Saúde

Na higiene natural, bebês podem ficar sem fraldas inclusive à noite

O ideal é que o método seja adotado ainda nos primeiros três meses de vida da criança

Valéria Mendes

Para explicar o método em poucas palavras: a mãe não deixa seu bebê 24 horas em fraldas, mas também não precisa criar sem nenhuma fralda
Tamara Hiller é parteira profissional, natural da Alemanha, mora há 7 anos no Brasil com seu marido e filha de 5 anos. Em palestras, consultorias, entrevistas e no site www.slingando.com, ela divulga informações sobre criação com apego, parto humanizado e domiciliar, a arte de carregar bebês com panos ou slings e higiene natural do bebê.

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Saúde Plena: Quando e onde surgiu o método da higiene natural ou Elimination Communication?
Tamara Hiller: A higiene natural ou Elimination Communication (EC) existe desde sempre. É simplesmente a maneira como foram criados todos os bebês em todas as culturas do mundo até 100 anos atrás quando o mundo moderno começou a usar fraldas. O resto do mundo segue criando seus bebês com higiene natural. E faz 15 anos que as primeiras mães modernas, em países como Estados Unidos e Alemanha, se começaram a perguntar por que estão dependendo das fraldas e se não podiam voltar atrás.

Saúde Plena: Quando chegou ao Brasil? Foi você quem trouxe?
TH: Há seis anos pratiquei o método de higiene natural com minha filha desde que ela nasceu e não conhecia mais ninguém que praticava aqui no Brasil. Pode ser que nessa fase eu era a primeira mãe moderna a saber e praticar o Elimination Communication, mas, de qualquer maneira teria se difundido através da internet. E não podemos esquecer, que no Brasil, desde sempre e ainda hoje, os povos indígenas criam seus filhos dessa maneira. E imagino que sem que eles tenham um nome para isso, ou chamem isso de “técnica”, muitas mães praticam elementos de Elimination Communication. Sem ter o dinheiro para comprar fraldas descartáveis, nem tempo para lavar fraldas de pano de sete ou mais filhos, famílias que moram em situações mais simples, rurais, aplicam o método instintivamente. É bastante óbvio que um bebê não precisa estar 24 horas em fraldas e muitas mães sempre souberam disso.

SP: Como é o método da higiene natural?
TH: Para explicar o método em poucas palavras: a mãe não deixa seu bebê 24 horas em fraldas, mas também não precisa criar sem nenhuma fralda. Geralmente as mães usam fraldas de pano e deixam o bebê durante algum tempo durante o dia sem fralda, por exemplo, antes do banho. As mães tentam ler os sinais que o bebê dá para fazer xixi e cocô. Quando percebem que o bebê tem que eliminar - o cocô é mais fácil que o xixi - tiram a fralda e oferecem o penico (a privada, balde, natureza). Também se orientam em ritmos, por exemplo, bebês que sempre fazem xixi quando acordam. Também se oferece o penico em cada troca de fraldas. O método Elimination Communication não requer não usar fraldas, mas as fraldas não são usadas como o lugar exclusivo para eliminar. Isso faz uma diferença grande para o bebê.

"Geralmente, os bebês fazem xixi só quando acordam e não durante o sono profundo. Praticar a higiene natural durante a noite pode melhorar muito o sono do bebê pois ele acorda para fazer xixi (e nem sempre por causa de fome). Então, a mãe sabe melhor como atender a necessidade real do seu bebê e ele volta logo a dormir"
SP: Quando ele dever ser iniciado? Tem uma idade limite?
TH: Você pode começar na primeira semana de vida, mas recomendo não se estressar e primeiro estabelecer a amamentação e ganhar confiança como mãe de primeira viagem. Tente começar no primeiro mês, ou pelo menos nos primeiros três meses. Como os bebês dão muitos sinais nos primeiros três meses, é bom aprender como eles se comunicam. Também se aliviam as cólicas e os bebês choram menos.

Mas nunca é tarde demais, pode começar com qualquer idade.

SP: Um bebê é capaz de ficar sem fraldas inclusive durante a noite para dormir?
TH: Sim, de noite pode ser até mais fácil! Se a mãe dorme ao lado do bebê, ela logo percebe quando ele acorda e isso é o momento que ele precisa fazer xixi. Geralmente, os bebês fazem xixi só quando acordam e não durante o sono profundo. Elimination Communication durante a noite pode melhorar muito o sono do bebê pois ele acorda para fazer xixi (e nem sempre por causa de fome). Então, a mãe sabe melhor como atender a necessidade real do seu bebê e ele volta logo a dormir.

Sem Elimination Communication, a situação é essa, o bebê começa a acordar, a mãe tenta ignorar e espera que ele volte a dormir. O bebê está comunicando que quer fazer xixi. Os bebês pequenos que ainda não entenderam que a mãe tenta ensinar que a fralda é o único lugar apropriado para eliminar, eles não querem sujar seu ninho, molhar sua roupa (a fralda o bebê vê como sua roupa). Qualquer mamífero tem este instinto. Só os humanos treinam seus bebês para perder esse instinto. O bebê chora porque quer que a mãe leve ele a um lugar apropriado para eliminar. A mãe não entende, ela espera, tenta acalmar, acha que deve ser fome. O bebê já esta muito excitado, chora, faz na fralda, amamenta e aos poucos se acalma, volta a dormir. Uma mãe que entende os sinais do bebê resolve essa situação mais tranquila, o bebê nem precisa chorar, nem acordar totalmente.

