Marcas do destino

Edney Silvestre lança na Bienal do Livro de BH o romance Boa noite a todos. Narrativa tem como protagonista mulher expatriada que perde a memória

por 18/10/2014 00:13
Globo/Divulgação
Globo/Divulgação (foto: Globo/Divulgação)
Helvécio Carlos



Edney Silvestre se considera um escritor de muita sorte. Desde sua estreia no mercado editorial, há três anos, com o premiado Se eu fechar os olhos agora (Prêmio Jabuti de melhor romance em 2010), o autor é destaque na literatura não só no Brasil, mas no exterior, onde até o ano que vem a obra estará em 10 países. "Tinha 59 anos quando meu primeiro livro foi publicado. Mas isso não quer dizer que tenha começado a escrever tarde. Escrevo desde os 7, mas como sou muito exigente com meu trabalho, produzia e guardava por achar que aquilo era igual a muitos", diz ele. Depois de receber um “ok” de Luciana Villas-Boas (na época editora da Record), percebeu que o momento havia chegado.

De lá para cá, publicou A felicidade é fácil, Vidas provisórias, e, o mais recente, Boa noite a todos, que terá lançamento em Belo Horizonte durante a Bienal do Livro de Minas Gerais. Na mesma noite, em 22 de novembro, o autor participa do debate “Literatura e identidade nacional”, às 19h30, no Expominas.

Silvestre garante que não tem material inédito guardado na gaveta. E admite: "Sou um autor lento, mas escrevo muita coisa ao mesmo tempo. Redijo um parágrafo e fico com ele dias, semanas, meses até deslanchar", conta. E nesse vaivém, muita coisa se transforma pelas mãos e pelo pensamento do escritor. Maggie, a personagem principal de Boa noite a todos, por exemplo, surgiu em Vidas provisórias. "Fui escrevendo, escrevendo, até perceber que a Maggie não era daquele romance. Tanto ela quanto o Harry.”

Boa noite a todos é obra ficcional que narra a história de uma mulher (Maggie) cuja memória começa a se perder. "Ela é uma personagem-frankenstein, uma composição que mistura ficção, tema que sempre me tocou, com a realidade. A Maggie é uma expatriada. Vi muita gente expatriada vivendo situações dramáticas. Depois ela perde o grande amor, se entregando a uma situação sem amor nenhum", conta o escritor, nascido em Valença, no Rio de Janeiro.

O livro se divide em três partes. Na primeira, na forma de prosa, o autor apresenta “A novela que deu origem à peça”. Na segunda parte, em estilo dramático, por meio de diálogos, vem “A peça originada da novela, que acabou por levar a transformação do texto em prosa”. Completa o romance uma curta seção final: “A construção dupla de Boa noite a todos”.

Otimista com a produção literária no Brasil, Edney Silvestre considera uma tolice o fato de as pessoas ainda insistirem em não acreditar no interesse do jovem pela literatura. “Essa geração de 20, 30 anos, que se formou com Harry Potter, lê e muito", afirma com satisfação. Não é só. Para ele, o mercado literário vive um bom momento. “As vendas só fazem aumentar. Hoje se lê, se escreve e se compra muito mais que oito anos atrás”, assegura, dando como garantia o resultado de 12 anos à frente do programa Globo News Literatura, exibido na TV paga pelo Globo News.

No início, a pauta do programa era dividida em, no máximo, dois entrevistados. "Hoje, mesmo dividindo o programa em entrevistas e um espaço para mostrar os lançamentos, sem contar edições especiais – como o programa sobre o centenário de Júlio Cortázar – ainda assim não conseguimos cobrir tudo”, diz. O jornalista e escritor comemora o fato de o programa ser o único falando de literatura com audiência regular e qualificada.

Edney Silvestre considera inaceitável a existência de 14 milhões de analfabetos no país. "Isso é um absurdo. Não podemos viver nessa situação. A educação e a cultura precisam de mais verba, mais atenção. Enquanto isso não ocorreu, temos que gritar, gritar, gritar", propõe.

E aproveita o momento para deixar uma sugestão para o próximo presidente da República. "Acho que seria interessante incentivar a indústria e o comércio para que esses setores estimulem seus funcionários a atividades de leitura e desenvolvimento intelectual. É preciso que todos tenham acesso à cultura, o que é essencial para que cresçamos e haja justiça social.”


Trecho
“Perdi o voo porque me esqueci que embarcaria de sei lá onde para um outro lugar qualquer. Depois um outro. Quantas vezes, na chegada, eu olhava as malas na esteira e não reconhecia quais eram as minhas. Tinha que esperar até ficarem apenas as últimas. Aí eu podia pegá-las, sem medo de passar por constrangimento. Um dia acordei sem saber onde me encontrava. Era um hotel de rede, desses iguais no mundo inteiro. Foi a primeira vez que tive medo... disso. Desse... Dessa...”

Boa Noite a todos
• De Edney Silvestre
• Editora Record 208 páginas, R$ 28

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