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Diante de plateias díspares, Roger Waters chega hoje a BH com o show da turnê Us + them

Em Salvador, o ex-Pink Floyd faz homenagem ao capoeirista baiano Moa do Katendê, fundador do afoxé Badauê, assassinado com 12 facadas por um partidário de Jair Bolsonaro, após ter declarado voto no PT - Foto: KATE IZOR/DIVULGAÇÃO
Lançada em 1973 em The dark side of the moon, o mais popular dos álbuns do Pink Floyd, Us and them (música de Richard Wright e letra de Roger Waters) fala de como as pessoas são joguetes em meio aos interesses geopolíticos.

Waters, de 75 anos, não nomeou gratuitamente como Us %2b them sua turnê que está em curso desde maio de 2017. No Brasil, a série de oito shows iniciada no último dia 9 em São Paulo chega hoje ao Mineirão. O encerramento do giro brasileiro, que já passou por Brasília e Salvador, será no dia 30, em Porto Alegre. Antes disso, há escalas no Rio de Janeiro e em Curitiba.

“Encorajo a plateia a se unir a mim na crença de que a capacidade de amar e sermos solidários uns com os outros está anestesiada, mas é real”, afirmou Waters, em dezembro de 2017. Na época, em férias no Brasil, ele recebeu a imprensa, incluindo o Estado de Minas, para uma entrevista em São Paulo.

De lá para cá, a mensagem de resistência que o show propõe não mudou. Resistir ao neofascismo, à poluição, à guerra. Waters aponta o dedo para figuras percebidas por parte da opinião pública como símbolos da opressão no mundo de hoje, como o presidente russo Vladimir Putin, a líder francesa de extrema-direita Marine Le Pen, o chanceler austríaco Sebastian Kurz. E, claro, Donald Trump.

A inclusão do presidenciável brasileiro Jair Bolsonaro na famigerada lista gerou reações inflamadas nos locais onde o show foi realizado (leia mais sobre isso na página 3), dividindo a plateia entre vaias e aplausos, num país já intensamente dividido, às vésperas da mais ruidosa eleição presidencial deste século.

Se houve surpresa por parte do público em relação ao gesto, é preciso reconhecer que ele é coerente com a trajetória de Waters.

O cofundador do Pink Floyd vem, há décadas, compondo músicas sobre guerra, morte, excesso de poder, autoritarismo. E leva sua militância para além do palco e dos discos. Sua defesa da causa palestina, por exemplo, o levou a criticar publicamente, em 2015, Gilberto Gil e Caetano Veloso, por se apresentarem em Israel.

Criado em 1965, o Pink Floyd passou a ser liderado por Waters a partir de 1968, quando Syd Barrett deixou o grupo. Naquele momento, a banda começou a se afastar da psicodelia e aproximar-se da política. Waters esteve à frente da banda até 1985, quando deixou o Floyd e deu início a uma longa batalha legal com os antigos companheiros.

REPERTÓRIO Us them, para além das polêmicas, recupera parte dessa história. Três quartos do show vêm do repertório do Floyd, com farta distribuição de clássicos da fase setentista. O set list reúne 22 músicas, pinçadas dos álbuns Meddle (1971), The dark side of the moon (1973), Wish you were here (1975), Animals (1977) e The wall (1979).

Com duas horas e meia de duração, o show é dividido em duas partes separadas por um intervalo de meia hora.
Nas quatro apresentações já realizadas no Brasil, Waters seguiu basicamente o mesmo roteiro, com pequenas mudanças. O primeiro trecho do show começa com Speak to me e termina com Another brick in the wall. A segunda parte começa com Dogs e acaba com Confortably numb, já no bis. Músicas de seu mais recente álbum, Is this the life we really want? (2017), estão em sequência na primeira metade da apresentação.

No palco, Waters atualiza antigas canções. Another brick in the wall (1979) é acompanhada não só por uma imagem de um grande muro no telão, mas por crianças com camisetas com a palavra Resist (resistir) – em BH, as crianças participantes foram selecionadas pelo Instituto Conviver (Igreja do Carmo) em parceria com a Escola Municipal Benjamin Jacob, localizada no Sion.. Pigs (1977) é executada enquanto um porco gigante passeia sobre o público – no telão, a imagem de Trump aparece em diferentes montagens.

Waters nunca ficou em cima do muro – sua dedicação de 50 anos à música está aí para provar. “Bom, por que eu ligo? Porque tenho filhos, porque tenho empatia. Eu sinto por outras pessoas, não só por mim”, é a resposta dele a quem se pergunta: o que ele tem a ver com tudo isso?

No primeiro show da turnê brasileira, Roger Waters incluiu nome de Jair Bolsonaro em lista de neofascistas. Telão tem 66 metros de largura por 16 metros de altura - Foto: Robson Morelli/Estadão Conteúdo

ROGER WATERS – US THEM
Show neste domingo (21), às 21h, no Mineirão, Avenida Antônio Abraão Caram, 1001, Pampulha.
Abertura dos portões: 17h. Classificação etária: espectadores de 10 a 15 anos deverão estar acompanhados de responsável. Ingressos: Pista, pista premium e cadeira inferior: esgotados. Cadeira superior: R$ 300 e R$ 150 (meia). Ingressos à venda na bilheteria do KM de Vantagens Hall, Avenida Nossa Senhora do Carmo, 230, São Pedro (sem taxa de conveniência) e no www.ticketsforfun.com.br (com taxa de conveniência). Portões de acesso: A e C (cadeira superior); B (cadeira inferior roxa); D e R (cadeira inferior); F (pista premium); G2 Av. Cel. Oscar Paschoal (pista e pista para pessoa portadora de deficiência).


