Para os fãs e estudiosos da obra do Rei do Baião, o livro é particularmente revelador, pois conta como Clementino escreveu sucessos como Xote dos cabeludos, o desabafo do cantor pernambucano diante das mudanças no comportamento masculino nos anos 1960. “Era uma espécie de protesto a uma moda que fazia a cabeça dos homens ‘modernos’”, lembra Jurani, citando um trecho emblemático da letra, gravada em 1967: “Cabra do cabelo grande, cinturinha de pilão/ Calça justa bem cintada, costeletas bem fechadas, salto alto, fivelão/ Cabra que usa pulseira, no pescoço um medalhão/ Cabra com esse jeitinho no sertão do meu Padim/ Cabra assim não tem vez, não”.
No livro, Jurani também reproduz entrevista de Clementino ao Diário do Nordeste nos anos 1970, quando ele detalha como funcionava sua parceria musical: “As composições que Luiz Gonzaga gravou foram encaminhadas com melodia e letra. O Rei do Baião dava uma ajeitada, impunha o seu estilo. E a música passava a ser dos dois. Aceitava essa situação, queria a parceria”, explica o compositor.
No capítulo “O esquecimento de um Zé”, Jurani muda o tom expositivo e tece críticas aos que narram a vida do cantor sem citar o compositor cearense: “É impressionante a forma quase desrespeitosa como a memória de Clementino é tratada por grande parte dos biógrafos de Luiz Gonzaga”. Por outro lado, ele ressalta o trabalho de uma sobrinha de Clementino, a professora Ana Emília, fundamental na catalogação da obra do tio, que dizia desconhecer a quantidade de músicas que havia escrito. “Muitas vezes, a professora teve que recorrer a Zé Clementino para saber o que significava determinada palavra, verso, uma vez que o áudio estava praticamente incompreensível”, narra Jurani. Ana Emília, ao final do trabalho, conseguiu quantificar as músicas de Clementino, gravadas por Gonzaga (Sou do banco, O jumento é nosso irmão) e outros grandes artistas nordestinos como Sirano, Dominguinhos, Trio Nordestino, Messias Holanda e Genival Lacerda.
No fim do livro, o autor reproduz os discos de Gonzaga que incluem músicas de Clementino, entre eles Óia eu aqui de novo, O sanfoneiro do povo de Deus, Sertão 70 e Capim novo, e ainda contabiliza: “Até março de 2005, foram gravadas 41 músicas, que somadas as 20 regravações, totalizam 61 interpretações, distribuídas entre 32 intérpretes do cancioneiro popular a nível nacional e regional”. Zé Clementino: o ‘matuto’ que devolveu o trono ao Rei é um livro indicado não só para pesquisadores da música brasileira, mas para aqueles que desejam conhecer mais sobre a vida e obra do autor de versos que até hoje habitam a memória do povo nordestino.
Zé Clementino: O ‘matuto’ que devolveu o trono ao Rei
. De Jurani Clementino
. Latus Editora e Editora da Universidade Estadual da Paraíba, 240 páginas. Encomendas pelo telefone (83) 3315-3300.