavam para o trabalho ou escola a pé ou de bicicleta e também não realizavam esforços físicos intensos no trabalho. Cerca de 42,3 milhões de adultos (28,9%) assistiam à televisão em excesso. Somente 22,5% dos adultos praticavam o nível recomendado de atividade física no lazer, ou seja, o mínimo suficiente de 150 minutos semanais. Sendo 27,1% dos homens e 18,4% das mulheres. E nada menos que 60,8% dos adolescentes foram classificados como insuficientemente ativos e 4,8% inativos.

Os números não mentem e o reflexo está no resultado revelado por estudiosos dos Estados Unidos, que apontam um dado estarrecedor: com a população cada vez mais sedentária, esta geração pode ser a de filhos que morrerão primeiro que os pais. O levantamento, com pesquisa, estudos de caso e os benefícios, é do relatório Designed to move, que envolve diversas organizações preocupadas em criar seres humanos mais ativos. “O mundo parou de se movimentar. Há apenas algumas gerações, a atividade física era parte integrante da vida diária. Atualmente, nós a eliminamos de forma tão profunda que a inatividade física parece ser normal. Os custos e as consequências sociais e econômicas são insustentáveis. Para garantir nossa qualidade de vida, o futuro de nossas crianças e nosso potencial humano, precisamos agir imediatamente.” O documento está disponível para pessoas, empresas, instituições e governos que dispõem de recursos para reverter essa situação. Com muitos coautores, o relatório é encabeçado pelo Colégio Americano de Medicina Esportiva (ACSM), Nike e Conselho Internacional de Ciências do Esporte e Educação Física (ICSSPE).

Arquivo Pessoal
Professor de educação física, Marcio Atalla diz que o brasileiro deixou de gastar 350 calorias por dia (foto: Arquivo Pessoal)
Marcio Atalla, professor de educação física com especialização em treinamento de alto rendimento e pós-graduação em nutrição pela Universidade de São Paulo (USP), explica que o alerta observado no Designed to move tem alguma verdade, já que depois de 25 anos, pela primeira vez, diminuiu a expectativa de vida nos EUA. “Hoje, sabemos que não é que o exercício faça bem, o sedentarismo é que faz muito mal na evolução da espécie. O homem foi criado para funcionar com movimento. Não há pressão arterial, glicose e hormônios em equilíbrio se não tiver movimento.”

Além de Marcio Atalla, referência no Brasil na luta pela prática de uma atividade física, o Bem Viver ouviu outros profissionais e especialistas (médico, educador físico, nutróloga e nutricionista) a respeito do alto risco do sedentarismo e conta a história dos irmãos Pedro Lucas e Flávio Augusto Diniz Pereira, que encontraram na corrida a motivação para cuidar da saúde e ter qualidade de vida. Hipertensos, sem levar a movimentação a sério, descobriram com o empurrão da irmã Bruna o prazer de se mexer.

“Premissa básica: pessoas que estão inativas ou sedentárias devem iniciar os treinamentos após uma avaliação médica de um profissional com experiência na área do exercício e do esporte. Hoje, sabemos que o exercício físico mal orientado pode comprometer a sua manutenção, levando a lesões osteomusculares precoces e a um maior risco de eventos cardiovasculares. Sendo assim, todo recomeço, após um longo período de inatividade, deve ser feito de maneira gradativa, sempre respeitando os limites do corpo”, alerta o cardiologista e médico do esporte Marconi Gomes da Silva, diretor da Sociedade Mineira de Medicina do Exercício e do Esporte. Ele lembra ainda que a opção por ser fisicamente ativo passa pela regularidade semanal da prática de exercícios físicos. “Sem essa constância, o corpo não é capaz de promover adaptações favoráveis que repercutirão em uma melhor qualidade de vida e alterações do ponto de vista cardiológico e metabólico que promovam uma melhor expectativa de vida.”

 
Corrida inspiradora 

 

Jair Amaral/EM
Flávio Augusto, de 37 anos, conseguiu perder 10 quilos em 12 meses com a corrida. Ele incentivou o irmão Pedro Lucas, de 26 anos a começar a correr (foto: Jair Amaral/EM)

Com 50 anos, o médico oncologista, cientista e escritor Drauzio Varella, hoje com 73, começou a correr maratonas: 42 quilômetros. Ele já revelou que sobe os 16 andares do seu prédio duas vezes por semana. Vai pelas escadas e desce de elevador fazendo alongamento. E faz isso de oito a 10 vezes. Assegura ser um ótimo treino para a corrida. Ele também já declarou não ter paciência para as ladainhas e desculpas que seus pacientes enumeram para fugir da atividade física: trabalho, filhos, mãe doente. Ou seja, se Drauzio, com a rotina de vida intensa dele consegue, não é possível você seguir como sedentário se não tem nenhuma contraindicação. O importante é descobrir a atividade física que lhe dá prazer e o faça se sentir bem. De resto, terá todos os benefícios para ter saúde com qualidade de vida. Drauzio lançou em 2015 o livro Correr – O exercício, a cidade e o desafio da maratona pela Companhia das Letras.

