O estudo surgiu com base em uma pesquisa de outro grupo de cientistas mostrando como o córtex pré-frontal estava ligado à busca compulsiva por cocaína. Estudiosos da Itália resolveram, então, buscar uma alternativa que pudesse modificar a ação dessa área cerebral em dependentes em cocaína. “A EMTr estimula uma região do cérebro que está envolvida no controle inibitório de comportamentos compulsivos, como o uso de cocaína. Estimulando essa área, os impulsos magnéticos estão ajudando o cérebro a controlar essa compulsão. Portanto, a terapia ajuda o paciente a se abster da droga”, detalhou ao Correio Lorenzo Leggio, um dos autores do estudo e pesquisador do Instituto Nacional de Abuso do Álcool e Alcoolismo, na Itália.
O teste com a técnica foi feito com 32 pacientes que buscaram ajuda em hospitais do país para se livrar do vício em cocaína. Metade deles recebeu os pulsos magnéticos e a outra parcela, medicamentos tradicionais
Se os resultados positivos se repetirem nos próximos experimentos, acreditam os autores, a técnica poderá ser incorporada a tratamentos de desintoxicação. “É importante ressaltar que, no momento, não existem medicamentos aprovados para transtorno do uso de cocaína, portanto, a EMTr poderia representar o primeiro tratamento biológico nesse sentido”, destaca Leggio. “Nossa etapa seguinte será realizar um ensaio maior, em que a EMTr será comparada a um placebo, de modo duplo-cego (sem que os pesquisadores e os voluntários saibam o que é ingerido durante os testes). Esse ensaio também precisará ter um seguimento mais longo”, completa.
Otimismo
Vanessa Teixeira Muller, neurologista e diretora médica da VTM Neurodiagnóstico, no Rio de Janeiro, destaca que o estudo italiano mostra dados importantes e bastante otimistas relacionados aos pulsos magnéticos. O que mais chamou a atenção da especialista foi a comparação da EMTr com os medicamentos geralmente prescritos. “Isso é um grande ganho, pois a técnica pode trazer mais efetividade com menos efeitos colaterais. A questão da segurança é essencial quando buscamos novos tratamentos médicos”, justifica.
Muller destaca ainda que o uso dos impulsos se baseia em uma teoria conhecida na área neurológica. Ela explica que a região do córtex pré-frontal dorso lateral, principalmente o esquerdo, é importante nas tomadas de decisão, pois nos permite mudar de comportamento de acordo com a necessidade. “Outros trabalhos apontam que o efeito da droga se dá nessa região
A especialista explica que os pulsos e a intensidade usados nos dependentes químicos dependem de uma avaliação individualizada. Geralmente, no caso da cocaína, aplica-se com baixa frequência. “No caso da depressão, por exemplo, você precisa aumentar a atividade nessa mesma região. São diferentes protocolos com padrões distintos”, compara Muller.
Fim do estigma
“É um estudo muito interessante, apesar de ser piloto e não seguir padrões de acompanhamento mais rígidos, como o perfil de cada dependente químico tratado. Ainda assim, mostra dados importantes. Uma das maiores vantagens, com certeza, é poupar o organismo dos efeitos colaterais. Estudos nessa área, além de trazerem novos tratamentos mais eficientes, ajudam a mudar o estigma da doença, reforçando que a dependência não é um problema de caráter e está ligada a bases neurológicas. Essa ideia errada pode dificultar a vida das pessoas que buscam ajuda para se livrar do vício.”
Helena Moura, psiquiatra especialista em dependência química e colaboradora do Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul