Saúde

Chocolate com morango contra o diabetes

A combinação é rica em flavonoides, um composto ligado à coloração de frutas e vegetais e capaz de reduzir os níveis de glicose no sangue. Especialistas acreditam que a substância pode conter outras doenças crônicas, como o câncer

Paloma Oliveto

Com doçura, é possível prevenir o diabetes 2. Pesquisadores ingleses encontraram no chocolate substâncias naturais que regulam a quantidade de açúcar no sangue — um desequilíbrio nesse processo caracteriza a doença crônica que, só no Brasil, afeta mais de 12 milhões de pessoas. Muitos outros alimentos têm essa capacidade, indica o estudo publicado no Journal of Nutrition. O segredo está nos flavonoides, moléculas que conferem cor a frutas e vegetais e são ingeridas quando se consomem delícias como cacau, morango, vinho e frutas vermelhas.


Desde a década de 1930, quando o fisiologista e Nobel da medicina Albert Szent-Gyorgyi descobriu esses compostos, já se constatou inúmeros benefícios dos mais de 6 mil flavonoides existentes nos alimentos. Eles fazem bem ao coração, previnem Parkinson, lutam contra o câncer, combatem a obesidade, reduzem o estresse e a ansiedade, entre outros. Isso tudo graças aos poderes antioxidantes, que evitam inflamações e danos celulares provocados pelos radicais livres.

O segredo está nos flavonoides, moléculas que conferem cor a frutas e vegetais e são ingeridas quando se consomem delícias como cacau, morango, vinho e frutas vermelhas
 De acordo com Aedin Cassidy, pesquisadora da Universidade de East Anglia e principal autora do artigo, há tempos desconfiava-se que alguns tipos de flavonoides poderiam também evitar a resistência à insulina — a propriedade benéfica já havia sido, inclusive, constatada em tubos de ensaio. Agora, um estudo de larga escala realizado na Inglaterra confirmou a tese. A pesquisa incluiu dados de 2 mil mulheres, com idade entre 18 e 76 anos e voluntárias do projeto TwinsUK Registry, que reúne informações sobre saúde de gêmeos para investigações a respeito de doenças crônicas e genéticas.

As participantes completaram um questionário de 131 itens, fornecendo informações detalhadas sobre os hábitos alimentares. A partir das respostas, os cientistas estabeleceram os tipos mais comuns de flavonoides que elas consumiam e em quais quantidades. As mulheres também fizeram exames de resistência à insulina. A comparação de dados mostrou que as que consumiam mais de quatro porções ricas em um tipo específico de flavonoides apresentavam concentrações 20 vezes menores de glicose no sangue do que aquelas cuja dieta não incluía alimentos ricos nessas substâncias.

A classe de composto mais benéfico no combate ao diabetes 2 foi a das antocianinas, corante responsável pelos tons vermelhos e azuis de vegetais como berinjela, feijão preto, uva, gojiberry, cereja, ameixa, mirtilo, morango e framboesa. Outro alimento rico em antocianina é o cacau do tipo forasteiro, encontrado na composição do chocolate amargo.

Inflamações
A associação entre o flavonoide e a prevenção de diabetes não se limitou a comparações e estatísticas. Os cientistas também retiraram amostra de sangue das voluntárias e descobriram que, entre aquelas que consumiam frequente e abundantemente vegetais com antocianina, a quantidade de biomarcadores inflamatórios envolvidos na regulação da glicose e da insulina era menor. “Juntas, as descobertas fornecem evidências fortes de que as antocianinas são substâncias que podem prevenir o risco de diabetes 2”, observa Cassidy. Ela destaca que, pelo fato de processos inflamatórios em nível celular estarem por trás de todas as doenças crônicas, como câncer e problemas cardiovasculares, a ingestão dos compostos naturais também pode evitar o surgimento desses males.

“São resultados de grande importância para a saúde pública porque, para alcançá-los, não é preciso muita coisa, basta incluir esses alimentos na dieta”, avalia Tim Spector, pesquisador do King’s College de Londres e colaborador do estudo. “É preciso aprofundar as investigações — principalmente para se ter certeza sobre a dosagem de antocianinas necessárias na obtenção dos benefícios. Assim que tivermos essa resposta, será necessário rever as recomendações sobre o consumo diário de frutas e vegetais, acrescentando itens e definindo as porções apropriadas”, diz.

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Duas porções
Qi Sun, pesquisadora do Departamento de Nutrição da Escola de Saúde Pública de Harvard, aconselha a ingestão de pelo menos duas porções de frutas vermelhas por mês para reduzir os riscos de diabetes 2. No ano passado, ela publicou uma pesquisa na edição on-line do British Medical Journal, relatando a associação entre um grande consumo desse tipo de alimento e a menor incidência da doença. “As nossas descobertas indicaram que alguns tipos de fruta são especialmente benéficas para diminuir a probabilidade de um indivíduo desenvolver a doença. Comer mais frutas, particularmente mirtilo, uva e maçã, reduziu esse risco em mais de 20%”, conta.

Diferentemente do estudo inglês, a pesquisa conduzida por Qi não investigou diretamente a relação entre a ingestão de alimentos ricos em antocianinas e a baixa concentração de açúcar no sangue. Contudo, as frutas que mais se mostraram eficientes no combate à resistência à insulina foram justamente as que contêm esse tipo de flavonoide. No experimento, os cientistas analisaram a associação inversa entre o diabetes 2 e o consumo de uva, pêssego, ameixa, banana, melão, maçã, pêra, laranja, morango, toranja e mirtilo, além de sucos de fruta.

As pessoas que consumiam pelo menos duas porções mensais de mirtilo, uva e maçã tiveram 23% menos riscos de desenvolver a doença crônica comparado às que ingeriam uma porção ou menos no período. “Temos de pesquisar mais para saber quais os componentes dessas frutas que estão associados à prevenção do diabetes 2, mas é muito provável que as antocianinas estejam por trás disso”, acredita Qi. Ela ressalta que o resultado positivo é verificado quando as frutas são ingeridas in natura, e não em forma de suco, pois, quando processado, o alimento perde algumas de suas propriedades.



Potencial a ser explorado

“Produtos provenientes de plantas consumidos em nossa dieta têm uma diversidade molecular imensa. Em média, por exemplo, apenas uma folha produz cerca de 20 mil moléculas diferentes. Consequentemente, o reino vegetal também tem um potencial muito grande de afetar nossa saúde e o nosso bem-estar. No caso dos flavonoides, estamos apenas começando a descobrir seus múltiplos efeitos, mas já sabemos que as propriedades medicinais e os efeitos sobre doenças, especialmente no combate a inflamações, são enormes”.

Dianna Bowles, bioquímica de plantas e pesquisadora do Centro de Novos Produtos Agrícolas da Universidade de York