“A estrutura do esmalte dentário humano é extremamente complexa e, ao mesmo tempo, sabemos que íons de magnésio, carbonato e fluoreto influenciam nas propriedades dele. Os cientistas nunca conseguiram capturar a estrutura do esmalte em uma resolução alta o suficiente ou definição”, conta Julie Cairney, professora da Faculdade de Engenharia e Tecnologias de Informação da Universidade de Sydney e participante da pesquisa.
Segundo a equipe, o esmalte é constituído por hastes de minerais cristalinos que se entrelaçam. Os espaços entre essas hastes são embalados por fosfato de cálcio amorfo (ACP), um composto orgânico vítreo presente desde a formação do tecido dentário, quando íons inorgânicos incorporam em sua estrutura, processo chamado de mineralização.
A equipe cortou um molar humano e usou laser para fotografar a composição atômica do dente, uma espécie de tomografia em nanoescala. Com a técnica avançada, identificaram cerca de 400 milhões de átomos na camada do esmalte e observaram a forma como eles estavam distribuídos. Descobriu-se, por exemplo, que as regiões com ACP são ricas em íons de magnésio, o que, segundo os autores, indica a importância desse elemento no processo de mineralização e na formação do esmalte.
“O que temos encontrado são as regiões ricas em magnésio entre os nanobastões que compõem o esmalte. Isso significa que temos a primeira evidência direta da existência de uma fase rica em magnésio amorfo (sem forma definida) rica em cálcio que desempenha um papel essencial para regular o comportamento dos dentes”, detalhou Cairney. O trabalho resultou em um inédito mapa tridimensional das posições de átomos no dente, incluindo aqueles ligados à cárie.
Distribuição desigual
Alexandre La Fontaine, coautor do estudo e professor do Centro de Microscopia e Microanálise da universidade australiana, conta que eles também detectaram, em uma análise de nanoescala, aglomerados de material orgânico no esmalte do molar.
Segundo ele, essa característica indica que proteínas e peptídeos são distribuídos de forma heterogênea no tecido, e não em toda a interface do esmalte, como se imaginava anteriormente.
A descoberta também pode ser um alvo para a prevenção e o tratamento de cáries. “Propomos que a decomposição ocorre através de dissolução ao longo dos limites da haste do esmalte. Esses resultados podem ser utilizados para melhorar os modelos das propriedades mecânicas e de desgaste desse tecido”, ressaltaram os autores, no artigo divulgado.
Problema mundial
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, em todo o planeta, de 60% a 90% das crianças em idade escolar têm cárie. A doença periodontal, principal causa da perda de dentes, é encontrada em 15% a 20% dos adultos de meia-idade, com 35 a 44 anos. Vai avançando com o passar do tempo e faz com que 30% dos indivíduos com 65 a 74 anos não tenham mais dentes naturais. Os números são piores em grupos populacionais mais pobres e desfavorecidos.
No Brasil, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde Bucal, em 2010, quando a sondagem foi divulgada, 44% das crianças aos 12 anos não tinham cáries — em 2003, a taxa era de 32%. Nos adultos, no mesmo período, diminuiu em 45% o número de dentes perdidos pela doença crônica e aumentou em 70% o número de dentes tratados..