Dramaturgo e diretor Roberto Alvim propõe reflexões sobre teatro brasileiro

Ideias são divulgadas em seminários e oficinas pelo país e lança ensaio e peça em único volume

por Carolina Braga 01/06/2013 00:13

Juarez Rodrigues/EM/D.A Press
Roberto Alvim esteve em BH para lançar Dramáticas do transumano e outros escritos seguido de Pinokio (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)

 

O dramaturgo e diretor carioca radicado em São Paulo Roberto Alvim não é nada modesto. Para ter uma ideia, somente em 2013 foram cinco estreias nos palcos paulistas, praticamente uma por mês. O livro Dramáticas do transumano e outros escritos seguido de Pinokio já chega em sua terceira edição em menos de um ano de publicação. Nas palestras que faz e oficinas que ministra no país, reforça a própria fama de ser um dos poucos que pensam o teatro contemporâneo brasileiro. Ele não quer pouco.

Fundador da companhia Club Noir, ao lado da atriz Juliana Galdino, Roberto Alvim é um provocador. “Sempre fui contra a reprodução de sistemas formais preexistentes. Percebi que havia no teatro uma ideia de tradição que era demasiado errônea e produto de uma ignorância histórica”, alfineta. Para ele, o teatro só existe na medida em que é uma arte que vive de permanentes reinvenções e, portanto, não é feita para exatamente ser entendida. Por isso instiga criadores a deixarem de lado o papel de “bonecos de ventríloquo” e propor alteridades radicais nos palcos.

Aos 40 anos e com 20 peças no currículo, Roberto Alvim começou a carreira como ator no Rio. Por dificuldade em encontrar textos que dissessem o que interessava a ele, começou a escrever as próprias peças. A guinada se deu em 2006, quando, já em São Paulo, começou a colocar em prática “outros modos de construir o tempo, o espaço, a própria condição humana, através de manipulações inusuais da linguagem”.

A lista de trabalhos é extensa, mas entre eles se destacam a direção de O quarto, de Harold Pinter, que em 2009 deu à companhia o Prêmio Bravo de melhor espetáculo de São Paulo. As criações assinadas por Alvim têm em comum a relação especial com as palavras e também um entendimento diferente do uso da iluminação no palco.

Em um momento em que se publica pouca dramaturgia e raríssimos livros com reflexões sobre as artes cênicas, Dramáticas do transumano pode ser entendido como um passo de Alvim em busca da tão desejada originalidade. Não à toa, junto às reflexões, acrescenta Pinokio, peça de 2010 da qual se orgulha bastante.

Sem o menor pudor, o dramaturgo apresenta o que faz como se fosse uma contribuição singular para a história. “Há um tipo de operação, arquitetura linguística, de trato com o sujeito e a linguagem que nem o Pinter, nem o Beckett, nem o Brecht, nem o Shakespeare fizeram antes. Então é uma contribuição singular. Me custou 20 anos.”

Roberto Alvim é avesso à linearidade. Dramáticas do transumano reúne, muitas vezes em tópicos, apontamentos carregados de referências ligadas à filosofia, à psicanálise, à linguística e às respectivas interseções com o teatro. Autores como Heráclito, Holderlin, Nietszche, Heidegger, Wittgenstein, Deleuze e Lacan, frequentam o olimpo de Alvim. “O livro é uma pós-conceituação. Uma tentativa de mapear, no campo teórico, uma série de procedimentos originais que foram surgindo em oficinas de dramaturgia, sobretudo em Curitiba e São Paulo”, conta.

Para ele, lamentavelmente, a geração que se dedica a fazer teatro no Brasil hoje não tem a mínima ideia das revoluções perpetradas nos campos nos quais funda suas reflexões. Ainda assim, acredita que começa a surgir um movimento interessante na escrita das peças. “A dramaturgia está problematizando todos os esteios do drama tradicional. A ideia de trama, conflito e personagem. Isso força os encenadores a criarem métodos inteiros de atuação que possam dar conta do tipo de modelação que esses textos exigem”, diz.

Roberto Alvim já foi apontado como sucessor de nomes como Antunes Filho, Zé Celso Martinez Corrêa e Gerald Thomas, e gosta deste desafio. Lembre-se que ele não é nada modesto. “Até para dignificá-los e honrá-los temos que superar nossos mestres em pelo menos 30% em outras direções”, acredita. E assim ele vai.


TRECHO

“O teatro não é entretenimento – já existe entretenimento o suficiente. O teatro tampouco é reflexão – existem, hoje, inúmeras instâncias destinadas a isto. O teatro é, sim, o lugar de experenciarmos o tempo, o espaço e a condição humana de outros modos, para além da vivência que a cultura nos proporciona. Isto só o teatro pode fazer – este lugar só o teatro pode instaurar. O teatro como alteridade radical.”

Roberto Alvim, em Dramáticas do transumano  e outros escritos seguido de Pinokio

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