OPERAÇÃO DE TRÂNSITO

A BHTrans fará uma operação especial para o show. Haverá faixas de orientação para os motoristas, assim como a presença de agentes da BHTrans, PMMG e Guarda Municipal para monitorar o trânsito. A partir das 17h, o cruzamento da avenida Cel.
Oscar Paschoal com Antônio Abraão Caram será interditado. As seguintes linhas servem o Mineirão: Move (51, 63, 64, 5250, 6350), 5106, 5401, circulares 503 e 504 e suplementares 53 e 54.

ELE SIM, ELE NÃO
Referência ao presidenciável do PSL nos shows no Brasil foi motivo de polêmica entre fãs do músico

» 9 de outubro, São Paulo, Allianz Parque – O nome de Jair Bolsonaro aparece em uma lista ao lado de outros políticos chamados de neofascistas. #EleNão aparece no telão, e o Brasil é colocado como um dos países sob ameaça de fascismo. Houve vaias, ainda discretas, que cresceram após Waters discursar dizendo não ser possível que um político apoie um regime militar. #EleNão apareceu novamente no telão, gerando vaias maiores.

» 10 de outubro, São Paulo, Allianz Parque – Houve novamente vaias e gritos de Bolsonaro, mas desta vez o #EleNão não chegou a ser exibido no telão. No lugar em que apareceu o nome de Bolsonaro no primeiro show havia uma tarja com a frase “ponto de vista político censurado”. Na parte final da apresentação, o telão trouxe os dizeres “nem fodendo”.

» 13 de outubro, Brasília, Estádio Mané Garrincha – Assim como no segundo show de São Paulo, no lugar do nome de Bolsonaro apareceu a tarja com referência à censura. Houve vaias e aplausos, gritos de “ele não” e “ele sim”, assim como cartazes com os mesmos dizeres. Do palco, Waters afirmou: “Quando nós estávamos em São Paulo, as pessoas começaram a brigar. Na segunda noite eu disse: ‘ei, caras, será que não é melhor parar de brigar uns com os outros e guardar as energias de resistência para a porra dos porcos?’”

» 17 de outubro, Salvador, Arena Fonte Nova – Mais uma vez foi exibida a frase “ponto de vista político censurado”.
As manifestações a favor do presidenciável Jair Bolsonaro foram engolidas pelo coro de “ele não”, que dominou o estádio por mais de uma vez. Waters homenageou o mestre baiano Moa do Katendê, assassinado em 7 deste mês por discordar de um eleitor de Bolsonaro. Um telão de 70 metros de largura exibiu uma imagem do capoeirista feita pelo repórter fotográfico do Estado de Minas Leandro Couri. Neste momento, Waters pediu paz e chorou no palco.

"FICAMOS SUPERPREOCUPADOS"


Com 33 anos de showbusiness, o empresário Luiz Oscar Niemeyer trouxe ao Brasil Paul McCartney (fez todas as turnês do ex-beatle), Rolling Stones, Stevie Wonder, Elton John. Mesmo com tantos medalhões no currículo, nunca havia trabalhado com Roger Waters. Hoje diretor artístico da Time For Fun, Niemeyer conversou com o Estado de Minas sobre a turnê brasileira Us them, que chega neste domingo ao Mineirão. Waters desembarca no início da tarde em BH e deve ir diretamente para o estádio. Após o show, ele deixa a cidade.

A turnê estreou no Brasil com a polêmica sobre a menção a Jair Bolsonaro no telão em São Paulo. O nome do presidenciável no segundo show foi substituído por uma tarja que faz referência à censura. O que houve?
Quando ele se posicionou no primeiro show e pegou as pessoas de surpresa, ficamos superpreocupados, pois houve várias brigas na plateia. Todo mundo sabia qual era a posição dele, mas fomos conversar porque o momento é realmente muito delicado. Não seria aconselhável seguir com isso, já que alguém poderia sair machucado. A ideia era evitar o confronto, em vista do que está acontecendo no país, sem qualquer julgamento do posicionamento dele. Ele concordou. A tarja foi uma decisão deles (da produção do artista). A censura (na tarja) que aparece é da situação toda. Até porque no show tem fãs de posições antagônicas, metade do público pensa de uma maneira, metade de outra.

A turnê Us them foi anunciada em dezembro de 2017. De lá para cá, a situação do país mudou. Isso dificultou a realização do projeto?
O que não tínhamos era esse quadro eleitoral, que está mexendo com os corações e mentes de todo mundo. Não havia o fator Bolsonaro, que foi algo que surgiu no meio do caminho. Mas, em termos de situação econômica, a conjuntura não é tão diferente, pois continuamos no sufoco.

O que há de novidade na turnê Us them?

É um espetáculo único. O telão tem 66 metros de largura por 16 metros de altura, praticamente a largura de um campo de futebol. O palco não tem fechamento lateral, é todo aberto. Isto faz com que haja um campo de visibilidade muito maior, não é a caixa preta que você tem em outros espetáculos. E o som surround está no estádio inteiro. Além dos PAs (caixas na parte frontal do palco) e das torres de retorno, há torres nas arquibancadas, o que é uma particularidade deste espetáculo. É como se você estivesse vendo um filme, pois o som realmente envolve todo mundo.

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