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Mais indie, menos pop

Marcelo Jeneci estreia em BH o show de seu novo álbum, 'Guaia'

- Foto: Mariana Benzaquem/Divulgação
“Não tenho dúvidas nem da pessoa nem do artista que sou. Sou tão interessado na confecção da música que a resposta que o mundo vai dar a ela não é mais tão importante. Mais importante é o que consegui fazer com o Pedro (Bernardes), o Lux (Ferreira) e o Mário Caldato.” Este é Marcelo Jeneci, de 37 anos, cantor e compositor, que apresenta Guaia (Slap Discos), seu terceiro álbum, como o registro do “amadurecimento do menino para o homem”.

Lançado nesta semana nas plataformas digitais, Guaia chega aos palcos próxima sexta-feira (2). Assim como ocorreu com o álbum anterior, De graça (2013), o primeiro show será em Belo Horizonte (no Sesc Palladium). “Disco é disco, show é show. Como tenho me interessado pelo processo de mudança, pela primeira vez vou fazer um espetáculo, não um recital”, diz ele.

Guaia marca o retorno de um dos compositores mais celebrados desta década após um hiato de seis anos sem lançar material inédito. “O disco é uma resposta para mim mesmo.

Agora vamos ver como o mundo vai absorvê-lo”, acrescenta. O trabalho vem coroar um período de transformações pessoais.

Em junho de 2017, Jeneci se uniu à artista visual, poeta e joalheira Mana Bernardes em um casamento-performance no Rio de Janeiro. Por causa da união, trocou São Paulo pela capital fluminense. Mas vive bem longe da confusão da metrópole. O casal mora no Alto da Boa Vista, próximo à Floresta da Tijuca.

Há um ano, ele começou a trabalhar com o cunhado, o músico e produtor Pedro Bernardes (ex-marido de Marisa Monte, neto do célebre arquiteto Sérgio Bernardes).
Não havia pressa, cobrança, tampouco um caminho pré-estabelecido. À dupla logo se juntou outro produtor, Lux Ferreira. Mais tarde, entrou em cena Mário Caldato, que assinou a mixagem em seu estúdio em Los Angeles.

Ainda que o cenário seja bem distante do universo em que Jeneci circulou até então, Guaia traz como principais referências as raízes do músico. O título se refere a Guaianases, distrito no extremo Leste de São Paulo onde ele nasceu. Nas 10 faixas - boa parte delas fugindo das canções redondinhas (por vezes fofas) que marcaram o início da trajetória de Jeneci -, ele conecta passado, presente e futuro.

CONEXÃO

O álbum é aberto por um canto indígena interpretado pela cantora Ikashawhu, da tribo Yawanawa. No meio da faixa, Jeneci repete o verso “é emergencial a gente se conectar com a terra”, frase que Mana sempre disse para ele.
“O disco é uma maneira de contar como a minha vida tem colidido em mim”, diz ele.

- Foto: Slap/DivulgaçãoEsta “colisão” se dá através de sons de baião e frevo, que remetem à sua infância na periferia de São Paulo. Oxente, com letra de Chico César, mistura a sanfona de Jeneci com as percussões de Lucas dos Prazeres em meio a programações eletrônicas. Vem vem (Jeneci, Pedro Bernardes e Rute Casoy) celebra as bandas de pífano de Caruaru (com a participação dos músicos João do Piff, Marcos do Piff e Zé Gago) com uma letra bem-humorada e a voz da jovem cantora indie Maya. A ideia de homenagear os pífanos também foi de Mana. “Nestes seis anos de desconstrução, fui me dando conta da minha história, dos valores que andam comigo”, acrescenta Jeneci.

O seu amor sou eu, parceria de Jeneci com Luiz Tatit, é uma canção amorosa que poderia muito bem estar em seus discos anteriores. Mas a sonoridade suave marcada por um batimento cardíaco é encerrada pelas cordas da Filarmônica de São Petersburgo. Outra canção de cunho amoroso, Melodia da noite (Jeneci) é um blues com todos os instrumentos executados pelo próprio Jeneci - à exceção da guitarra de Pedro Bernardes, que dá um ar meio gauche à canção.

Jeneci comenta que, pela primeira vez, trabalhou com o desconhecido.
“E aprendi que este é o grande tesão da arte. Antes, quando estava no estúdio, eu já sabia como resolver uma música com o produtor. Agora, trabalhando com camadas sonoras, deixei que as coisas se manifestassem processualmente. Pouca coisa (no disco) está em seu lugar-comum.”

Ele comenta que a “troca de pele” pela qual veio passando nos últimos anos é algo “que vai ecoar para a vida toda”. “Nunca tive dúvida nenhuma de que eu geraria uma expressão que pudesse ser popular e que seria absorvida pelo Brasil inteiro”, ele diz sobre o álbum de estreia, Feito pra acabar (2010), celebrado por público e crítica e executado à exaustão (como esquecer Felicidade ou a faixa-título?).

“A percepção de como a gente é visto pelo outro é ilusória. Em que mundo a gente vive? São muitos em um mesmo mundo. Então, quando me propus, aos 28 anos, a lançar aquele disco, eu sabia que havia uma chance grande de o álbum ecoar muito com algumas canções. Já o segundo disco foi mais experimental, pois eu não sabia direito onde estava pisando, estava numa fase conturbada.”

Com Guaia, Jeneci faz as pazes consigo mesmo. No palco, as mudanças serão drásticas. Do garoto tímido que parecia meio desconfortável em cena nos shows de Feito pra acabar pouco resta.
“Estou gostando de cantar mesmo. E isso me dá mais vontade de cantar as músicas dos outros do que as minhas próprias composições”, ele diz, revelando que, do repertório de terceiros, incluiu Como dois animais (Alceu Valença).

No show, Jeneci vai apresentar as 10 canções de Guaia. Dos álbuns anteriores, apenas duas músicas de cada. “O espetáculo vai apresentar uma costura de linguagens diferentes. Cenário, luz figurino. Também preparo o corpo para entrar em cena. Hoje quero namorar a plateia, então, ao longo do tempo, fui quebrando barreiras. Por vezes não toco nenhum instrumento. Isto é novo para mim. E tenho fascínio pelo que ainda não fiz”, conclui.

Confira a letra de Oxente
(Marcelo Jeneci e Chico Cesar)


Oxente
onde é que tá
onde é que tá
tá aqui na minha frente
busquei
nas veredas da cidade
ser inteiro e não metade
pois metade eu me sinto só
sonhei
com amor e plenitude
descobri que sonho ilude
e até a pedra vira pó
inda hoje eu tô
procurando assim
quero achar o amor que é pra mim
oxente
onde é que tá
onde é que tá
tá aqui na minha frente
eu sei
amizade é diferente
mas o coração da gente
pede sempre um pouco de paixão
achei
meus amigos sou contente
quem souber me oriente
ter o céu aqui beijando o chão
inda hoje eu tô
procurando assim
quero achar o amor que é pra mim
oxente
onde é que tá
onde é que tá
tá aqui na minha frente


MARCELO JENECI
Show de lançamento do álbum Guaia
Na sexta (2), às 21h, no Sesc Palladium
Rua Rio de Janeiro, 1.046, Centro, BH
Ingressos: R$ 20 a R$ 50
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