SP: No Brasil, quem são as pessoas que podem ensinar o método às mães que desejam adotá-lo? É possível a mulher aprender o método sozinha? Tem alguma comunidade ou associação?
TH: Como o método é muito instintivo, afinal, não pode ser que desaprendemos completamente como criar bebês nos últimos 100 anos desde que inventaram a fralda descartável, sim, esse método pode se aprender sozinha. Até gosto muito que este movimento de mães modernas que reaprendem a higiene natural é um movimento de aprendizagem livre, de ajuda mútua das mães através da internet, sem nenhuma comercialização. Tem muitos relatos, dicas e textos de mães na internet. Com essa informação é possível de praticar EC. As mães também se ajudam ativamente, respondendo perguntas em grupos de e-mails. No meu site (www.slingando.com) temos um fórum onde as mães podem fazer perguntas sobre EC. A maioria da informação na internet estpa em inglês ou alemão, mas também em português já tem muita informação. No nosso site também temos artigos traduzidos e escritos por nos e por outras mães.

SP: O tempo gasto com a observação dos sinais do neném não sobrecarregaria a mãe e seria mais um motivo para ela se sentir cobrada caso não dê certo?
TH: Sim, isso pode acontecer, mas só se o método EC for mal entendido. O que infelizmente é comum. Hoje, nós esperamos regras e uma garantia a sucesso. Na verdade, criar um bebê não funciona assim. Com o EC não tem dar certo ou não dar certo. Um bebê está simplesmente eliminando e nós estamos ajudando da melhor maneira possível. Não deve entrar estresse, objetivos e a noção de sucesso ou fracasso. Se tenho um bebê sem fraldas e ele faz xixi no chão, isso não deve ser visto como acidente ou fracasso. Isso é completamente normal e faz parte. Vai acontecer muitas vezes por dia! O bebê nem sempre dá sinais e a mãe nem sempre está com sua atenção 100% nele para perceber todos os sinais. Isso é normal. Então, se eu consigo adaptar este método à minha realidade, relaxar e usar fraldas nos momento onde eu não quero me preocupar se o bebê fez xixi no chão no tapete do apartamento da sogra, não estou preocupada no dar certo ou não dar certo. A mulher tem que entender que está acompanhando um processo natural do bebê e uma característica é que eles não podem controlar completamente seus esfíncteres desde o começo. Não preciso deixar eles nem radicalmente 24 horas só com fraldas, nem 24 horas sem fraldas.

A mulher tem que se colocar mais no processo de observar e se maravilhar com o comportamento e aprendizagem do bebê. A chave é curtir e aprofundar a relação, sem esperar resultados. Difícil isso, no nosso mundo tão competitivo e orientado em sucessos imediatos....

SP: Como o pai pode participar ou ajudar?
TH: O pai pode praticar o método tanto como a mãe quando ele está em casa. Talvez vire uma hora especial e de muita conexão entre pai e bebê. Talvez o bebê acorde toda manhã com necessidade de fazer cocô, o pai leva a criança, a mãe pode dormir mais um pouquinho. Pai e filho lêem um livro quando ele está eliminando. Amamentar um pai não pode, mas levar seu bebê para eliminar, sim! Isso gera mais autoconfiança e aumenta o amor entre os dois.

SP: Com o fim da licença-maternidade, é possível transferir o conhecimento para a pessoa que vai cuidar da criança?
TH: Sim, se a cuidadora está aberta para isso. Caso que não, não importa se a mãe só pratica o EC quando está em casa, antes e depois de trabalhar. Sempre posso manter o EC, pelo menos um pouquinho.

SP: Em casos bem-sucedidos, com qual idade a mãe não precisa mais se preocupar com os sinais e a própria criança avisa quando quer fazer o xixi e o cocô?
TH: Bom, vou tentar evitar que as mães pensem em sucesso e esperem resultados do método Fato é que isso varia muito de criança para criança. Alguns já estão independentes com um ano e 9 meses como minha filha, mas muitos precisam da ajuda de mãe e do pai por mais tempo. Isso é normal. Não posso fazer o EC para esperar resultados e sucessos, mas obviamente uma criança que desde sempre não vê a fralda como o único e mais apropriado lugar para eliminar vai provavelmente ganhar sua independência nas idas ao banheiro mais cedo.
A transição de sinais a avisar verbalmente é gradual. Um bebê com um ano já poderia aprender um sinal com a mão, por exemplo, para avisar que tem que fazer. Se ele faz isso sempre ou não, é outra coisa. Outros bebês, que já podem engatinham vão em direção ao penico ou banheiro quando precisam fazer. Mas não sempre!

SP: Você tem filhos? Adotou o método com eles? Como foi a experiência?

TH: Sim, tenho uma filha e usei higiene natural em combinação com fraldas de pano. Para mim e meu esposo foi uma experiência muito gratificante. Nos primeiros oito meses pegamos praticamente todos os cocôs no penico. O que facilita a lavagem das fraldas e também do bebê porque você não tem todo o cocô espalhado pelo bumbum. Minha filha nunca teve assaduras ou infecções urinárias. Na verdade, com respeito ao que chamados “acidentes”, os quais com certeza aconteceram, acho mais higiênico limpar um cocô ou xixi do chão que ter as fezes empacotadas juntos à pele do meu bebê. Ela gostou muito das horas sem fralda e acho que são importantes em processos profundos, descobrimento do corpo, dos órgão sexuais e autoimagem corporal. Ela cresceu com uma relação mais natural com seu próprio corpo que se fosse criada com “as partes” sempre cobertas pela fralda.