Saúde

Saúde da mulher: As cirurgias ginecológicas ainda exigem procedimentos invasivos?

O que antes causava muito medo e apreensão, fazendo a mulher adiar procedimentos importantes, hoje é feito de forma minimamente invasiva e com recuperação muito mais rápida

Letícia Orlandi

"Incomodada ficava sua avó". Essa frase, conhecida de antigos comerciais de absorventes femininos, aplica-se à evolução das cirurgias ginecológicas. De acordo com ginecologista Délzio Bicalho, diretor da Sogimig, o que antes causava muito medo e apreensão, fazendo com que a mulher adiasse procedimentos importantes, hoje é feito de forma minimamente invasiva e com recuperação muito mais rápida. “A utilização da laparoscopia foi ampliada de tal forma que há o mínimo de trauma tecidual para a mulher. Sem a necessidade de abrir o abdômen, a dor é menor e a recuperação muito mais tranquila. Além disso, a possibilidade de manter a capacidade reprodutiva da paciente após o procedimento se tornou muito maior”, explica o médico.


Délzio Bicalho: com exceção da cesariana, claro, qualquer cirurgia ginecológica hoje pode ser feita de forma minimamente invasiva
Com exceção da cesariana, brinca o médico, qualquer cirurgia ginecológica hoje pode ser feita via laparoscopia, inclusive para tratamento da endometriose e do prolapso genital (queda da bexiga e do intestino). Antes feitas de forma invasiva, hoje essas intervenções preservam o máximo dos nervos da área afetada, permitindo que a micção (controle urinário) e as funções sexuais sigam normalmente. “É a técnica que chamamos de ‘nerve-sparing surgery’, ou seja, uma cirurgia que poupa as terminações nervosas e permitem uma ótima preservação do assoalho pélvico, o que garante a qualidade de vida em muitos sentidos para a mulher, da higiene à sexualidade plena”, resume.

Um outro ganho para as cirurgias ginecológicas foi a histeroscopia. Um pequeno telescópio é introduzido, via vaginal, no útero, e permite realizar, sem necessidade de pontos e cortes - e muito menos de retirada do órgão – a eliminação de miomas, por exemplo. E com a demanda de apenas um dia de internação. “Com essas técnicas, podemos evitar que o medo da cirurgia faça com que mulheres convivam por longos períodos com problemas que têm solução, a exemplo do prolapso genital”, aponta Bicalho.

Em relação aos vários tipos de câncer que atingem o aparelho reprodutor feminino, um grande avanço recente foi o uso da técnica conhecida como linfonodo sentinela, que já é utilizada no tratamento do câncer de mama. O linfonodo sentinela é aquele que primeiro recebe a drenagem linfática de um tumor. Por meio de um aparelho chamado Gama Probe, que é composto de uma sonda de detecção e de sistema de registro digital da radiação gama, é injetado um radiofármaco ou um corante especial que localiza esse linfonodo ‘vigilante’.

Assim, é possível identificar e realizar a análise do tumor antes que ele se espalhe por meio do sistema linfático. “Em tempos em que a disseminação do HPV caracteriza uma epidemia e faz crescer o número de casos de câncer de colo de útero, inclusive em meninas de 16 a 18 anos, essa técnica pode ser muito importante. Nos casos em que a lesão for benigna, é possível preservar o útero, ovários e trompas. Protegendo, portanto, a capacidade reprodutiva”, salienta o diretor da Sogimig.

De acordo com Délzio Bicalho, a técnica do linfonodo sentinela já demonstrou bons resultados. Cerca de 50% das pacientes que passaram pelo procedimento tiveram sucesso na tentativa de engravidar posteriormente. Destas, 70% não tiveram outros problemas ao longo da gestação e levaram o bebê para casa. A evolução mais recente dessa técnica foi apresentada nesta quinta-feira, durante o evento na capital mineira, no curso de Oncologia Ginecológica, ministrado pela estadunidense Shannon Westin, professora assistente do MD Anderson Cancer Center, um dos principais centros de oncologia do mundo.


Procedimentos que antes exigiam longos períodos de internação hoje já permitem que a mulher volte para casa no dia seguinte, com o mínimo de desconforto. A ligadura de trompas, por exemplo, já pode ser feita no consultório médico, sem anestesia geral
Simplicidade e internação reduzida
Já na direção dos procedimentos para quem não deseja mais ter filhos, a novidade é o dispositivo Essure, que permite realizar a ligadura de trompas no consultório médico, por meio da histeroscopia. Elimina-se a necessidade de internação e anestesia geral. “O método está chegando ao Brasil agora e já é utilizado na rede pública no Distrito Federal e no Rio Grande do Sul. Seguro e com riscos muito reduzidos em relação ao procedimento tradicional, acreditamos que em breve será mais disseminado no país”, explica.

Completando a lista de inovações que pretendem dar mais segurança e tranquilidade para a mulher que necessita passar por uma cirurgia ginecológica, o Congresso trouxe também o Programa de Recuperação Melhorada da clínica norte-americana Mayo. “Até recentemente, era comum que a paciente precisasse fazer longos períodos de jejum, passar por lavagens intestinais e vários dias com uma sonda para auxiliar na eliminação de urina. O conceito agora é de agredir o mínimo possível e fazer com que a mulher retorne para o conforto da sua casa, cama e banheiro muito mais rápido”. Resume Bicalho.

O programa é feito por meio do uso de bebidas calóricas e nutricionais, técnicas minimamente invasivas (sempre que possível) e a atuação de uma equipe que inclui, além do cirurgião, do anestesista e dos enfermeiros, o fisioterapeuta, o nutricionista e outros profissionais de saúde ligados ao bem-estar. O período de jejum é menor, o uso da sonda é feito apenas por algumas horas e há menos necessidade de analgésicos, mesmo em grandes cirurgias. “Uma recuperação rápida significa mais qualidade de vida”, conclui o especialista.