Especialista afirma que conversa sobre sexo com as crianças ajuda a fortalecer vínculos e não deve ser 'terceirizada'

Assunto complexo e cercado de tabus fica mais fácil de ser abordado pelos pais de forma mais realista com o auxílio de livro escrito especialmente para crianças e adolescentes

por Zulmira Furbino 26/01/2016 09:30
Juarez Rodrigues/EM/D.A Press
Cida Lopes, sexóloga, educadora sexual e escritora (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
Com uma filha de 6 anos e outra de 3, um pai começava a se preparar para enfrentar perguntas difíceis, ligadas à sexualidade, que, acreditava, viriam de sua primeira menina. Para sua surpresa, no entanto, quem o enquadrou foi a caçula: “Papai, como é que a gente nasce?”. Sem saber o que dizer, ele respondeu que aquela era uma história muito comprida e que levaria tanto tempo para contá-la que era melhor deixar pra lá. A menininha concordou e saiu. O pai já estava aliviado, dando graças a Deus por haver escapado da armadilha, quando a baixinha voltou trazendo nas mãos uma cadeirinha e se sentou em frente a ele: “Pronto, papai, pode começar”.

Quem conta o caso, verídico, sem revelar nomes, é a sexóloga e educadora sexual Cida Lopes, que trabalha com o tema sexualidade há 25 anos e lançou, no ano passado, o livro Soltando os grilos – sexo e sexualidade. “Quando o assunto é sexualidade, temos muitas perguntas e poucas respostas, principalmente quando ainda não somos considerados 'gente grande'”, escreve na orelha da obra. O livro, dirigido às crianças, também deve ser lido pelos pais, diz a autora. O objetivo é servir de apoio e criar um laço familiar. A ideia é que o assunto, complexo e cercado de tabus, possa ser abordado de forma mais realista a partir do diálogo entre pais e filhos. A educadora sexual acredita que seja preciso abrir terreno para uma abordagem mais positiva e adequada para cada faixa etária da criança, evitando “terceirizar” esse tipo de informação.

“Em minhas palestras, digo sempre que, quando a criança pergunta sobre sexualidade, mais do que conseguir a informação, o que ela pretende é criar um vínculo com os pais, que, muitas vezes, não sabem responder da maneira mais adequada e optam por desqualificar a curiosidade dos filhos, inventar histórias ou adiar a conversa”, afirma. Ela lembra que, normalmente, os pais respondem a quase todas as perguntas das crianças, mas, no que se refere ao sexo, acabam desvalorizando as dúvidas, protelando a resposta ou respondendo com outra pergunta. “Mais tarde, na adolescência, os pais é que vão querer conversar, mas aí não adianta mais”, observa.

AMOR
No fim das contas, que tipo de dúvidas as crianças costumam ter sobre esse assunto? “Hoje, por causa da supervalorização do sexo em nossa sociedade, elas estão muito voltadas para o erotismo, a relação sexual, o orgasmo e o uso de facilitadores de ereção”, revela a especialista. São questões que antes não existiam, mas que, se não forem respondidas, podem criar um punhado de dúvidas e fantasias irreais em crianças que estão sendo muito estimuladas quando o tema é sexo.

Quando a conversa gira em torno de menstruação e puberdade, fica fácil responder. Mas falar sobre relações sexuais com uma criança de 10 anos, por exemplo, é outra história, já que, quanto mais perguntas eles têm, menor o número de respostas, aponta a educadora. Ela sustenta que as perguntas clássicas continuam sendo feitas, por isso é preciso responder de forma que a criança construa um sentido adequado de sexualidade, sem supervalorizá-la. Outra coisa importante a ser trabalhada pelos pais é o conceito de sexualidade, evitando apresentá-la como algo negativo e errado.

Divulgação
(foto: Divulgação )
Cida Lopes costuma questionar os pais se, na hora de discutir e brigar na frente dos rebentos, eles têm os mesmos cuidados tomados quando se trata de falar de sexo. “Precisamos pensar que a sexualidade existe para dar prazer e demonstrar amor. Não faz sentido ter cuidado para transmitir isso e não demonstrar a mesma preocupação no momento de discórdia entre o casal na frente dos filhos”, sustenta. Para ela, brigas e agressões entre o casal deixam as crianças vulneráveis e o mesmo ocorre quando não existe diálogo sobre sexualidade entre pais e filhos. “Isso ocorre pela forma como fomos educados. Precisamos começar a pensar e tentar mudar essa postura”, explica.

Soltando os grilos – sexo e sexualidade
• De: Cida Lopes
• Sinopsys Editora
• 144 páginas
• R$ 65
•Venda pelo site www.cidalopes.com.br