O desenvolvimento de eletrônicos comestíveis vem desafiando muitos pesquisadores, mas a equipe norte-americana resolveu diferenciar o trabalho apostando em um aparelho que fosse completamente seguro. Segundo a equipe, câmeras e outros dispositivos implantáveis, como marca-passos, têm componentes tóxicos que podem prejudicar o corpo. Já aparelhos de baixo consumo de energia, como baterias, podem ser uma opção viável.
“Estamos nos concentrando na utilização de materiais biologicamente derivados e estruturas que possam substituir materiais tradicionais para a bateria. Apenas a partir daí, expandiremos a aplicação desses dispositivos e tentaremos usá-los para intervenções terapêuticas”, contou ao Correio Christopher Bettinger, um dos criadores do dispositivo e pesquisador da Carnegie Mellon University. No protótipo, usaram óxido de manganês, fosfato de titânio de sódio, cobre e ferro para a produção de eletrodos negativos e positivos — mecanismos necessários para o funcionamento do aparelho eletrônico.
Também na produção da cápsula, a equipe recorreu à tecnologia de impressão 3D.
Outra vantagem do dispositivo é que ele dura o tempo necessário para que execute suas funções. “A beleza é que, por definição, um dispositivo ingerível e degradável no corpo não dura mais que 20 horas, que é tudo de que você precisa”, frisou Bettinger. A intenção é que, ao avançar a pesquisa, seja possível dosar a quantidade de medicamentos e diversificar o tipo de diagnóstico.“Estamos interessados principalmente em aplicações de libertação controlada para que possam atingir praticamente qualquer tipo de proteína, seja de forma lenta, seja de forma rápida. Mas pode haver outras aplicações na detecção e na amostragem do microbioma, por exemplo”, detalhou o autor.
Segurança
Para Flávio Ejima, gastroenterologista do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, e presidente da Sociedade Brasileira de Endoscopia, a tecnologia apresentada promete executar funções que seriam de grande ganho na área médica. “Temos cápsulas na endoscopia. As que usamos captam imagens por meio de câmeras, mas, infelizmente, não conseguimos controlar o movimento delas”, disse. O risco de ficarem paradas no tubo digestivo preocupa, complementa o médico. “Caso tenhamos a opção apresentada por esses pesquisadores, de uma tecnologia feita com um material biológico que execute as mesmas funções e consegue se decompor, será um grande ganho”, avaliou.
Ejima também destaca que a cápsula de melanina proposta pelos cientistas norte-americanos é um protótipo, mas aponta o uso para aplicação de remédios como um bom começo. “Não sei até que ponto esse trabalho evoluirá e se será possível acoplar câmeras e lentes que se degradem. Mas a opção de soltar dosagens de quimioterápicos é muito interessante e, talvez, algo mais factível”, disse.
A capacidade elétrica do dispositivo, porém, ainda é baixa, reconhecem os criadores.