Cidades justapostas

por 04/05/2013 00:13
Leônidas Oliveira

O passado cristalizado e de grandes feitos – ou de curiosidades – se transformou em processo de construção: da cidade, das memórias, das histórias. O patrimônio legado (em forma de objetos, documentos, fotografias, conjuntos arquitetônicos) e preservado continuou a ser valorizado em sua materialidade, contudo, as redes de sociabilidade, as técnicas e saberes, as tensões sociais, o emaranhado de significados e subjetividades deram nova roupagem ao trabalho realizado. Dimensões que permitiram estabelecer relações entre o sujeito do presente e as interpretações sobre os elementos do passado, que conformam a cidade e que, em Belo Horizonte, ganha contornos dilacerantes. Isso porque temos aqui cidades justapostas num conflito intenso entre presente e passado, fazendo-nos lembrar da feliz fala de Baudelaire: “A forma de uma cidade muda mais rapidamente, meu Deus, que coração infiel!”.

É hoje o MHAB, o Museu da Cidade, experimentado e reconhecido. É como Museu da Cidade que celebramos seus 70 anos. E, como tal, tem agido nesse sentido, ou seja, buscando compreender a capital mineira nas dimensões da cidade/nação, cidade/região, cidade/bairro, cidade/rua e cidade/sujeito, e destruição/reconstrução; mas, também, a cidade como objeto, como art-e-fato, como coleção, como fato museológico e, sobretudo, como fato social. Dessa forma, o museu tem lidado com a complexidade da cidade e de seu cotidiano, dialogando com o seu próprio contexto territorial, com as visões expressas nos estudos acadêmicos, mas que ganham corpo nas crônicas, poesias e tantos outros textos que revelam as incontáveis faces e dimensões de Belo Horizonte.

O Museu Histórico Abilio Barreto não é, portanto, um lugar do passado, mas sim um espaço contemporâneo que trabalha com o passado. O museu, dentro e fora de seus muros, atua na busca das pontes que ligam as diversas experiências, os diversos fragmentos que se apresentam sob a forma de acervo. Assumindo essas concepções e esses modos de trabalhar e construir saberes, o Museu da Cidade vem também empreendendo dinâmicas variadas para manter o diálogo com o público. Este, como museu público que é, talvez seja sua maior função: promover interação com a cidade e salvaguardar a história das gentes daqui. Este ano, nas comemorações dos seus 70 anos, de forma especial, o museu contará mais histórias, com um calendário rico, exposições, encontros, seminários e finalmente terá na requalificação arquitetônica dos seus espaços um novo lugar inteiramente dedicado à sua função, a cidade de Belo Horizonte.

Leônidas Oliveira é presidente da Fundação Municipal de Cultura.

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