O adeus a Renato Barros, e o legado deixado pelo líder dos Blue Caps

Cantor morreu nesta terça, de complicações pulmonares; em entrevista ao EM, há três anos, ele contou sobre o início inusitado na carreira

Augusto Pio 28/07/2020 19:16
Facebook/Reprodução
Ícone da Jovem Guarda, Renato Barros, líder da banda Renato e Seus Blue Caps, morreu nesta terça-feira (foto: Facebook/Reprodução)
Internado há 10 dias depois de se submeter a uma cirurgia no coração, o músico carioca Renato Barros, líder do grupo Renato e Seus Blue Caps, de 75 anos, morreu nesta terça-feira (28), no Hospital de Clínicas de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, em decorrência de complicações pulmonares. 

Um dos ícones de Jovem Guarda, programa apresentado por Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa nos anos 1960, Renato e sua banda foram responsáveis por vários hits, sobretudo versões de canções dos Beatles.

“Ah, deixa essa boneca, faça-me o favor” – quem não conhece esse verso de 'Menina linda', versão brasileira de 'I should have know better', de Lennon e McCartney? Canção que embalou a juventude dos anos 1960, ela foi cantada por várias gerações.

A banda chegou aos primeiros lugares das paradas com 'Não de esquecerei', versão de 'California dreaming', do The Mamas and The Papas. Também fez sucesso com as beatle songs 'Até o fim' ('You won’t see me'), 'Ana' ('Anna'), 'Feche os olhos' ('All my loving') e 'Tudo que sonhei ('If I fell').

“A gente não falava inglês e também não sabia decorar as letras. Então, o jeito era fazer versões, o que deu muito certo. Foi assim que começamos, fazendo versões das músicas dos quatro cabeludos de Liverpool”, contava Renato.

Em entrevista concedida ao Estado de Minas há três anos, Renato relembrou sua estreia, aos 16 anos, no programa Hoje é dia de rock, da Rádio Mayrink Veiga, no Rio de Janeiro, atração que atraía jovens na porta da emissora.

Renato e Seus Blue Caps/Divulgação
Grupo formado em 1962 teve, entre seus hits, a música Menina linda (foto: Renato e Seus Blue Caps/Divulgação)


Foi surpreendido por Jair de Taumaturgo, diretor da atração, que o convidou a se apresentar. “Ele acabou nos inscrevendo. Eu nem esperava. Quando me perguntou como se chamava o meu conjunto, fiquei sem saber o que respondia. Lembrei-me de um bloco de carnaval lá no bairro onde a gente morava, Piedade, no subúrbio carioca, o Bacaninha da Piedade. Aí, eu só acrescentei o rock.”

A performance ao vivo do Bacaninhas do Rock da Piedade, na Mayrink Veiga, foi um fracasso. A banda enfrentou vaias. “Fiquei traumatizado. Minha mãe fez as nossas roupas e tudo. Falei que nunca mais ia levar uma vaia na vida. Foi a primeira e a última vez”, contou.

Porém, o fracasso serviu de estímulo para que Renato e seus companheiros – incluindo os irmãos Paulo César e Edson Barros (mais tarde Ed Wilson, que saiu em 1963, dando lugar a Erasmo Carlos) – não desistissem.

Jair, integrante da Bacaninhas, sugeriu mudar o nome do grupo. “Ele falou que Bacaninhas do Rock da Piedade era muito ridículo e nós concordamos. Ele começou a desfiar um monte de sugestões: Renato e seus Cometas, por exemplo. Assim surgiu a Renato & seus Blue Caps, inspirado no conjunto norte-americano Gene Vincent and His Blue Caps”. O grupo surgiu em 1962.

Guiness Book e Jovem Guarda


Desde então, os Blue Caps não pararam mais. Renato dizia que sua banda era uma das mais longevas do mundo na seara do rock. Com seis décadas de palco, reivindicou, em 2019, entrar para o 'Guiness Book: O livro dos recordes'.

Para Renato, o motivo dessa longa história foi a dedicação e a paixão pelo trabalho. “A gente tem que amar muito e respeitar o que faz, porque dessa forma a gente também respeita e ama o público, que é o grande responsável por tudo isso. Outra coisa é não parar no tempo e estar sempre nos reciclando, descobrindo coisas novas".

Filho de artistas – a mãe foi cantora na Rádio Nacional e abandonou a profissão para se casar; o pai chegou a fazer pontas em filmes da Atlântida –, Renato explicou ao EM que a banda, considerada representante da Jovem Guarda, surgiu antes do movimento musical.

Ingressou na “turma do iê-iê-iê” por acaso. Morando no Rio, ele e os irmãos ignoravam o que ocorria no resto do país naqueles anos 1960.

“Um dia, o Marcos Lázaro, empresário e homem que criou toda essa história, nos convidou para participar de um programa chamado 'Jovem Guarda', exibido na TV Record. A gente nem tinha ideia do que era. Quando ele contou que nossa música 'Menina linda' estava nas paradas de sucesso, nem acreditamos. Assinamos contrato, nos apresentamos durante algum tempo e foi um estouro. A Jovem Guarda foi algo muito forte mesmo, bem popular", relembrou.


O som de uma geração


Com Roberto, Erasmo e Wanderléa, a banda Renato e seus Blue Caps influenciou a juventude dos anos 1960, deslumbrada com o rock e o surgimento da beatlemania.

Naquela época, essa geração dançava, namorava, se casava e viajava pelas estreitas estradas ouvindo aquele som, no toca-fitas do carro.

Na verdade, o fato de o grupo fazer versões em português de grandes sucessos internacionais possibilitou que milhões de brasileiros cantassem as belas canções de Lennon e McCartney e também de outros ícones do velho e bom rock and roll.

Particularmente, eu conhecia o grupo de LPs e compactos, mas a primeira vez que vi Renato e Seus Blue Caps foi no programa 'Jovem Guarda'. Não posso negar: ali aflorou minha inspiração para ser músico.

Cantei, vibrei junto com eles. E até hoje canto os versos “Feche os olhos e sinta/ Um beijinho agora”.

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