Petillo não é ensaísta. Que não se espere dele insights geniais sobre o nosso cancioneiro. O jornalista cumpre seu dever de casa: aborda a obra de Vicente Celestino, Pixinguinha, Cazuza, Chico Buarque, João Gilberto, Caetano Veloso, Milton Nascimento, Chico Science, Chitãozinho e Xororó, Victor e Léo, Tom Jobim, Renato Russo, Roberto, Erasmo e Jorge Benjor, entre tantos outros. Até aí, não há novidade.
O interessante de seu “garimpo” são pérolas fora de catálogo. Está lá, por exemplo, “o discaço” (palavras do autor) que reuniu Altamiro Carrilho (flauta), Zé Bodega e Maestro Cipó (sax-tenor), Raul de Souza (trombone), Sivuca (acordeom), Baden Powell (violão), José Marinho (baixo) e Edison Machado (bateria). Esse escrete campeão arrasa em Turma da gafieira, lançado em 1957 pela Musidisc. Puro jazz brasileiro, decreta Petillo, lembrando o sufoco imposto a Machado por suas “heresias” nos pratos, consideradas atentados por puristas do samba.
Outro diamante: Laurindo de Almeida e Bud Shank em Braziliance (volume 1), lançado pela gravadora World Pacific, de Los Angeles, há 60 anos. Pioneiro na mistura de música brasileira e americana, o LP juntava baião e jazz. “Alguns o consideram o marco zero esquecido da bossa nova”, conta Petillo. Uma preciosidade rompeu a tão demarcada fronteira entre erudito e popular: o disco lançado pela Copacabana, em 1978, em que Radamés Gnatalli e Arthur Moreira Lima interpretam canções de Noel Rosa.
Todo mundo sabe que a Lira Paulistana deu régua e compasso a Arrigo Barnabé e a Itamar Assumpção – faróis da vanguarda surgida do pequeno teatro da Pauliceia, tema de documentário em cartaz nos cinemas do país. Mas alguém se lembra da big band caipira Paranga, que lançou Chora viola, chora coração em 1983? “Aquele bando lá de São Luiz do Paraitinga, formado por herdeiros sonoros de Elpídio dos Santos”, informa o autor, gravou a conhecida Casinha branca e também a marchinha Uma das bandas da bunda. E deixou saudades...
Pop
Curtindo música brasileira mergulha com gosto no repertório de artistas queridos do povão. Amado Batista, Sullivan e Massadas, Gretchen, Odair José, José Augusto, Waldick Soriano e astros da Discoteca do Chacrinha se destacam no capítulo dedicado ao pop nacional. O autor evita carimbar essa turma com o adjetivo brega, que ultimamente tem perdido seu caráter pejorativo. Enquanto a crítica massacra esses hitmakers, o público os idolatra, lembra o jornalista. Assim, Wando, Sandy e Júnior, Sidney Magal, Emmerson Nogueira, Michel Teló, Latino, Roupa Nova e Fábio Jr. dividem a prateleira com Guilherme Arantes, Cidade Negra, Emilio Santiago, Jota Quest e Lulu Santos. “Pop é o que o povo quer ouvir”, resume Alexandre Petillo.
Outro capítulo, “Black music”, põe no mesmo baile o genial Tim Maia, seu sofisticado sobrinho Ed Motta, o cultuado Carlos Dafé, a mítica Banda Black Rio, Cassiano, Hyldon e os internacionais DJs Marky e Patife com a funkeira carioca Tati Quebra Barraco e os meninos d’Os Leleks com sua “grudenta” Passinho do volante. Todos batem ponto ao lado de Racionais MCs, Mr. Catra, Marcelo D2, Claudinho e Buchecha, Sergio Mallandro, Criolo e Wilson Simonal. Muita gente, certamente, vai chiar diante dessa metodologia. Afinal, musicalmente falando, Tim Maia e MC Serginho – aquele do Vai, Lacraia – não parecem tão próximos assim. Mas, como decretou o próprio Síndico, vale tudo. E quem não dança que segure a criança...
CURTINDO MÚSICA BRASILEIRA
. Um guia para entender e ouvir o melhor da nossa arte
. De Alexandre Petillo com Eduardo Palandi, Erick Miranda e Zé Dassilva
. Editora Belas Letras, 752 páginas, R$ 54,90