Saúde

Inédita em outros países, vacina contra dengue é testada em Belo Horizonte

A fórmula utiliza o mesmo componente viral que resultou na erradicação da varíola e apresentou 100% de eficácia no teste feito em camundongos

Alessandra Alves

A fórmula utiliza o vírus da vacina contra a varíola e um pedaço de DNA do vírus da dengue

Pesquisadores do Departamento de Microbiologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) tentam, desde 2006, encontrar a fórmula para uma vacina capaz de combater o vírus da dengue. Desde o ano passado, esse objetivo ficou mais próximo de ser alcançado. Em dezembro de 2013, foram feitos os primeiros testes em camundongos e os resultados se mostraram promissores. No final de fevereiro deste ano, os testes foram repetidos para garantir a eficácia da vacina. Se a resposta for a mesma, a próxima etapa será realizada em macacos. Daí em diante, caso a vacina seja aprovada, o Brasil será o primeiro país a apresentar uma solução preventiva contra a doença que, em 2013, registrou mais de 1,4 milhão de casos no país. A Região Sudeste foi responsável por 63,4% das notificações, o que corresponde a 936.500 pessoas infectadas.


"Esta é uma corrida mundial, que mobiliza pesquisadores do mundo todo há cerca de 30 anos", afirma o coordenador da pesquisa, Flávio Fonseca
Segundo o coordenador da pesquisa na UFMG, Flávio Guimarães da Fonseca, a descoberta pode ser uma grande conquista. “Esta é uma corrida mundial, que mobiliza pesquisadores do mundo todo há cerca de 30 anos”, explica. No ano passado, uma vacina chegou a ser testada em seres humanos, na Tailândia, mas não obteve sucesso. No Brasil, outras outras instituições realizam pesquisas, como o Instituto Butantan e o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz, mas somente o trabalho realizado em Belo Horizonte tem investimento 100% público. "As chances de ser um produto mais adequado às necessidades brasileiras são maiores, além de os custos serem reduzidos”, explica o pesquisador.

A fórmula da vacina utiliza o mesmo componente viral que resultou na erradicação da varíola. “É o vírus da fórmula utilizada contra a varíola combinado com um pedaço de DNA do vírus da dengue”, explica Fonseca. “A vacina contra a varíola já foi testada antigamente, funciona e é segura”, completa. A combinação é, então, injetada na célula do camundongo, cujo sistema imune reconhece a proteína e passa a produzir células de defesa, impedindo a infecção. Como as cobaias não desenvolvem a doença, foi preciso usar uma estratégia alternativa.

“No lugar da dengue, camundongos desenvolveram uma encefalite”, explica o pesquisador. O mal, no entanto, não foi constatado nos animais vacinados. Com a fórmula injetada e o desafio lançado, teve início uma fase de observação. Após esse período, os resultados demonstraram que no grupo de camundongos contaminados e vacinados, houve 100% de taxa de sobrevivência, enquanto o grupo contaminado que não recebeu a vacina teve 15% de taxa de sobrevivência, ou seja, 85% deles morreram ou ficaram doentes.

Com os novos testes realizados no final de fevereiro, a expectativa é de que os resultados se repitam. Neste momento, os animais já foram vacinados e seguem em observação. Caso o resultado seja positivo, novas etapas deverão ser cumpridas, a começar pelos testes nos outros três sorotipos da doença. Até agora, apenas o sorotipo três da dengue foi avaliado. Faltam os sorotipos 1, 2 e 4. Um estágio, no entanto, bem mais simples. “Esta parte será mais rápida, porque temos a vantagem de poder usar a mesma estratégia”, afirma Fonseca.

Tempo de espera
Antes dos testes em humanos, a vacina ainda será testada em macacos. “Pretendemos fazer isso dentro de um a dois anos, mas existem somente dois centros de testes em primatas no Brasil, então será necessário solicitar autorização junto à Fiocruz ou ao CNPq e aguardar. São testes bastante caros”, pondera Fonseca.

Para o pesquisador, se tudo der certo, a vacina deve chegar ao mercado em 2021 ou 2022, já que os testes em seres humanos precisam passar, obrigatoriamente, por cinco anos de estudos. Enquanto isso, a melhor forma de evitar a doença continua sendo o combate aos focos do mosquito.