Essa foi a descoberta dos irmãos empresários Pedro Lucas, de 26 anos, e Flávio Augusto Diniz Pereira, de 37. Pedro revela que sempre foi sedentário, e não dá nem para contar o esporte praticado na escola. O que era muito pouco. Ainda que a vida tenha lhe pregado surpresas. “Fui pai cedo, aos 17 anos, só trabalhava, estudava e ficava no computador. Sem falar que desde essa idade passei a tomar remédio para hipertensão. Não sentia falta do exercício. Nem mesmo pela estética, já que nunca fui gordo, nada me incomodava.”

Pedro não se mexia. Até que, incentivado pelo irmão, descobriu a corrida. “O Flávio correu uma prova que nossa irmã, Bruna, o inscreveu sem ele saber e gostou muito. Então, me chamou para acompanhá-lo e passamos a praticar juntos. No começo, eram três vezes por semana, depois cheguei a cinco quilômetros, 10 e passei até a participar das provas de rua, com direito a medalha e tudo”, conta.

Pedro reconhece que não foi tão simples. “Achei legal, mas tive complicações porque a corrida tem muito impacto. Como era totalmente inativo, sofri várias lesões. Sorte que minha mulher, Stephanie, é fisioterapeuta e cuidou de mim. E o melhor é que ela, que não praticava nada, também decidiu correr diante do meu entusiasmo. Claro, ela corre menos quilômetros, mas cada um no seu ritmo. No começo, não sabia dosar direito, vivia em ortopedista, mas com a regularidade o corpo se acostumou.”

Ele assegura que tudo melhorou. “A vida transformou. A saúde melhorou, mudei a alimentação para ir melhor nas corridas, a disposição no dia a dia é outra. E, o que mais me incomodava, que era minha ansiedade, foi controlado. Ela só aparece agora quando não consigo correr. Sigo meus treinos rigorosamente, pela manhã, antes de ir trabalhar e estudar (administrador, ela faz pós-graduação em liderança estratégica). E é importante quando a família muda junto, um incentiva o outro, e foi o que aconteceu comigo”, diz.

E o gosto pela atividade física conquistou Pedro, que agora ainda faz pilates voltado para a corrida, com alongamento e reforço muscular. “Dos sete dias da semana, em seis faço exercício. Antes era ficar parado em frente ao computador. A corrida mudou minha vida pessoal, o esporte aproximou a família, minha filha, Ana Júlia, faz natação, o dia parece render, mesmo tendo mais o que fazer, melhora tudo. Tem um ano que comecei a correr e gostei tanto que, agora, pretendo fazer parte de uma equipe, a Endorfina, com acompanhamento mais profissional.” O segredo, revela Pedro, é achar o que gosta de fazer, seja corrida, natação, bike ou jogar bola.

PARCERIA 

Jair Amaral/EM
Os irmãos Flávio Augusto e Pedro Lucas, de sedentários a corredores. Os dois são hipertensos e encontraram no exercício a motivação para cuidar da saúde (foto: Jair Amaral/EM)
 

 

Ao contrário de Pedro, Flávio não era sedentário, mas confessa que “sempre jogou futebol, fez academia, mas nunca foi regular, não tinha o compromisso ou sequência. “Ao abraçar a corrida, em 2016, comecei o ano com 96kg e terminei com 86kg, basicamente em função da atividade física com uma dieta equilibrada durante a semana, já que não abro mão da minha vida social ativa nos fins de semana. Aí relaxo. Mas foram 10kg em 12 meses.”


Flávio conta que, antes de correr, ele e Pedro chegaram a ter aulas de tênis, mas como não gostaram tanto, não continuaram. Também hipertenso, Flávio diz que hoje em dia Pedro o superou. “Treinamos juntos todo sábado e durante a semana cada um monta o treino dentro da sua rotina. O Pedro tem muito potencial para maratona e acredito que chegará lá, hoje ele nem me espera, é mais rápido. E tem mais ambição e onde evoluir. Se ele faz cinco quilômetros em 28 minutos, eu consigo em 32 e minha meta é chegar aos 30 minutos. Objetivo que não alcancei no ano passado e é a meta de 2017.”

A corrida passou a ser tão importante na vida dos irmãos que Flávio conta que “já tínhamos uma parceria profissional e, agora, também de qualidade de vida. Praticar esporte nos aproximou ainda mais, até melhorou o estresse no trabalho. Durmo melhor, corro melhor, trabalho mais e encontrei a disciplina. Agora sou frequente”.

 

E tudo começou, lembra Flávio, ao fingir que estava correndo para a família. Pouco tempo depois, a irmã Bruna o inscreveu numa corrida como presente de aniversário. Para não fazer feio, ele aceitou e só tem a agradecer. “Fiz uma selfie, enviei para o grupo da família com a legenda '5km de leve', brinquei. Mas só estava caminhando.” Hoje, Flávio conta que a mulher, Juliana, também correu por um tempo (agora, ela faz pilates e caminhada) e o filho, Diogo, pratica natação e futebol. “Esportes fazem bem à saúde e à vida, a pressão está controlada, sinto-me bem, continuo com meu estilo social e, como meu cardiologista, Marconi Gomes, me falou uma vez: 'Flávio, a diferença entre remédio e veneno é a dose', por isso não abro mão da minha cerveja, moderadamente.”