Graciela Ravetti
65 anos, argentina, diretora da Faculdade de Letras da UFMG
“Grande sertão: veredas me chegou num momento em que vivíamos um período de efervescência na Argentina. Havia a ideia de unidade latino-americana e, em minha escola, em Rosario, as aulas de literatura hispano-americana nos apresentaram ao autor. Era uma tradução do espanhol Ángel Crespo. Para mim, era um desafio. E era perfeito naquela perspectiva de abraçarmos o que era considerado vanguarda. Havia aquela coisa de um Brasil desconhecido. Li com um olhar antropológico.
A ideia de estar diante de uma obra tão original nos estimulava. Até ali, da literatura brasileira só conhecia Meu pé de laranja lima. Na verdade, um livro como esse é quase intraduzível. Mas o caráter vanguardista e a linguagem sofisticada nos afastavam da sensação de espanto.
Só vim a ler a versão em português uns 20 anos depois, talvez com uns seis, sete anos de Brasil, ali no começo dos anos 1990. Havia me transferido para cá com meu marido, ambos a trabalho. Acabei relendo uma terceira vez, porque o grau de sofisticação literária é tão grande, que exigia uma leitura inicial e outra posterior, sem comprometimento, talvez com olhar técnico. Em Grande sertão: veredas você entra num mundo em que toda aquela coisa poética remete a Ulisses, de Joyce.
Ele é um livro performático. Parece uma ópera. Coloca tudo muito próximo e, ao mesmo tempo, muito distante. O campo de batalha, o diabo... Você olha para esse sertão e vê o fantástico em torno de personagens imensamente realistas. É como se fosse um trabalho feito de forma artesanal. Mas não sugere ter sido produzido por uma pessoa comum. Há cabeças e cabeças. E Guimarães Rosa conseguiu fazer um livro que vai ser estudado eternamente. É tão performático, que as cenas e as descrições vinham a mim como se fossem uma coisa que eu já conhecesse.
E se a versão em português exigia a presença de um dicionário, especialmente por causa do meu curto conhecimento sobre o idioma na época, a linguagem muito poética, o próprio sentido poético iam me levando. Tranquilamente, colocaria Guimarães Rosa entre os grandes da literatura mundial, como um patrimônio da humanidade.”
65 anos, argentina, diretora da Faculdade de Letras da UFMG
“Grande sertão: veredas me chegou num momento em que vivíamos um período de efervescência na Argentina. Havia a ideia de unidade latino-americana e, em minha escola, em Rosario, as aulas de literatura hispano-americana nos apresentaram ao autor. Era uma tradução do espanhol Ángel Crespo. Para mim, era um desafio. E era perfeito naquela perspectiva de abraçarmos o que era considerado vanguarda. Havia aquela coisa de um Brasil desconhecido. Li com um olhar antropológico.
A ideia de estar diante de uma obra tão original nos estimulava. Até ali, da literatura brasileira só conhecia Meu pé de laranja lima. Na verdade, um livro como esse é quase intraduzível. Mas o caráter vanguardista e a linguagem sofisticada nos afastavam da sensação de espanto.
Só vim a ler a versão em português uns 20 anos depois, talvez com uns seis, sete anos de Brasil, ali no começo dos anos 1990. Havia me transferido para cá com meu marido, ambos a trabalho. Acabei relendo uma terceira vez, porque o grau de sofisticação literária é tão grande, que exigia uma leitura inicial e outra posterior, sem comprometimento, talvez com olhar técnico. Em Grande sertão: veredas você entra num mundo em que toda aquela coisa poética remete a Ulisses, de Joyce.
Ele é um livro performático. Parece uma ópera. Coloca tudo muito próximo e, ao mesmo tempo, muito distante. O campo de batalha, o diabo... Você olha para esse sertão e vê o fantástico em torno de personagens imensamente realistas. É como se fosse um trabalho feito de forma artesanal. Mas não sugere ter sido produzido por uma pessoa comum. Há cabeças e cabeças. E Guimarães Rosa conseguiu fazer um livro que vai ser estudado eternamente. É tão performático, que as cenas e as descrições vinham a mim como se fossem uma coisa que eu já conhecesse.
E se a versão em português exigia a presença de um dicionário, especialmente por causa do meu curto conhecimento sobre o idioma na época, a linguagem muito poética, o próprio sentido poético iam me levando. Tranquilamente, colocaria Guimarães Rosa entre os grandes da literatura mundial, como um patrimônio da humanidade.”