Confrontos na Colômbia podem estar perto do fim, explica ex-guerrilheiro León Valencia

Apesar de muitos impasses, negociações avançam; analista colombiano é um dos que apostam em solução definitiva, como conta ao Pensar

por Pablo Pires Fernandes 31/07/2015 00:13

Scott Dalton/ap - 30/4/2000
León Valencia questiona capacidade da atual esquerda colombiana de promover mudanças (foto: Scott Dalton/ap - 30/4/2000)
Quando esteve em Belo Horizonte, em dezembro, León Valencia não parecia carregar sobre si o peso de seu passado, nem ostentava qualquer traço de sua merecida notoriedade. Tampouco era possível notar o papel que vem desempenhando em busca de uma solução pacífica para o conflito colombiano.

 

Vestindo uma camisa polo e com um ar de leveza de quem está de férias, o tom de sua voz se tornou sério ao começar a falar sobre sua história, impregnada pelos tristes e violentos fatos dos últimos 50 anos em seu país. Sua análise arguta sobre o jogo político e sua perseverança em apontar soluções concretas à guerra civil que cinde a sociedade colombiana o tornaram uma das vozes mais proeminentes – e eficazes – na direção de uma reconciliação nacional. A batalha de León Valencia, atualmente, nunca esteve tão próxima de ser vencida.

 

EM/D.A Press
(foto: EM/D.A Press)
Ex-integrante do Exército de Libertação Nacional (ELN), Valencia se engajou na luta guerrilheira pela via católica. Foi a ação militante de sacerdotes junto aos camponeses em busca de ideais de justiça que o convenceu a desempenhar um papel de dirigente do grupo esquerdista que, como as Forças Armadas Revolucionárias Colombianas (Farc), pegou em armas contra o governo.


Atuante como dirigente do ELN entre 1987 e 1994, diz ter passado por três etapas. “Uma etapa é de uma ilusão muito grande de que poderíamos mudar a Colômbia e poderíamos recuperar a dignidade das pessoas.” Durante a experiência, diz ter vivido “sentimentos muito desencontrados”. Com o tempo, as ações da guerrilha – assassinatos e sequestros – o desiludiram.

 

“Essa não é a minha guerrilha”, lembra-se da decisão. Com o afastamento da luta armada, Valencia optou por outras vias em busca de soluções. Fundou organizações civis de investigação para compreender os meandros do conflito e conquistou espaço.

 

Hoje, dirige a Fundación Paz y Reconciliación, de pesquisa e debate, mantém uma coluna na Semana, a mais importante revista do país, o programa de TV La controvérsia, no canal Capital, de Bogotá, e o portal independente Las 2 Orillas, de investigação e informação política, o mais visto na Colômbia.

EM/D.A Press
(foto: EM/D.A Press)
O histórico dilema político na Colômbia ainda não acabou. Valencia, no entanto, acredita que o diálogo de paz entre o governo e as Farc tem chances reais de ser bem-sucedida. Desde 2012, o governo do presidente Juan Manuel Santos e as Farc negociam os termos para encerrar o impasse. Três dos seis pontos previstos na pauta de discussão já foram acordados: a questão agrária, a participação política de integrantes da guerrilha e o problema do narcotráfico.

 

Foram avanços substanciais e importantes, assim como a concordância em se criar uma Comissão da Verdade para esclarecer fatos e estabelecer responsabilidades sobre violações cometidas pelos dois lados.

 

A reparação das vítimas e as punições a serem aplicadas ainda são motivos de divergências. E alimentam uma forte oposição. Radicais buscam minar o diálogo de paz defendendo ideais fora da realidade. Episódios de violência fazem o diálogo titubear. No entanto, Valencia mantém firme sua convicção de que os altos e baixos e os reveses são naturais de um processo tão espinhoso.

 

Em entrevista exclusiva ao Pensar, fala claramente sobre o temor, entre os militares, de serem incluídos em qualquer possível lista de condenados. “Há 4 mil militares e policiais presos e 14 mil investigados”, diz. Mas pondera que “não se pode chegar a uma solução na qual os guerrilheiros entrem para a política e alguns dos militares acabem presos”. “Isso não é mais possível para uma paz verdadeira”, constata.


EM/D.A Press
(foto: EM/D.A Press)
Em vez de se ater aos temas que provocam crises, o politólogo aponta dados que justificam a insustentabilidade das circunstâncias. “A Colômbia tem 500 mil militares e policiais. Isto é 1,1% da população em armas e está gastando 4,9% de seu PIB com defesa. Isso tem que mudar, mas como?”, questiona.

 

Além de apresentar alternativas concretas para resolver impasses, Valencia, otimista, já elabora caminhos para lidar com um cenário pós-conflito. A reconciliação, ele sabe, deve levar tempo. “Temos que aprender a lidar com essas questões.”

 

MAIS SOBRE PENSAR