Saúde

Vitamina A forma sistema de defesa de fetos

Pesquisadores descobriram que a falta dela compromete a eliminação de vírus, bactérias ou resíduos celulares prejudiciais ao organismo

Isabela de Oliveira

Manuela e José Henrique: descoberta inédita sobre a ação da vitamina A
A palavra vitamina vem do latim vita. Uma interpretação literal do termo sustenta que é impossível sobreviver sem esses compostos orgânicos. Estudo publicado na revista Nature ontem indica que uma dessas substâncias essenciais, a vitamina A, é determinante para a saúde durante a vida infantil e adulta, porque forma o sistema imunológico. Até então, acreditava-se que as defesas naturais do organismo eram resultado de programação independente, natural e inerente ao desenvolvimento fetal. Mas os pesquisadores da Faculdade de Medicina de Lisboa e do Centro Médico da VU University, na Holanda, demonstraram o contrário. Segundo eles, a vitamina A desencadeia a formação dos órgãos linfoides secundários. A falta dela gera estruturas mais frágeis e menores, o que compromete a filtragem da linfa e, com isso, a eliminação de vírus, bactérias ou resíduos celulares prejudiciais ao organismo.


Segundo José Henrique Veiga Fernandes, pesquisador sênior do trabalho, a formação do sistema imunitário no feto está muito dependente de fatores ambientais. “Nosso trabalho vem estabelecer, pela primeira vez, uma ligação estreita entre os hábitos alimentares da mãe, a qualidade do sistema imunitário dos filhos e a forma como eles resistem às infecções.” Fernandes explica que a quantidade de vitamina A repassada da mãe ao filho é necessária para que os nódulos linfáticos se desenvolvam em tamanho normal, o que possibilitará respostas imunes capazes de conter infecções tanto na infância quanto na vida adulta.

A vitamina também participa do desenvolvimento embrionário, da reprodução, do metabolismo ósseo, do equilíbrio da pele e da visão. “A deficiência desse composto não causa apenas deficiências físicas, mas também compromete a eficácia das campanhas de vacinação infantil nas regiões mais pobres, particularmente na África e no sul Asiático”, acrescenta. Alexandre Pupo Nogueira, ginecologista e obstetra do Hospital Sírio-Libanês de São Paulo, observa que essa, felizmente, não é uma realidade brasileira. “A alimentação habitual aqui é rica em alimentos com vitamina A. Além disso, os bebês recebem as gotinhas de vitaminas pouco depois de nascerem.”

Irreversível

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As evidências sobre a participação da vitamina A na formação dos linfonodos foram levantadas em experimentos com ratinhas grávidas. As que foram submetidas a uma dieta sem o nutriente geraram filhotes com linfonodos menores, ao passo que os filhotes que receberam a substância em excesso ainda no útero nasceram com órgãos maiores. Modelos de cobaias geneticamente modificadas para não sintetizar a vitamina mostraram que os efeitos da deficiência nas células linfoides é irreversível. Os filhotes dessas roedoras não conseguiram desenvolver perfeitamente o sistema imunológico após o nascimento, nem mesmo com suplementação vitamínica.

O próximo passo da pesquisa de Fernandes é investigar como as estruturas imunitárias interagem com os fatores ambientais. Ele cogita que esse sistema tem “poderes sensoriais” complexos em relação ao mundo exterior. Isto é, quando o micro-organismo nocivo ainda não invadiu o corpo. “Testar essa hipótese é um dos nossos grandes desafios para o futuro”, avalia. Nogueira pondera que são necessários mais estudos, inclusive em humanos, para que os resultados possam influenciar a prática médica. “O escopo é mais o conhecimento a respeito do sistema imunológico e o desenvolvimento dele. Não podemos receitar reposição de vitaminas para as grávidas com medo das crianças nascerem deficientes”, analisa o obstetra, que conta, na pesquisa, com a ajuda da cientista Manuela Ferreira.

Reforço
O Programa Nacional de Suplementação de Vitamina A, do Ministério da Saúde, prevê que, dos 6 aos 59 meses, todas as crianças que residam em área de risco da deficiência desse nutriente recebam doses da substância de seis em seis meses. Não há contraindicações para a suplementação.